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Capítulo IV



O Espiritismo transcendental


– Ação dos Espíritos

– Desagregação da matéria

– Experiências de Crookes e de Zöllner

– O fenômeno de transportes

– Aparições luminosas na obscuridade

– Aparições de mãos luminosas por si mesmas, ou visíveis à luz ordinária

– Formas e figuras de fantasmas

– As materializações

– Experiências de Crookes com Katie King

– Formação lenta de uma materialização

– A fotografia espírita

– Fotografias de Espíritos reconhecidos por parentes

– Mediunidade vidente e fotografias de Espíritos

– As experiências de Aksakof

– Fotografias transcendentais em pleno dia

– Fotografia do médium e de uma forma materializada à luz do magnésio

– Observações do Sr. Aksakof

– Impressões e moldagens de formas materializadas

– Experiências em Nápoles, na América e na Inglaterra

– O Espiritismo e a Psiquiatria

– Experiências de Lombroso em Nápoles

– A explicação do célebre professor

– Refutação

– Resumo.


Vamos assistir agora a experiências que estabelecem positivamente a existência real e objetiva dos Espíritos, demonstrando que, em certas circunstâncias, pode-se constatar a sua presença com tanto rigor e pelos mesmos processos que vulgarmente são empregados quando se trata de uma pessoa viva. Podemos vê-los, tocá-los, fotografá-los, ouvi-los falar; em uma palavra, nos certificarmos por todos os meios possíveis de que, temporariamente, eles são tão vivos como os observadores. Esses fenômenos são chamados materializações.


Ainda que as narrações dessas experiências percam alguma coisa do seu caráter, por serem muito surpreendentes, é necessário que demonstremos até onde vai a ação dos Espíritos sobre a matéria, a fim de fazermos saber que, em certas casos, eles têm o poder de agregá-la e desagregá-la por processos que ainda nos são desconhecidos e com uma rapidez quase elétrica.


Desagregação da matéria


Apresentemos os fatos. Eles são mais eloqüentes e persuasivos que a nossa humilde demonstração. Eis a narrativa de uma sessão em casa do Sr. Crookes:


“A Srta. Fox havia prometido dar uma sessão em minha casa. Enquanto eu a esperava, uma das minhas parentas e meus dois filhos mais velhos, um de catorze, e outro de onze anos de idade, achavam-se na sala de jantar, onde se efetuaram sempre as sessões, ao passo que eu escrevia na minha biblioteca. Ouvindo soar a campainha, abri a porta à Srta. Fox e conduzi-a logo à sala de jantar, porque ela me disse que, não podendo demorar-se muito, não subiria. Depôs sobre uma cadeira seu chapéu e seu xale. Dirigi-me, então, a meus filhos e disse-lhes que fossem para a biblioteca estudar as suas lições; fechei sobre eles a porta a chave e, segundo o meu costume durante as sessões, pus a chave em meu bolso.


“Assentamo-nos, ficando a Srta. Fox à minha direita e a minha parenta à esquerda. Bem depressa, recebemos uma mensagem alfabética pedindo-nos que apagássemos o gás; isso feito, ficamos em completa obscuridade, durante a qual segurei com a minha mão as da Srta. Fox. Logo após, uma comunicação foi-nos dada, nos seguintes termos: “Vamos produzir uma manifestação que vos provará o nosso poder.” Imediatamente depois, ouvimos o tinir de uma campainha, não estacionária, porém que ia e vinha por todos os pontos da sala, ora junto à parede, ou num canto afastado, ora me tocando na cabeça e, depois, batendo no chão. Depois de assim se fazer ouvir, pelo menos durante cinco minutos, a campainha caiu sobre a mesa, perto das minhas mãos.


Durante todo esse tempo nenhum de nós se moveu e as mãos da Srta. Fox conservaram-se perfeitamente tranqüilas. Eu julgava que a campainha, que então tocara, não podia ser a minha, visto eu tê-la deixado na biblioteca.


“Pouco tempo antes da chegada da Srta. Fox, eu tinha precisado de um livro que se achava colocado num aparador, na biblioteca, e, encontrando a campainha sobre o livro, pu-la de lado; esse incidente assegurou-me que ela estava na biblioteca.



O gás iluminava bastante o corredor para o qual dava a porta da sala de jantar, de modo que não se podia abrir essa porta sem que a luz penetrasse na sala em que nos achávamos.


Ademais, para abri-la, só existia uma chave, e essa, eu a conservara em meu bolso.


Acendi uma vela. Não podia haver dúvida de que diante de mim, na mesa, estava uma campainha. Fui logo à biblioteca, e vi que a minha campainha não estava onde eu a deixara. Perguntei a meu filho mais velho: – Sabes onde está a minha campainha? – Sim, papai, ei-la; e apontou para o lugar onde eu a pusera. Pronunciando essas palavras, ergueu os olhos e continuou: – Não; não está mais ai, porem ainda há pouco estava. – Como é isso? Alguém veio buscá-la? – Não, disse ele, ninguém entrou aqui; e sei que ela aí se achava, porque, quando nos fizeste vir para cá, J. (o menor dos meus dois filhos) começou a tocá-la com tanta força que não pude estudar as minhas lições, e por isso lhe disse que parasse. J. confirmou o fato, e acrescentou que havia posto a campainha no lugar onde a achara.” Vemos, pois, que os Espíritos precisaram fazer passar essa campainha através da parede, a fim de levá-la da biblioteca para a sala de jantar. O fenômeno não pode ser compreendido senão pela suposição de poder a matéria passar através da matéria, o que não é impossível, quando vemos a água, sob uma pressão, violenta, filtrar-se pelos poros de uma esfera de ouro, ou o hidrogênio passar pelas paredes de um tubo de ferro sujeito a temperatura elevadíssima, e, mais usualmente, o petróleo atravessar a porcelana. O que é estranho, no nosso caso, é a desagregação e a reconstituição da campainha, sem que esta se avariasse. Eis uma outra narrativa do mesmo ilustre químico, que, de alguma sorte, põe em evidência o fato da desagregação.


O segundo caso que vou narrar realizou-se em plena luz, num domingo à tarde, em presença do Sr. Home e de alguns membros da minha família. Minha mulher e eu tínhamos passado o dia no campo e daí trazido algumas flores. Chegados à casa, entregamo-las a uma criada para que as pusesse dentro d'água. O Sr. Home chegou pouco depois e todos reunimo-nos na sala de jantar. Quando estávamos assentados, a criada trouxe as flores que havia acomodado num vaso, coloquei-o no centro da mesa, cuja coberta havia sido retirada. Era a primeira vez que o Sr. Home via essas flores.


Depois de termos obtido muitas manifestações, a conversação veio a cair sobre certos fatos que só podiam ser explicados admitindo-se a passagem real da matéria através de uma substância sólida. A este respeito, veio alfabeticamente a seguinte comunicação: “É impossível a matéria passar através da matéria, mas vamos mostrar-vos o que podemos fazer.” “Esperamos em silêncio. Bem depressa descobrimos uma aparição luminosa pairando sobre o ramalhete de flores; depois, à vista de todos, uma haste de erva da China, de 15 polegadas de comprimento, que adornava o centro do ramalhete, elevou-se lentamente do meio das outras flores e, depois, desceu até à mesa, pela frente do vaso, entre este e o Sr. Home. Chegando à mesa, a haste não se deteve aí, passando-lhe através, como foi observado por todos.


Depois da desaparição da erva, minha mulher, que estava assentada ao lado do Sr. Home, viu, entre ela e o médium, uma mão vindo debaixo da mesa e empunhando a planta, com a qual lhe bateu no ombro, por duas ou três vezes, fazendo um ruído que todos ouviram, e, em seguida, depois de largá-la no chão, desapareceu. Só duas pessoas viram essa mão, mas todos os assistentes observaram o movimento da planta. Enquanto isso sucedia, todos puderam ver as mãos do Sr. Home tranqüilamente pousadas na mesa. O lugar onde a planta desapareceu estava a dezoito polegadas de suas mãos. A mesa era de dobradiça, deixando entre as duas partes uma estreita fenda. Foi através dessa fenda que a planta passou. Tirei a medida, e vi que ela tinha apenas a largura de um oitavo de polegada. A planta possuía um diâmetro muito maior e não podia passar através dessa fenda sem se quebrar, e, no entanto, todos a viram por aí se introduzir sem dificuldade e docemente. Examinando-a, depois, não encontramos nela o menor sinal de compressão.”


A afirmativa desse Espírito, sobre a desagregação da matéria, não nos parece absolutamente exata, pois as experiências de Zöllner provam que, em realidade, opera-se a desagregação.


As experiências de Zöllner 44


Uma experiência verdadeiramente concludente foi a deste notável homem de ciência. Em uma corda lisa, cujas extremidades estavam fixas, lacradas e marcadas sobre a mesa, com o sinete do Sr. Zöllner, formaram-se alguns nós, minutos depois da imposição das mãos de Slade, conservando-se intactos os selos.


Em seguida, duas tiras de couro, juntas somente pelas extremidades e, igualmente, lacradas, também se achavam ligadas uma à outra quando o Sr. Zöllner daí retirou as mãos.


“Eu tinha as mãos pousadas nas tiras de couro – diz o Sr. Zöllner –; Slade, que se achava à minha esquerda, colocou sua mão direita sobre as minhas. Findos alguns minutos, senti um movimento das tiras sob as minhas mãos. Três pancadas fizeram-se ouvir na mesa e, quando retirei as minhas mãos, as duas tiras de couro estavam amarradas uma à outra.”


O sábio alemão fez variar a experiência: tomou dois anéis de madeira, torneados, feitos cada um de uma só peça, com um diâmetro de 74 milímetros, prendeu-os nas extremidades de uma corda de violão, fixou o centro desta na mesa, com lacre marcado com o seu sinete, e deixou-as pender aos lados da mesa. Seu desejo era ver se os anéis se entrelaçavam. Em seguida, assentou-se com Slade, colocando suas duas mãos sobre a corda selada. Perto deles estava uma mesa pequena, de uma só perna, terminada por três pés.


Depois de alguns minutos de espera – escreve ele –, ouvimos, na pequena mesa redonda colocada diante de nós, um ruído semelhante ao que produziriam duas peças de madeira batendo uma contra a outra. Levantamo-nos para nos certificar-mos do que era e, com grande assombro, achamos os dois anéis de madeira, que cerca de seis minutos antes estavam presos à corda de violão, enfiados na perna da mesa e em perfeito estado. Assim – acrescenta o Sr. Zöllner –, a experiência que eu projetava não deu o resultado previsto; os anéis não se entrelaçaram, mas, em vez disso, foram transportados da corda de violão para a perna da mesa.”


Experiências de Wallace – Os transportes


Vimos a campainha do Sr. Crookes ser transportada de uma sala para a outra. Se essa campainha não lhe pertencesse, se ela tivesse vindo de uma casa vizinha, teríamos aí o que chamamos um fenômeno de transporte. Eis um fato garantido pelo Sr. Wallace: 45


“O que há de mais notável na mediunidade da Srta. Nicholl (hoje Sra. Guppy) é o transporte de flores e frutos para um quarto fechado. A primeira vez que esse fato se deu foi em minha casa, na época em que suas faculdades estavam ainda pouco desenvolvidas. Todos os assistentes eram meus amigos íntimos. A médium tinha vindo para a ceia; estávamos em pleno inverno e, antes que as flores aparecessem, ela tinha ficado conosco durante quatro horas em um quarto muito quente e iluminado a gás. O certo é que, sobre uma mesa nua, em pequeno compartimento, fechado e escuro (a sala vizinha e o corredor estavam bem iluminados), apareceu uma quantidade de flores que não se achavam aí quando apagamos o gás, alguns minutos antes. Eram anêmonas, tulipas, crisântemos, primaveras da China e muitas espécies de fetos. Todas pareciam ter sido colhidas de fresco e estavam cobertas de fino orvalho. Nenhuma pétala estava quebrada ou machucada, nenhuma das mais delicadas pontas dos fetos se achava afetada.


Sequei e conservei tudo, juntamente com o atestado que obtive dos assistentes, garantindo não haverem eles, de modo algum, contribuído, tanto quanto podiam sabê-lo, para o aparecimento das flores. Acreditei, então, e ainda acredito, que era absolutamente impossível à Srta. Nicholl conservá-las ocultas por tanto tempo, tão perfeitas e, mais que tudo, tê-las coberto inteiramente de tão bela camada de orvalho, igual à que se produz no exterior de um copo, quando, em um dia quente, ele está cheio de água gelada.”


A competência particular de Alfred Wallace torna essa observação uma das mais preciosas, porque é difícil que uma jovem senhora, nas condições indicadas, tenha podido iludir o sagaz e ilustre naturalista. Prossigamos: Fenômenos semelhantes operaram-se centenas de vezes, em muitas casas e em condições variadas. Quase sempre as flores amontoavam-se em quantidade sobre as mesas; em outras ocasiões, foram trazidos os frutos e as flores especiais que haviam sido pedidos. Um amigo meu solicitou uma vez um girassol, e uma dessas flores, alta, de 6 pés, caiu sobre a mesa, com as raízes envoltas em sólida massa de terra. Uma das provas mais importantes realizou-se em Florença, na presença do Sr. F. Adolphus Trollope, da Srta. Blagden e do Coronel Harvey.


“A sala foi examinada pelos cavalheiros, a Sra. Guppy foi despida e de novo vestida pela Sra. Trollope, que examinou cada uma das peças do seu vestuário, e, em seguida, o Sr. e a Sra. Guppy foram solidamente amarrados em torno da mesa.


Depois de dez minutos, todos declararam que sentiam o aroma de flores e, quando se acendeu uma vela, viu-se que os braços da Sra. Guppy e do Sr. Trollope estavam cobertos dos junquilhos que inundavam a sala com o seu perfume. Os Srs. Guppy e Trollope narram esse fato em termos substancialmente idênticos.” Relatório da Sociedade Dialética de Londres, sobre o Espiritualismo.


Aparições luminosas


Estando confirmado o princípio de poderem os Espíritos manipular a matéria viva sem destruí-la, mostremos o que eles podem fazer sobre si mesmos.


Voltemos ao Sr. Crookes, que assim resume as suas observações:


“Essas manifestações, por serem algo fracas, exigem, geralmente, que a sala não esteja iluminada. Pouca necessidade tenho de lembrar aos meus leitores que, em tais condições, adotei todas as precauções convenientes para evitar que me iludissem, pois empreguei o óleo fosforado e outros meios. Ainda mais, muitas dessas aparições luminosas eram de tal natureza que não consegui imitá-las por meios artificiais.”


Ainda temos um testemunho importante vindo desse notável físico, a quem devemos a descoberta da matéria radiante, pois que ele se entregou a longas e rigorosas experiências sobre todos os gêneros de luzes devidas aos eflúvios elétricos e à fosforescência:


“Nas condições próprias para o mais rigoroso exame, vi um corpo sólido, luminoso por si mesmo, e mais ou menos da grandeza e da forma de um ovo de perua, flutuar silenciosamente pela sala, elevar-se mais alto do que teria podido fazê-lo qualquer dos assistentes colocando-se nas pontas dos pés, e, depois, descer lentamente até o chão. Esse objeto conservou-se visível por mais de dez minutos e, antes de desaparecer, deu três pancadas na mesa, com um ruído semelhante ao que produziria um corpo sólido e duro. “Durante esse tempo, o médium esteve assentado em uma espreguiçadeira e parecia totalmente insensível.


Vi pontos luminosos saírem de lugares diferentes e pousarem sobre a cabeça de diversas pessoas; obtive, a pedido meu, relâmpagos de luz brilhante, produzidos diante do meu rosto e no número de vezes por mim fixado. Vi faíscas saltarem da mesa até ao teto, e depois caírem na mesa com um ruído muito distinto. Mantive uma conversação alfabética por meio de relâmpagos luminosos, produzidos no ar diante de mim, e por entre os quais eu passava a minha mão. Vi uma nuvem luminosa flutuar sobre um quadro. Sempre nas condições apropriadas ao mais rigoroso exame, aconteceu, por mais de uma vez, que um corpo sólido, fosforescente e cristalino, fosse colocado em minha mão por outra mão que não pertencia a nenhum dos assistentes. Em plena luz, vi uma nuvem luminosa pairar sobre uma heliotrópia colocada em uma mesa ao nosso lado, quebrar-lhe um raminho e oferecê-lo a uma dama; e, em outras ocasiões, vi uma nuvem semelhante condensar-se sob as nossas vistas, tomando a forma de mão, e transportar pequenos objetos. Isso, porém, pertence à classe dos fenômenos seguintes:


Aparições de mãos luminosas por si mesmas, ou visíveis à luz ordinária


“Muitas vezes sentimos o contacto de mãos durante as sessões em escuridão ou em condições de não se poder vê-las. Raramente tenho visto essas mãos. Não darei exemplos dos casos em que o fenômeno se produziu na obscuridade, mas escolherei simplesmente alguns dos casos numerosos em que essas mãos foram vistas em plena luz.


Uma pequena mão, de forma muito bela, elevou-se de uma mesa da sala de jantar e deu-me uma flor; apareceu e desapareceu por três vezes, dando-me toda a facilidade de convencer-me de que ela era tão real quanto a minha própria mão. Isso se passou em plena luz, na minha própria sala, quando os pés e as mãos do médium estavam seguros por mim.


Em outra ocasião, mão e braço pequenos, semelhantes aos de uma criança, apareceram movendo-se sobre uma dama que estava sentada perto de mim. Depois, dirigindo-se para mim, bateram-me no ombro e, por muitas vezes, puxaram-me pela sobrecasaca.


Um dedo e um polegar foram vistos arrancando as pétalas de uma flor que se achava no peito do Sr. Home, e depositando-as diante das muitas pessoas ali presentes.


Muitas vezes, eu e outras pessoas vimos certa mão calcando as teclas de um harmonium, ao mesmo tempo em que observávamos estarem as duas mãos do médium seguras por aqueles que se achavam perto.


As mãos e os dedos da aparição nem sempre me pareceram sólidos e vivos. Algumas vezes, convém dizê-lo, guardavam, antes, a aparência de uma nuvem, condensada parcialmente sob a forma de mão. Nem todos os presentes viam isso igualmente bem. Por exemplo, move-se uma flor ou algum outro pequeno objeto: um dos assistentes verá um vapor luminoso pairar acima, outro descobrirá a mão de aparência nebulosa, ao passo que outros não notarão mais que o movimento do objeto. Vi, por mais de uma vez, um objeto mover-se, depois uma nuvem luminosa envolvê-lo e, finalmente, a nuvem condensar-se, tomar uma forma e transformar-se em mão perfeita. Nesse momento, todas as pessoas presentes podiam vê-la. Essa mão nem sempre é uma simples forma, pois, às vezes, parece perfeitamente animada e muito graciosa; os dedos movem-se e a carne parece ser tão humana quanto a das pessoas presentes. No punho ou no braço, torna-se vaporosa e perde-se em uma nuvem luminosa.


Ao tato, essas mãos, em certas ocasiões, parecem frias como o gelo e mortas; outras vezes, pareceram quentes e vivas, e apertaram a minha própria com a firme pressão de um velho amigo.


Conservei uma dessas mãos na minha, bem resolvido a não deixá-la escapar. Nenhuma tentativa e nenhum esforço foram feitos para que eu a soltasse, mas, aos poucos, ela pareceu dissolver-se em vapor e, assim, desembaraçou-se de mim.”


Verificaremos daqui a pouco que é desse mesmo modo que as mãos desapareceram dos moldes da parafina, onde deixaram um testemunho da sua existência momentânea.


Eis-nos longe das hipóteses do automatismo ou da segunda personalidade; aqui, não há meio de negar os Espíritos. Mas os cépticos não se embaraçam com tão pouco; não podendo contestar os fatos nem atribuí-los ao embuste, procuraram explicá-los pela alucinação. O Sr. Crookes e os seus companheiros serão por isso alucinados?


Sim, respondem imperturbavelmente aqueles que nada viram, nada experimentaram, porém que, apesar da evidência, tudo negam. Sim, os que pretendem ter visto isso são uns alucinados. Paciência; entretanto, vamos mostrar-lhes que o fato é positivo, pois deixa traços materiais da sua realidade. Enquanto não damos essa prova decisiva, eis algumas experiências provando que os fantasmas não existem somente na imaginação das pessoas crédulas:


Formas e figuras de fantasmas


“Esses fenômenos são os mais raros de todos os que testemunhei. As condições necessárias para a sua apresentação parecem ser tão delicadas, e para contrariar a sua manifestação é preciso tão pouca coisa, que só tive raras ocasiões de vê-los em condições de exame, satisfatórias. Mencionarei dois desses casos:


Ao declinar do dia, durante uma sessão do Sr. Home em minha casa, vi agitarem-se as cortinas de uma janela, distante cerca de 8 pés do Sr. Home. Uma forma sombria, obscura, semitransparente, semelhante a uma forma humana, foi observada por todos os assistentes perto da janela, em pé, e essa forma agitava a cortina com a mão.


Enquanto a examinávamos, ela esvaiu-se e as cortinas cessaram de mover.”


O caso seguinte é ainda mais importante. Nele, como no precedente, o médium foi o Sr. Home:


“Uma forma de fantasma avançou do fundo da sala, foi buscar um harmonium e, depois, deslizou pela frente de todos, tocando o instrumento. Essa forma foi visível para todas as pessoas presentes, ao mesmo tempo em que era visto o Sr. Home. O fantasma aproximou-se de uma dama que se achava assentada a alguma distância dos outros assistentes; esta deu um pequeno grito; depois, a sombra desapareceu.”


Nessas duas narrativas, todos os assistentes vêem o Espírito, que está assaz materializado para agitar cortinas, mover e tocar o harmonium. Se aí se operou uma alucinação, é preciso confessar que esta é bem complicada. Se tais fatos não se passassem no século décimo nono, no gabinete de um sábio, crer-se-ia estar diante de uma lenda.


Os homens da época atual são pouco inclinados ao maravilhoso, e, por isso, vamos ver as precauções que foram adotadas para se certificarem de que as aparições não eram simples ilusões do espírito, e, sim, realidades objetivas, autênticas e inegáveis.


As materializações


Chamamos materialização ao fenômeno pelo qual um Espírito se mostra com um corpo físico, tendo todas as aparências da vida normal. A seguinte narrativa foi publicada pelo Sr. Crookes em diferentes jornais espiritualistas, em 1874.


Se transcrevemos constantemente os escritos do grande químico, não é por falta de documentos, pois as revistas espíritas contêm grande número de bons testemunhos, mas, sim, para que o leitor fique bem convencido de que os fatos citados foram observados com todo o método e rigor que os sábios empregam em suas investigações.


Em resposta às acusações de fraude feitas contra a médium, uma jovem de quinze anos, chamada Florence Cook, o Sr. Crookes deu publicidade às suas experiências, e por estas se vê que a tal respeito não pode haver a menor suspeita. Damos, antes de tudo, uma idéia geral dessas sessões: Os assistentes, assentados em círculo, formam uma cadeia, isto é, dão-se mutuamente as mãos. A luz, muito fraca, não permite ler, mas é suficiente para que os experimentadores se vejam uns aos outros. A médium, as mais das vezes, acha-se separada da sala da reunião por um biombo ou por cortinas. Em outras ocasiões, a médium fica em um canto da sala, separado apenas por uma cortina. Se o biombo é empregado, fica entendido que não dispõe de outra saída senão pela sala, onde se acham os assistentes. Quando a médium está em êxtase, no fim de um tempo mais ou menos longo vê-se a cortina agitar-se e dar passagem a uma forma de homem ou de mulher, que vem passear pela frente de todos, conversar com os assistentes, fazer-se, muitas vezes, reconhecer por um deles, voltar, depois, para junto da médium e, finalmente, desaparecer. É bem certo que esse compartimento especial para a médium, essa semiobscuridade são condições que se prestam perfeitamente a uma legítima suspeita, visto a estranheza dos fatos produzidos, mas vamos ver que um homem frio, metódico, como o Sr. Crookes, sabe, por experiência, abrigar-se de toda fraude. Escutemos o que ele diz:


“O local – As experiências realizaram-se em minha casa. A minha biblioteca, que serviu de gabinete escuro, tinha duas meias portas dando para o laboratório; uma dessas portas foi retirada dos gonzos e, em seu lugar, suspendeu-se uma cortina, para permitir que Katie (o Espírito materializado) entrasse e saísse facilmente... Preparei e dispus a minha biblioteca, assim como esse gabinete escuro, e, segundo o costume, a Srta. Cook, depois de jantar e conversar conosco por algum tempo, dirigia-se para o gabinete e, a seu pedido, eu fechava a segunda porta a chave, guardando esta comigo durante a sessão; então, abaixava-se o gás e deixava-se a Srta. Cook na obscuridade.


Entrando no gabinete, ela estendia-se no chão, com a cabeça num travesseiro, e caía bem depressa em letargia.


A médium – Durante estes seis últimos meses, a Srta. Cook fez-me numerosas visitas, permanecendo, muitas vezes, uma semana inteira em minha casa. Não trazia consigo senão um pequeno saco de viagem, sem chave; durante o dia, estava constantemente em minha companhia, na de minha mulher ou na de algum outro membro da minha família e, como não dormisse em quarto separado do de minha mulher, faltava-lhe absolutamente a ocasião de preparar alguma coisa, mesmo de caráter menos perfeito, que a habilitasse a desempenhar o papel de Katie King.”


A convicção do Sr. Crookes sobre a sinceridade da médium e sobre a impossibilidade de a Srta. Cook simular alguma coisa do que foi por si verificado mostra-se nas linhas seguintes:


“A médium aceitou e submeteu-se com a melhor boa-vontade a todas as provas que propus; sua palavra é franca e vai direto ao fim a que se propõe; nunca lhe notei coisa alguma que manifestasse a mais ligeira aparência do desejo de enganar. Realmente, não creio que ela pudesse planejar uma fraude e levá-la ao fim desejado, caso a tentasse; seria prontamente descoberta, porque tal modo de proceder é inteiramente contrário à sua natureza. Quanto a imaginar-se que uma inocente colegial de quinze anos fosse capaz de conceber e pôr em prática, durante três anos, tão gigantesca impostura, sujeitando-se, durante todo esse tempo, às condições que se exigiu, consentindo nas mais minuciosas inspeções, em ser examinada a todo momento, antes e depois das sessões, e que obtivesse ainda maior êxito na minha casa que na de seus pais, sabendo que aqui vinha expressamente para sujeitar-se a rigorosos exames científicos; quanto a imaginar-se, digo, que a Katie King aparecida nos três últimos anos foi obra de uma impostura é violentar mais a razão e o bom senso do que acreditar que ela seja, realmente, o que afirma ser.”


Como era esse Espírito que, durante três anos, se mostrou em inumeráveis circunstâncias?


“Katie – A fotografia é tão impotente para pintar a beleza perfeita do rosto de Katie como as palavras o são para descrever o encanto das suas maneiras. A fotografia pode, é certo, dar um desenho dos seus traços; mas, como poderia reproduzir a pureza admirável de sua tez ou a expressão variada de suas feições, ora veladas pela tristeza, quando contava algum acontecimento desagradável da sua vida passada, ora sorrindo com toda a inocência de uma jovem, quando reunia em torno de si meus filhos e divertia-os, contando-lhes episódios de suas aventuras na Índia.”


Mas, essa Katie era uma aparência, uma sombra animada, um reflexo vivo e pensante? Eis o que escreveu o Sr. Crookes no dia imediato ao de uma sessão efetuada em Hackney:


“Jamais Katie se mostrou com tanta perfeição; durante cerca de duas horas, ela passeou na sala, conversando familiarmente com as pessoas presentes. Muitas vezes, tomou-me o braço, caminhando, e a impressão produzida em mim era a de achar-se ao meu lado uma mulher viva, não um visitante do outro mundo. Essa impressão foi tão forte, que a tentação de repetir uma recente e curiosa experiência tornou-se para mim quase irresistível. Pensando, portanto, que, se na minha presença não se achava um Espírito, pelo menos estava uma dama, pedi-lhe a permissão de tomá-la em meus braços, a fim de fazer o exame que um audaz experimentador tinha recentemente insinuado. Sendo essa permissão graciosamente concedida, procedi convenientemente, como em tais circunstâncias o faria qualquer homem de boa educação. O Sr. Volckman (esse experimentador) folgará em saber que posso corroborar a sua asserção de que o fantasma (que, aliás, não fez resistência alguma) era um ente tão material quanto a Srta. Cook. Essa Katie não podia ser a Srta. Cook disfarçada, pelo seguinte motivo:


Como Katie dissesse que era capaz de mostrar-se ao mesmo tempo que a Srta. Cook, abaixei o gás e, depois, com a minha lâmpada de óleo fosforado, penetrei no gabinete onde estava a médium. Previamente, porém, eu havia convidado um dos meus amigos, taquígrafo hábil, para tomar nota de toda a observação que eu fizesse enquanto me achasse no gabinete, pois, conhecendo eu o valor das primeiras impressões, não queria confiá-las somente à minha memória. Suas notas estão, neste momento, diante de mim.


Entrei no gabinete com precaução; estava escuro, e foi tateando que encontrei a Srta. Cook. Ela estava encolhida no chão.


Ajoelhando-me, deixei penetrar ar na minha lâmpada e, à sua claridade, vi essa jovem, vestida de veludo negro, como se achava no começo da sessão, e com toda a aparência de completa insensibilidade. Não se moveu quando lhe tomei a mão, aproximando a lâmpada do seu rosto, e continuou a respirar calmamente.


Erguendo eu a lâmpada, olhei em torno de mim, e vi Katie de pé, perto e por trás da Srta. Cook. Suas roupas eram brancas e flutuantes, como tínhamos visto durante a sessão. Segurando na minha uma das mãos da Srta. Cook, e ajoelhando-me ainda, fiz subir e descer a lâmpada, tanto para clarear a figura inteira de Katie como para convencer-me plenamente de que eu via realmente a verdadeira Katie, que alguns minutos antes apertara-a em meus braços, e não a criação fantástica de um cérebro enfermo. Ela não falou, mas moveu a cabeça para se fazer reconhecer. Por três vezes, examinei cuidadosamente a Srta. Cook ali deitada, para certificar-me de que a mão que eu segurava era a de uma mulher viva, e, por outras tantas vezes, voltei a lâmpada para Katie a fim de examiná-la com firme atenção, até perder qualquer dúvida a seu respeito. Afinal, a Srta. Cook fez um ligeiro movimento, e logo Katie, por um sinal, deu-me a entender que me afastasse. Retirei-me para outra parte do gabinete e cessei, então, de ver Katie, porém só fui embora quando a Srta. Cook despertou e depois que dois dos assistentes aí penetraram com luzes.”


Dirão ainda os obstinados incrédulos, eis uma alucinação de todos os sentidos, experimentada pelo Sr. Crookes. Para destruir este último argumento, é necessário falarmos da fotografia dessa aparição, pois ninguém suporá, como cremos, que uma placa sensível possa ficar alucinada. É isso um testemunho ininteligente, mas irrecusável. Essa prova absoluta foi obtida grande número de vezes.


Tendo eu tomado parte muito ativa nas últimas sessões da Srta. Cook e obtido numerosas fotografias de Katie King, à luz elétrica, julguei que a publicação de alguns pormenores seria interessante para os espiritualistas.


Durante a semana que precedeu a partida de Katie (o Espírito havia anunciado que a sua missão estava terminada), ela deu sessões em minha casa quase todas as noites, a fim de me permitir fotografá-la à luz artificial. Cinco aparelhos completos de fotografia foram, portanto, preparados. Compunham-se de cinco máquinas, sendo uma do tamanho de chapa inteira, uma de meia chapa, uma de um quarto de chapa, e as outras duas eram estereoscópicas binoculares, devendo todas ser dirigidas ao mesmo tempo para Katie, cada vez que ela tomasse posição para ser fotografada. Cinco banhos sensibilizadores e fixadores foram empregados, e muitas placas limpas e dispostas para servir, a fim de não haver hesitação nem demora durante as operações fotográficas, que eu mesmo executei com um ajudante.


Estando os meus amigos assentados no laboratório, diante da cortina, as objetivas foram colocadas um pouco atrás deles, prestes a fotografar Katie quando ela saísse, e mesmo no interior do gabinete, cada vez que se levantasse a cortina. Em cada noite, houve quatro ou cinco exposições de chapas nas cinco câmaras, pelo que nos dava o máximo de quinze provas por sessão. Algumas se inutilizaram na revelação, outras na regulagem da luz. Apesar de tudo, tenho quarenta e quatro negativos: uns medíocres, alguns nem bons nem maus, outros, porém, excelentes. Frequentemente, levantei um pedaço da cortina, quando Katie se achava perto dela; as sete ou oito pessoas que estavam no laboratório podiam ver, ao mesmo tempo, a Srta. Cook e Katie, 47 ao pleno brilho da luz elétrica. Não podíamos, então, ver o rosto da médium, por causa do xale com que Katie cobria-o a fim de impedir que a luz a incomodasse, mas, descobrindo suas mãos e seus pés, vimos que a médium estorcia-se penosamente sob os raios dessa luz intensa e, de quando em vez, ouvíamos suas queixas. Obtive uma prova de Katie e de sua médium fotografadas juntamente, mas Katie está colocada diante da cabeça da Srta. Cook.”


Acreditamos não mais ser possível a dúvida: Katie e Cook são, positivamente, duas personalidades distintas, e a objeção de embuste ou de alucinação coletiva, atingindo o Sr. Crookes e os demais assistentes, deve ser reprimida. Existe realmente um Espírito que aparece e desaparece, mas nada prova ainda, dizem os cépticos, que ele seja um habitante do outro mundo. Com efeito, sabemos, agora, de um modo quase certo, que o indivíduo humano pode desdobrar-se, e que, enquanto seu corpo está em determinado lugar, pode-se constatar a presença do seu duplo em outro lugar, às vezes muito distante do primeiro. As atas da Society for Psychical Research mencionam grande número de casos pelos quais se vê que esses duplos de pessoas vivas falam, deslocam objetos materiais, podendo-se mesmo admitir que eles têm uma existência objetiva. Apliquemos essas observações à Srta. Cook; quem nos diz que Katie King não seja simples desdobramento da Srta. Cook? Deixemos ainda a palavra aos fatos; eles vão destruir esta última objeção, supremo recurso dos negadores:


“Uma das fotografias mais interessantes é aquela em que me acho de pé, ao lado de Katie; ela tem seu pé descalço pousado num ponto do soalho. Fiz depois a Srta. Cook vestir-se como Katie; ela e eu nos colocamos exatamente na mesma posição e fomos fotografados pelas mesmas objetivas, colocados como na anterior experiência e iluminados pela mesma luz. Quando os dois retratos foram comparados, as duas fotografias coincidiram exatamente quanto às dimensões, etc., mas a de Katie excedia à da Srta. Cook, na altura da cabeça; junto desta, Katie parece uma mulher gorda. Em muitas provas, o tamanho do seu rosto e a grossura do seu corpo diferenciam-na da médium, fazendo também notar muitas outras dessemelhanças... “Vi Katie recentemente, de um modo tão nítido, quando era iluminada pela luz elétrica, que se me torna possível acrescentar mais algumas notas quanto às diferenças que, num precedente artigo, estabeleci como existentes entre ela e sua médium. Tenho a mais absoluta certeza de que a Srta. Cook e Katie são duas individualidades distintas, ao menos no que se refere aos seus corpos. Pequenos sinais que existem no rosto da Srta. Cook não aparecem no de Katie. Os cabelos da primeira são de um castanho-escuro, aproximando-se ao negro; uma mecha dos cabelos de Katie, que eu tenho à vista, e que, com a sua permissão, cortei de suas bastas tranças, depois de acompanhá-las com meus dedos até o alto de sua cabeça, a fim de certificar-me de que aí tinham nascido, é de um belo castanho-dourado. Certa noite, contei as pulsações de Katie: Seu pulso batia regularmente 75 pulsações, ao passo que o da Srta. Cook, poucos instantes depois, atingia 90, seu número habitual. Apoiando o meu ouvido no peito de Katie, pude perceber-lhe as pancadas do coração, mais regulares que as do da Srta. Cook, como esta me permitiu observar depois da sessão. Experimentados do mesmo modo, os pulmões de Katie mostraram-se mais sãos que os da sua médium, que então se estava tratando de forte defluxo.”


Verificou-se, em todos os casos de telepatia, que a aparição reproduz absolutamente a forma do corpo e as feições daquele que produz esse fenômeno; é esse um característico nunca desmentido de tais fatos. Entretanto, vemos que Katie difere notavelmente da Srta. Cook, tanto no talhe, quanto no rosto e nos caracteres fisiológicos; logo, Katie e a Srta. Cook são duas personalidades diferentes, tanto física como psiquicamente. Uma última citação vai estabelecer sobre esse ponto uma convicção absoluta:


“Tendo terminado suas instruções, Katie convidou-me a entrar com ela no gabinete e permitiu que aí me conservasse até ao fim.


“Em seguida, tendo levantado a cortina, conversou comigo durante algum tempo e, depois, atravessou a sala para ir ter com a Srta. Cook, que jazia inanimada no chão. Inclinando-se sobre ela, tocou-a e disse-lhe: – Desperta, Florence; desperta! É preciso que eu te deixe.


“A Srta. Cook acordou, banhada em lágrimas, e suplicou a Katie que se demoras-se ainda algum tempo: “Minha cara, não posso fazê-lo; minha missão está cumprida; que Deus te abençoe!”, respondeu Katie, e continuou a falar com a Srta. Cook. Durante alguns minutos, elas conversaram, até que as lágrimas da Srta. Cook impediram-na de falar. Segundo as instruções de Katie, avancei para amparar a Srta. Cook, que ia caindo no chão, soluçando convulsamente. Olhei, então, ao redor de mim; mas Katie e o seu vestido branco haviam desaparecido. Logo que a Srta. Cook se acalmou, trouxeram uma luz e eu a conduzi para fora do gabinete.”


Não mais pode haver dúvida de que a Srta. Cook conversou, acordada, com Katie e o Sr. Crookes. São três personalidades bem distintas, em três corpos diferentes. A existência dos Espíritos está irrefutavelmente estabelecida. É tão real esse fato que os sábios que empreenderam explicar o fenômeno espírita, sem recurso à intervenção dos desencarnados, nunca ousaram tocar nesses notáveis trabalhos. Neles, é impossível negar-se a incomparável competência do observador, sua lógica rigorosa, seu espírito frio e imparcial. Nessas experiências tão pormenorizadas, tão bem dirigidas, sente-se a mão de um homem que vai em busca do desconhecido, sem hesitação, mas rodeando-se de todas as precauções possíveis. É o mesmo investigador do começo ao fim, não entusiasta do fenômeno maravilhoso, mas resolvido a fazer conhecer todas as suas fases, por mais inverossímeis que pareçam aos seus doutos colegas. Seus trabalhos são para nós, espíritas, um apoio inabalável, um refúgio seguro contra todos os sofismas dos que, não tendo experimentado por si mesmos e não conhecendo senão pequeno número de fatos, pronunciam, ex cathedra, que o Espiritismo não é mais que um disparate.


Deixemos esses retardatários e continuemos a nossa exposição.


Um outro caso


Já dissemos que existem muitas outras experiências assaz rigorosas e que as deixávamos em silêncio para ceder a palavra ao mestre em tal assunto. Vamos, entretanto, abrir uma exceção em favor de uma narrativa aparecida no Light, e que também se encontra na obra Cherchons, do Sr. Gardy. Veremos, nessa experiência, pormenores curiosos sobre o modo pelo qual se forma a aparição. Esta narrativa está confirmada pelo Sr. Oxon, que viu sessões absolutamente semelhantes; temos, pois, uma boa garantia científica a respeito da sua exatidão.


O Sr. J.-H. Mitchiner descreve, de um modo muito circunstanciado, uma materialização operada em sua presença. Eis como ele se exprime:


“Revendo os meus velhos documentos, encontrei o seguinte fato, ocorrido em 11 de fevereiro de 1885, e que pode interessar aos nossos leitores. Sei que esse fenômeno, ao qual dei o nome de parto astral, foi observado em mais de uma ocasião com o mesmo sensitivo. O círculo compunha-se de quatro damas e quatro cavalheiros, além do médium.


A sala estava iluminada durante toda a sessão por um bico de gás, dando luz suficiente para permitir que cada um dos assistentes visse os móveis que ali se achavam. Entretanto, não seria possível ler um livro ou o mostrador de um relógio.


Depois da aparição e da desaparição de quatro formas diferentes, dos dois sexos, vindas da antecâmara para o círculo, o Sr. Eglinton, o sensitivo, caiu em estado de êxtase e começou a passear de um para outro lado, mas pela nossa frente. Notei, então, um objeto semelhante a um lenço branco de algibeira, pendente do seu quadril direito. Esse objeto, da extensão de cerca de um pé, foi, durante alguns segundos, agitado pelos movimentos do médium, que passeava vacilante.


Como eu estava colocado em uma das extremidades da cadeia, minha mão esquerda ficava livre. Parando diante de mim, o Sr. Eglinton segurou-me, de repente, na mão, de um modo convulso e tão violento que me magoou. A substância suspensa no seu quadril começou então a descer para o chão e a acumular-se a seus pés, envolvendo suas pernas em espesso vapor branco, que comparei a algodão cardado.


Durante esse tempo, o médium fazia ouvir gemidos lamentosos, e suas contorções podiam fazer crer que ele se achava em verdadeiro estado de agonia. Quando o vapor cessou, se tal nome se lhe pode dar, congregou-se em coluna e tomou o aspecto de um corpo humano. Viu-se, então, a condensação dessa coluna e, antes que os assistentes tivessem tempo de compreender o que se passava, uma forma completa de carne e osso, um grande e belo homem, vestido de branco, achava-se diante de todos.


A personagem trazia barba cerrada, de cor escura, e tinha de altura algumas polegadas mais que o médium, o que era fácil de se verificar, visto que se achavam ao lado um do outro. O Espírito e o médium ficaram assim diante de nós por um momento, parecendo que o último estava sustentado pelo braço do primeiro, que o segurava pela cintura. O Sr. Eglinton, então, soltou-me a mão, afastando-se um pouco de mim com um passo mal seguro, e pôde-se, assim, distinguir uma espécie de fita branca, de cerca de 4 polegadas de largura, prendendo o quadril do médium ao do Espírito. Vi essa fita de geração astral destacar-se subitamente e, logo que se recolheu ao corpo do Sr. Eglinton, este deixou-se cair numa cadeira, enquanto o Espírito permanecia sozinho no meio do círculo, passeando e apertando a minha mão e as de duas outras pessoas. Depois da sua partida, encontramos o sensitivo em tal estado de exaustão, que a sessão teve logo de ser suspensa.”


A fotografia espírita


A fotografia de uma forma espiritual é, indubitavelmente, uma das melhores provas da existência dos Espíritos; nenhuma teoria pode dar explicação desse fenômeno sem o recurso da ciência espírita. Acabamos de ver um sábio eminente constatar, por esse meio, a realidade objetiva da aparição de Katie; citaremos um certo número de outros testemunhos emanados também de observadores instruídos, experimentados e sinceros, porque nunca será demais o que se possa fazer para libertar esse fenômeno do descrédito em que caiu depois do processo movido contra o fotógrafo Buguet, em 1875.


Esse industrial, que não era espírita, depois de haver obtido, acidentalmente, fotografias de Espíritos rigorosamente autênticas, 48como qualquer pessoa poderá convencer-se pelos testemunhos de muitos homens bem qualificados, buscou lançar mão da fraude para aumentar os seus lucros. Foi condenado e imenso descrédito estendeu-se sobre os espíritas, sendo eles, assim, injustamente envolvidos nessa reprovação.


A fim de indicar como devem proceder os espíritas sérios não só para não serem enganados, mas também para adquirirem a certeza da realidade do fenômeno, eis o que diz o Sr. Alfred Wallace:


“1º – Se uma pessoa conhecedora da fotografia tomar suas próprias chapas de vidro, examinar a câmara empregada e todos os seus acessórios, vigiar todo o processo para obter a prova e encontrar na prova negativa uma forma bem definida junto da figura da pessoa que tomou posição: há aí uma prova da existência de um objeto, suscetível de refletir-se ou de emitir raios actínicos, apesar de invisível às pessoas presentes;


2º – Se evidenciar semelhança incontestável com uma pessoa falecida, totalmente desconhecida do fotógrafo;


3º – Se aparecerem, na prova negativa, imagens em relações definidas com a figura daquele que vem retratar-se e escolhe a sua própria posição, sua atitude, seus acessórios; tem-se aí uma prova de que formas invisíveis se achavam realmente no campo da objetiva;


4º – Se aparecer uma forma vestida de branco atrás do corpo opaco de quem se retrata, sem se estender sobre ele: há uma prova de que a figura de branco aí se achava ao mesmo tempo, porque as partes sombrias da prova negativa são transparentes, e toda a imagem branca, de qualquer modo que seja, devia aparecer através;


5º – Quando não se possa recorrer a alguma dessas demonstrações, se um médium, inteiramente distinto e independente do fotógrafo, vir e descrever uma forma durante a operação, e, na placa, aparecer uma imagem semelhante à descrita: há uma prova de que essa forma aí se achava e no campo da objetiva.”


Cada uma dessas indicações tem sido sucessivamente empregada por aqueles que fazem essas experiências; citemos alguns casos:


Fotografias de Espíritos, reconhecidas por seus parentes


“O Dr. Thomson, de Clifton, obteve uma fotografia em que, ao lado da sua imagem, se achava a de uma pessoa desconhecida. Enviou essa fotografia para a Escócia, ao seu tio, perguntando-lhe simplesmente se ele notava semelhança entre essa dama e alguma pessoa da família, já falecida. A resposta foi que essa imagem era a da própria mãe do Dr. Thomson, assemelhando-se muito às feições que ela tinha quando este nascera; como a falecida não havia deixado retrato, o doutor não podia ter a idéia dessa parecença. O tio naturalmente observou que não podia compreender como o fato se tinha dado.” (Spiritual Magazine, outubro de 1873.)


Eis a afirmação de Wallace acerca de uma fotografia espírita representando sua mãe, falecida muito tempo antes:


“Em 14 de março de 1874, fui à casa do Sr. Hadson, convidado a fazê-lo pela primeira e única vez, em companhia da Sra. Guppy, como médium. Eu esperava que, se obtivéssemos algum retrato espírita, seria o de meu irmão mais velho, com o nome do qual as comunicações eram constantemente recebidas pela Sra. Guppy. Antes de ir à casa de Hadson, tive uma sessão com a Sra. Guppy, e obtive uma comunicação, por golpes, participando-me que minha mãe apareceria na placa, se isto lhe fosse permitido. Em três ocasiões, tomei posição, escolhendo-a eu próprio. De cada vez, na prova negativa, apareceu com a minha uma outra figura. A primeira, representava um homem com uma espada curta; a segunda, uma pessoa de pé, colocada, aparentemente, a alguma distância ao lado e um pouco atrás de mim, olhando-me e segurando um ramalhete de flores. Na terceira vez, depois de eu ter tomado posição e quando a placa preparada estava colocada na máquina, pedi que a aparição viesse para perto de mim, revelando, então, a placa uma figura de mulher, encostada e um pouco adiante de mim, de modo que seu vestido escondia a parte inferior do meu corpo. Vi todas as placas reveladas e, em cada um dos casos, a figura suplementar mostrou-se no momento em que o líquido da revelação molhou a chapa, ao passo que o meu retrato não se tornou visível senão cerca de 20 segundos mais tarde. Não reconheci nenhuma dessas figuras nas chapas negativas; no momento, porém, em que obtive as provas, o primeiro golpe de vista mostrou-me que a terceira placa continha um retrato incontestável de minha mãe, assaz semelhante nos traços e na expressão. Não era uma semelhança como a que se nota num retrato tirado em vida, mas semelhança algum tanto idealizada, apresentando-se sempre a mim de modo a não poder eu ser enganado.” 49


O Sr. Wallace conta que a Sra. Guppy, a médium, viu, de cada uma das vezes, uma aparição trazendo flores, o que é confirmado pelo aparecimento dessas flores na fotografia. A aparição na fotografia foi reconhecida pelo irmão do Sr. Wallace, morador na Califórnia, como sendo a de sua mãe; é um caso totalmente comprobativo, e não se pode explicar isso por outro modo, a não ser pela manifestação dos Espíritos. Essa causa é inegável, porque muitas vezes o médium descreve exatamente a aparição que vai ser fotografada. Eis um exemplo:


Mediunidade vidente e fotografias de Espíritos


O Sr. Beattie, fotógrafo já afastado do serviço, homem respeitável, fez experiências em companhia do Dr. Thomson, de quem já falamos. Entre as numerosas provas que obtiveram, duas são particularmente dignas de nota, por causa das condições especiais em que se produziram.


“Há duas outras provas como as que se obtiveram em 1872, nas quais o médium descreveu todas as fases durante a exposição da chapa.


A primeira aparição, diz ele, era um espesso nevoeiro branco; a prova saiu cheia de manchas brancas, sem traços de imagem. A outra prova foi descrita com antecedência, como devendo apresentar um nevoeiro envolvendo uma pessoa, mas na chapa não se vê mais que uma figura humana no meio de uma superfície quase uniformemente nebulosa.


Durante as experiências feitas em 1873, o médium, em cada um dos casos, descreveu, minuciosa e corretamente, as aparições que deviam mostrar-se nas chapas. Em uma delas há uma estrela luminosa irradiante, de grande dimensão, apresentando no centro um rosto humano assaz visível. É a última das três sobre as quais se manifestou uma estrela, e tudo havia sido cuidadosamente anunciado pelo médium.”


Essas experiências são uma prova da mediunidade vidente e da realidade objetivas das aparições. Nenhuma negação prevalecerá contra esses fatos autênticos. Vamos assistir agora a uma manifestação ainda mais caracterizada do poder do Espírito sobre a matéria tangível.


Experiências do Sr. Aksakof


Eis a narrativa resumida das investigações do sábio russo; elas foram suscitadas por uma discussão com o filósofo Von Hartmann, acerca da objetividade das aparições. Como esses estudos não foram ainda publicados na França, 50julgamos dever reproduzi-los com algum desenvolvimento, porque não somente confirmam as experiências precedentemente citadas, mas ainda porque revelam um fenômeno completamente desconhecido: o da fotografia na mais absoluta obscuridade.


Antes de expor os fatos, recordemos brevemente a objeção feita por Von Hart-mann contra a realidade das fotografias espíritas.


Esse filósofo não nega que fossem obtidas provas fotográficas, mas acredita que aquilo a que chamamos Espírito não é mais que o desdobramento do médium. Ele diz:


“É questão do mais alto interesse teórico saber se um médium pode não somente excitar em outrem a alucinação de uma figura, mas também produzir de alguma sorte uma imagem real, de um modo atenuado, no espaço real, objetivo, da câmara comum a todos os experimentadores, projetando fora de seu próprio organismo a matéria necessária a essa formação, depois construindo a forma. Se a esfera de ação de um médium tivesse um limite intransponível, a prova da realidade objetiva do fenômeno de materialização poderia ser fornecida por produções materiais duráveis e além da esfera da ação do médium.


Não sendo esse o caso, e o fenômeno de materialização parecendo, além disso, produzir-se fora da esfera de ação física, não precisamos mais que a prova fotográfica para estabelecer que o fenômeno da materialização apresenta uma superfície capaz de refletir a luz no espaço objetivo. Uma vez que o material fornecido por um médium não apresenta segurança, uma fotografia simultânea do médium e do fantasma deveria ser produzida antes que a objetividade pudesse ser concedida às aparições percebidas simplesmente pela vista dos espectadores.”


De outro lado, para que uma fotografia de Espírito seja comprobatória são precisas muitas condições:


1º – Que nenhum fotógrafo de profissão e que nenhum médium sejam admitidos nas manipulações ou no manuseamento do aparelho e das placas, de modo que toda a preparação de caixilhos e placas (antes da recepção do colódio), bem assim qualquer manipulação subseqüente, sejam excluídas;


2º – Para que a aparição seja bem a de um ser real, e não um desdobramento do médium, é necessário que a imagem fotográfica diferencie-se da do médium.


Vê-se quanta importância os críticos ligam à prova fotográfica; é que ela, com efeito, estabelece irresistivelmente a certeza de que se está assistindo a um fenômeno objetivo, e que a alucinação não influi para a visão do Espírito materializado.


As experiências de Crookes satisfizeram todas essas condições, e por esse motivo os sábios evitam criticar-lhe os trabalhos; guardam a respeito um silêncio prudente, mas, como temos excelentes razões para não imitá-los, vamos citar as notáveis experiências de Aksakof, a fim de mostrarmos que elas confirmam absolutamente as do ilustre físico inglês.


Fotografia transcendental em plena obscuridade


As experiências seguintes efetuaram-se em Londres, durante o ano de 1886, em uma casa absolutamente ao abrigo de qualquer suspeita. Os assistentes eram: o dono da casa, homem nobre e muito rico, cujo nome o Sr. Aksakof não quis declarar, sua mulher, um amigo da família, o médium Eglinton e o sábio russo.


As sessões realizaram-se duas vezes por semana, em uma saleta de terceiro andar, de 10,5 pés de comprimento por 9,5 de largura, não tendo mais que uma janela dando para um beco e uma porta comunicando com um corredor. As aberturas foram fechadas e cobertas por dois pedaços de estofo de lã, pregados na parede; além disso, duas cortinas foram suspensas diante dessa janela assim tapada.


A primeira experiência foi em 21 de junho, mas não deu resultado. Na segunda sessão, em 23 de junho, apesar do aparecimento de muitos pontos luminosos na obscuridade, o médium, em êxtase, anunciou que nesse dia não se obteria a fotografia, porém que, na próxima ocasião, deviam colocar a objetiva a 2 pés de distância do médium. A fim de bem precisar o seu intuito e evitar qualquer mal-entendido, o Sr. Aksakof declarou que o seu intento era provar, de um modo objetivo, a materialização dos Espíritos, desejando, por isso, que o Espírito se fizesse ver, iluminando-se a si mesmo por uma semiluminosidade, e que pudesse, depois, quando cessasse a visibilidade, ser fotografado. Pelo médium foi respondido que era isso exatamente o que os seus guias queriam fazer.


A terceira sessão, em 28 de junho, não produziu ainda resultado decisivo. Os operadores viram diante do médium uma luz contínua, mas sem contorno algum determinado; duas exposições da câmara escura foram feitas com chapas compradas pelo Sr. Aksakof. Numa delas nada apareceu; na outra, podia-se distinguir uma forma sombria, com um turbante; infelizmente, o dono da casa, por inexperiência, apressou-se demais em fazer a impressão, e a gelatina, não tendo ainda tido tempo de secar, colou-se ao papel, inutilizando o negativo.


Um insucesso absoluto caracterizou a quarta sessão, em 30 de junho. Reproduzimos intencionalmente a narrativa dessas experiências nulas, a fim de mostrar quanta paciência é necessária nessas investigações; porque, ignorando as condições exigidas para o bom resultado, não devemos desanimar com os repetidos insucessos, e, sim, perseverar com paciência até conseguir o que se deseja. Entretanto, essa sessão não foi de todo inútil, pois ela deu ao Sr. Aksakof a prova da clarividência dos Espíritos. Sentindo-se um pouco fatigado, o sábio russo apoiou-se num armário, fechando os olhos, quando, bem depressa, Joey, o Espírito-guia do médium em êxtase, disse, por seu intermédio: “Sr. Aksakof! Parece-me que estais dormindo.” Ora, a obscuridade era absoluta, e ninguém lhe poderia ver a atitude.


Eis agora a narração completa da quinta sessão, que foi assinalada por um sucesso. Damos a palavra ao Sr. Aksakof:


“Em 5 de julho, realizou-se a nossa quinta sessão. Às quatro horas da tarde tomamos os nossos lugares na sala para isso disposta, e na qual, durante o dia, fizemos completa obscuridade. O aparelho fotográfico foi acomodado à luz do gás e, sendo ele afastado, acendemos a lanterna vermelha. Desembrulhei de um guardanapo duas chapas compradas por mim e marquei-as; o dono da casa pôs uma no caixilho e outra na máquina. Eglinton assentou-se diante da janela, cobrindo-a com as cortinas. Tomamos os nossos lugares, apagamos a lâmpada, e a sala ficou em completa obscuridade.


Eglinton caiu prontamente em êxtase e começou a respirar dificilmente, sinal precursor do fenômeno. À sua direita, entre ele e mim, uma luz estranha começou a emergir ao longo da janela, que, entretanto, estava inteiramente coberta de panos pregados à madeira e pelas cortinas. A luz, que parecia vir das cortinas, tinha cerca de um pé de comprimento e estava a 5 ou 6 pés acima do solo; não era fragmentada, pois irradiava através das dobras das cortinas. Os que se assentavam em frente ao médium viam não somente essa simples luz, mas ainda outra semelhante, à esquerda do médium; e as duas colunas luminosas pareciam unir-se acima de Eglinton, formando uma espécie de arco.


“No fim de alguns segundos, essas luzes desapareceram, e Eglinton, sonambulizado por um dos seus guias, pediu-nos que juntássemos nossas mãos a fim de reforçar o fenômeno. A cadeia não devia ser interrompida enquanto as lentes fotográficas estivessem a descoberto. Logo que juntamos as mãos, apareceu uma grande luz diante do médium. Olhando-a atentamente, distinguia-se um corpo oval, luminoso, do tamanho de um ovo de cinco polegadas de comprimento, brilhando com uma fraca luz amarela e iluminando alguma coisa semelhante a um montão de véus, brilhante como a neve ou a prata. O ovo parecia achar-se diante do médium, sem se ver a mão que o segurava.


A luz desapareceu; quatro pancadas foram ouvidas para que se descobrissem as lentes; e outras quatro, mandando tapá-las, soaram depois de uma exposição de dez segundos. Sempre na obscuridade, o dono da casa trouxe um novo caixilho e expôs a outra chapa. Uma luz viva apareceu no mesmo lugar: era uma massa branca, luminosa, de um pé de comprimento por 10 de largura, e sobre um fundo luminoso vimos a figura apagada de uma mão, cujos dedos se moviam; depois, tudo desapareceu. Uma segunda exposição realizou-se e as pancadas repetiram-se.


Supúnhamos estar tudo acabado; mas, em vez disso, foi-nos dito pelo médium, em êxtase, que era preciso preparar placas, com a maior brevidade possível, porque havia ainda muita força e os diretores invisíveis da experiência não sabiam se a exposição tinha tido uma duração suficiente. Durante esse tempo, o médium devia conservar-se atrás da cortina. Acendemos ainda a lanterna vermelha. Tirei duas outras chapas e marquei-as. Neste caso, não só o médium não pôde tocar nas chapas, mas também não conseguiu vê-las.


Quando elas foram colocadas nos lugares convenientes, apagamos a lanterna. A princípio, apareceu, durante alguns segundos, a luz estranha já vista, no meio e através das cortinas, à direita e à esquerda de Eglinton, e, em seguida, ela desapareceu de novo. Vimos, então, uma massa luminosa, semelhante a véus em grandes rolos e, no meio, a configuração de uma mão, cujos dedos se moviam. Depois, tudo imergiu em profunda obscuridade; as pancadas fizeram-se ouvir. Houve uma nova exposição, duas vezes mais longa que a primeira. Terminada essa exposição, de novo se produziu o fenômeno luminoso; depois, a escuridão tornou-se completa, ouviram-se golpes para a quarta exposição, tão longa quanto a última e, enfim, outras pancadas anunciaram o termo da experiência.


Quando o médium tornou a si, acendemos a lanterna vermelha e fomos revelar as chapas. Começamos pelas duas primeiras, que tinham sido retiradas do caixilho e postas de lado. Na primeira, nada achamos, bem como na segunda e na terceira; com a quarta, obteve-se um resultado. Vimos, a princípio, uma mancha negra no meio; em seguida, começou a aparecer ao redor dela um desenho, que se foi tornando cada vez mais definido: era uma figura de mão com um véu. Houve uma satisfação geral, em que tomou parte o diretor invisível, dando fortes pancadas no soalho. A sessão terminou às dez horas.


Alguns dias depois, o dono da casa tirou uma prova e saiu-se perfeitamente. Representava uma mão nua, sustentando sob o braço um véu, que o cobria e pendia até o chão. Sobre esse braço e essa mão vê-se a sombra produzida pelas sombras do véu, ferido provavelmente por uma luz vinda do lado. Essa claridade, porém, não tocava senão a mão e o véu, pois, no fundo escuro da fotografia, não se pôde descobrir o médium nem as cortinas nem algum dos objetos que se achavam na sala, junto ao médium. No ângulo direito da chapa, vê-se a minha marca.”


Eis-nos, pois, diante de uma nova fase do fenômeno espírita: a fotografia de objetos invisíveis, obtida na mais absoluta obscuridade. Quão interessantes estudos essas experiências notáveis sugerirão aos sábios do futuro! Novos modos de manifestação da matéria revelam-se de maneira apreciável à observação; mas, ao invés de estudarem esses fenômenos que lhes oferecem tão vasto e maravilhoso campo, alguns sábios da atualidade preferem chamar-nos vítimas e alucinados. A verdade, porém, não podia ficar abafada por muito tempo: apesar da má-vontade de alguns, as investigações continuam; sabemos que em Bordeaux e em Rouen existem grupos que se dedicam a essas experiências, e brevemente esperamos poder reproduzi-las e submetê-las à apreciação do público.


Voltemos ao Sr. Aksakof:


Fotografia transcendental de um Espírito, na obscuridade 51


“Obtido esse resultado, anunciei a todos que considerava provado o fato da fotografia na obscuridade, e que eu desejava passar, então, a outras experiências. Ao mesmo tempo, exprimi o desejo de fazer experiências de fotografia transcendental do gênero daquela que tinha sido produzida anteriormente.52


Durante uma precedente visita a Londres, há muito tempo, eu fui à casa de um fotógrafo, espírita profissional, para obter uma fotografia semelhante.


Nada conhecendo da arte fotográfica, naturalmente eu não podia por mim mesmo certificar-me da realidade do fenômeno; entretanto, fui obrigado a concluir que aí havia fraude, porque, depois de ter examinado a chapa que me fora apresentada, a fim de certificar-me de que ela estava perfeitamente limpa, não reconheci essa chapa no negativo que me foi mostrado como resultado da mediunidade. Ela fora substituída.


Entretanto, eu havia tido ocasião de fazer uma experiência em condições que, em caso de êxito, teriam garantido a natureza do fenômeno. Foi-me dito, em nome dos diretores invisíveis, que eles queriam primeiro fazer a experiência na obscuridade, fotografando uma forma inteira, e que depois procurariam dar-me uma fotografia transcendental da mesma figura com o médium e à luz do magnésio, não devendo eu abandonar Londres sem haver obtido séries completas de fotografias. Outro não era o meu desejo; e, pois, a sessão seguinte, destinada à fotografia na obscuridade, foi fixada para 7 de julho; essa sessão, porém, não deu resultado algum, nem mesmo se projetou o foco da câmara. Disseram-me, então, que, na primeira sessão, eu devia apresentar novas chapas. A sensibilidade dessas chapas era tão delicada que todas as precauções seriam poucas para garantir o êxito da operação.


A sétima sessão realizou-se em 12 de julho. O tempo estava chuvoso e dava pouca esperança de êxito.


Felizmente, a sessão estava marcada para a noite, às 7 horas, e, depois de ter jantado com o dono da casa, vi o tempo clarear e a luz aparecer. Um incidente assaz interessante sobreveio, então. Devo observar, relativamente à experiência com a luz do magnésio, que aprendi e pratiquei primeiramente esse processo, de modo que, em caso de insucesso, não pudéssemos lamentar-nos da nossa falta de experiência.


Lembrando-me das nossas preparações em São Petersburgo, levara comigo tudo o que era necessário, e nos propúnhamos, depois do encerramento da sessão, a fotografar um de nós pela luz do magnésio. Depois do jantar, durante uma conversação em que Eglinton tomou parte muito ativa, ele fez, de súbito, um movimento, concentrou-se e disse: “Que coisa estranha: sinto agora em mim uma influência poderosa.” A conversação continuou, mas foi interrompida com pancadas na mesa, pelas quais ficamos sabendo que os diretores invisíveis das experiências tinham alguma coisa a comunicar-nos.


A conversação reatou-se, mas bem depressa Eglinton recuou para esfregar os olhos e cerrá-los; depois, caiu em êxtase e, voltando-se para mim, disse em voz baixa: “Victor (o nome do diretor invisível da fotografia transcendental) diz que, em vista da condição desfavorável do tempo, que agora melhora um pouco, é necessário que a sessão se efetue o mais tarde possível, pois nessas experiências muito influem as condições atmosféricas. Ocupai-vos, pois, com a fotografia prática, e reuni-vos em sessão o mais tarde possível.”


“Assim o fizemos. Até às dez horas trabalhamos na fotografia à luz do magnésio, e esse não era o primeiro ensaio. Nesse ínterim, o tempo melhorou totalmente e a lua cheia iluminou a amplidão. Às duas horas da madrugada começamos a nossa sessão; arranjamos o aparelho, acendemos a lanterna vermelha e apagamos o gás. Da minha pasta, que sempre conservei comigo, retirei uma nova caixa de chapas, como haviam pedido; abri-a e dela tirei duas, marcando-as, escrevendo em uma o meu nome em caracteres russos e, na outra, 30 de junho de 1886, em letras antigas. O dono da casa colocou-as nos competentes lugares. Eglinton assentou-se atrás das cortinas descidas da janela. Apagamos a luz e formamos a cadeia com as mãos; Eglinton caiu, logo depois, em êxtase, respirando dificilmente e movendo-se incomodado na sua cadeira; afinal, aquietou-se.


No meio da sala apareceu uma luz, a três ou quatro pés acima do soalho e a igual distância de mim. Aproximando-se de mim, olhei-a com atenção e distingui os traços de uma figura completa envolta num véu, iluminada por uma luz vinda de baixo, parecendo provir da mão da forma, que se apoiava em seu peito e estava também velada. Distingui perfeitamente uma longa barba negra. Como que flutuando no ar, essa forma aproximou-se de cada um de nós e desapareceu na obscuridade. Algum tempo depois, apareceu nova e fraca luz azulada, proveniente de um ponto no qual parecia estar concentrada, e vi bastantes vezes a mesma forma, mas desta vez muito perto, movendo uma coisa branca, vivamente iluminada.


A princípio, julguei que isso fosse um dedo, mas outros acreditavam ser uma flor que, voltando-se de diversos modos, se conservava acima do ponto luminoso, parecendo ser a palma da mão direita; entretanto, eu não podia distinguir nem essa mão nem o objeto do qual procedia a luz. Extinguiu-se a luz dois minutos depois e pancadas fizeram-se ouvir.


A exposição da placa durou muito tempo, cerca de quarenta segundos. Depois de tapada a lente, o dono da casa, sempre na obscuridade, expôs a outra chapa. Esperávamos ver reaparecer a antiga forma, mas não se deu isso; uma segunda exposição, da mesma duração, realizou-se; depois, Eglinton tornou a si, e desta vez acendemos o gás, abrimos a porta para deixar o ar penetrar livremente e demos-lhe alguma coisa a beber. Levantamo-nos e procedemos à revelação das chapas, à luz da lanterna vermelha. Na última chapa nada havia, mas, na primeira, começou logo a aparecer uma mancha sombria, e o contorno da figura que tínhamos visto, com uma flor na mão, foi gradualmente definindo-se.


A sessão terminou às dez e meia horas da manhã. Quanto à flor, devo acrescentar que, depois da primeira exposição, quando estávamos ainda na obscuridade, a mulher do dono da casa disse-nos que acabava de receber em sua mão uma flor, que se viu, depois, perfeitamente, ser um lírio branco colhido há pouco; provavelmente ele foi, pelos maravilhosos operadores, trazido da sala vizinha, onde havia uma porção dessas flores. Não julgo inútil acrescentar que, durante essas grandes manifestações de luz, não foi sentido o menor cheiro de fósforo.


“Na primeira chapa preparada pelo dono da casa via-se distintamente uma figura completa, com espessas sobrancelhas, nariz grande e direito, barba longa, e a testa e a cabeça cobertas por um véu pendente dos dois lados. Da mão esquerda, cujos dedos são perfeitamente visíveis, eleva-se um lírio branco, cuja alvura contrasta com o fundo sombrio da fotografia; a mão direita, da qual não se vê senão o polegar, segura um pano, onde se acha um pequeno corpo oval. Esse corpo parece ser o ponto de emanação da luz que iluminava a figura, quando a vimos. No fundo dessa fotografia, como no da primeira, não se vê mais nada que a figura. No alto, no canto direito da chapa, via-se o meu nome, em letras russas, e a data de 30 de junho de 1886.


(Essas notáveis fotografias estão em poder do Edictorial Secretary, em Leipzig.)


Tendo assim chegado a uma conclusão satisfatória nas minhas experiências fotográficas em completa obscuridade, devo contudo observar que o fim particular, a que eu me propunha, não tinha sido alcançado. As fotografias por mim obtidas servem de prova a um fato físico muito interessante: a possibilidade de se obterem resultados fotográficos numa obscuridade completa. Mas, quanto ao fato da materialização, ele não fica provado pelas minhas duas fotografias, porque não posso negar a semelhança que existe entre o médium e a forma que apareceu nas fotografias, semelhança esta confirmada por aqueles que conhecem particularmente o médium. Quanto à mão, é difícil afirmar se é de homem ou de mulher. É, porém, justamente nessa semelhança que, a meu ver, está a garantia da veracidade do fenômeno da fotografia da obscuridade, pois, certamente, nada seria mais fácil que evitar essa semelhança, apesar de o Dr. Von Hartmann ficar com o direito de dizer que a fotografia representa o próprio médium, agindo em estado de sonambulismo; que a roupa, a barba e a flor são fenômenos de transporte e, mesmo, que a fotografia na obscuridade é o resultado de uma força do médium, conversível, segundo esse doutor, em uma outra força física, e que, por conseqüência, não há materialização. Quando declarei aos guias do médium que eram insuficientes as nossas experiências fotográficas nesse sentido e que uma fotografia, como as que tínhamos conseguido, somente poderia provar a materialização se representasse uma forma absolutamente sem semelhança alguma, seja com o médium seja com qualquer outra pessoa do círculo, responderam-me que, no caso de um insucesso da fotografia de uma forma materializada com o médium à luz do magnésio, devíamos de novo experimentar na obscuridade, e que eles procurariam desenvolver uma forma feminina; como, porém, a experiência com a luz do magnésio deu perfeito resultado, a necessidade de experiências ulteriores na obscuridade não se fez sentir, e para isso faltava-nos o tempo.


A possibilidade de fotografar na obscuridade não só uma forma viva, seja o próprio médium seja o seu duplo ou uma forma materializada, mas também um objeto inanimado, como um lírio, fez-me crer que esse modo de fotografar na obscuridade seria o mais fácil para dar-nos a fotografia do próprio médium juntamente com a da forma materializada, e que assim ficaria absolutamente provada a materialização, pois a luz do magnésio oferece muitas dificuldades, tanto para o médium quanto para o fenômeno. Responderam-me que se poderia tentar isso mais tarde, porém que, naquele momento, havia um programa de experiências já traçado.


Se, porém, as minhas fotografias na obscuridade não atingiram totalmente o fim que eu visava, oferecem, ao menos, um novo objetivo e uma prova permanente da realidade e da independência das forças da mediunidade. Não possuo conhecimento profissional de fotografia, mas, segundo os especialistas, compreendo que a fotografia na obscuridade é uma impossibilidade prática, ainda que ela possa ser explicada pela ação dos raios ultravioleta do espectro, que nos são invisíveis, porém que podem influenciar a chapa sensível como os outros raios; entretanto, para recolhê-los e aplicá-los, os nossos físicos são incompetentes, e nisso reside a impossibilidade dos fatos em questão.


Os nossos difamadores quererão atribuí-los, como o fazem relativamente aos outros fatos mediúnicos, a uma fraude; porém, sem nos incomodarmos para explicar a possibilidade de tal caso, se alguém, admitindo que eu não seja embusteiro, quiser indicar-me em que consiste a falha das precauções por mim tomadas, onde e como, sob as condições dadas, a fraude pôde ser cometida, aceitarei essas indicações com uma sincera gratidão, de modo que por outra vez eu possa prosseguir nas mesmas experiências com precauções ainda mais rigorosas.”


Fotografia transcendental, em plena luz do dia


Em uma sessão, realizada a 14 de julho, não foi possível obter-se resultado, visto não serem favoráveis as condições atmosféricas. Em outra, porém, a 19 de julho, chegou-se, não sem dificuldades, a constatar no clichê a forma de Eglinton juntamente com a de um Espírito. Eis os detalhes dessa experiência.


“Não havendo mais necessidade de uma sala escura, pois a fotografia devia ser tirada nas condições ordinárias, o dono da casa tinha escolhido, para lugar da reunião, a sala de jantar, bem clara, e, em uma alcova apenas separada por um corredor, foi instalado o gabinete escuro para a revelação das provas.


O tempo, a princípio chuvoso, tinha clareado; tomamos lugar na sala e o médium, que se achava em seu estado normal, assentou-se à frente da objetiva. Pancadas fracas, apenas audíveis, foram dadas pelos Espíritos; o dono da casa descobriu a lente e a exposição durou cerca de 40 segundos. Depois desse tempo, novas pancadas indicaram que a experiência fora concluída. O médium declarou ter estado sob a ação de uma influência poderosa, e que lhe parecia que o resultado era bom. Qual foi, porém, o desapontamento dos operadores, quando, na revelação, nada apareceu na chapa, nem mesmo o retrato de Eglinton. Certamente, as chapas eram defeituosas.


Felizmente, nem todas as chapas eram de tão má qualidade, e, tendo colocado duas no aparelho, obtivemos, em cada uma delas, o retrato de Eglinton; esse resultado animou os experimentadores a continuarem na experiência, depois de um intervalo em que nos ocupamos com a ceia.


Tornamos bem depressa a recomeçar os nossos trabalhos. Tirei outro par de chapas e marquei-as; de repente, Eglinton começou a falar em estado de êxtase e, em nome do seu guia, exprimiu-nos o seu pesar pelo nosso insucesso, que não lhe podia ser imputado, porque era nas primeiras chapas que se devia dar o resultado. “As que tendes na mão – diz o Espírito – são tão más quanto as primeiras; é necessário usar outras.” Então, tirei um quinto par de chapas, rasguei o papel que as envolvia, e as pancadas avisaram-nos que elas eram boas. Marquei-as e a experiência prosseguiu.


A exposição foi longa; de cada vez, contei até trinta segundos. Alguns momentos antes da primeira, Eglinton exclamou: “Oh! Desta vez vem alguma coisa, eu bem o sinto.” Quando fomos revelá-las, ele estava tranqüilo. Começamos pela primeira chapa, na qual, sem dúvida, se mostrava algum resultado, pois toda ela estava coberta de manchas; mas, não era isso o que esperávamos. Na segunda, apareceu somente, a princípio, a forma de Eglinton; quando, porém, levamos a chapa à luz, descobrimos, justamente no meio do peito do médium, uma figura representando um busto velado, mas com a cabeça para baixo. Houve surpresa geral, em virtude de um resultado tão inesperado sobre todos os pontos de vista. Em um ângulo da chapa estava o seguinte, em caracteres russos: A. N. N. Aksakof, 7 de julho de 1886.”


O Sr. Aksakof declara que esse pacote de chapas defeituosas, por ele comprado, não provinha da casa Marion, onde tinha o hábito de comprá-las, pois se servia sempre de chapas compradas e trazidas por si próprio. Esse detalhe tem sua importância porque, se fosse admissível uma mistificação, ela só se daria com a suposição de que, tendo algum dos membros do círculo resolvido iludir o sábio russo, fosse entender-se com a casa Marion para fornecer chapas de antemão preparadas.


Ora, nesse dia, o Sr. Aksakof, tendo ido à casa Marion comprar chapas, soube que do modelo pedido não havia. Foi, portanto, comprá-las em outra parte e, para não perturbar os membros do círculo, não lhes falou dessa circunstância. A prova era, pois, completa, absolutamente, e nenhuma suspeita de fraude podia macular essas experiências.


Fotografia do médium e de uma forma materializada à luz do magnésio


Resolvido a prosseguir em suas investigações sobre todos os gêneros possíveis de fotografia transcendental, o Sr. Aksakof, conhecedor dos trabalhos de Crookes e de suas experiências com a Srta. Cook, tentou obter fotografias nas quais aparecesse a figura do Espírito materializado ao lado da do médium.


O sábio russo continua:


“Reunimo-nos, para a nossa primeira experiência, às 7 horas da noite de 22 de julho e, depois de jantarmos com o dono da casa, começamos os nossos preparativos. Para essa sessão tivemos uma sala, na qual, com cortinas, preparou-se um gabinete. Era a sala de visitas, cuja entrada foi coberta por uma cortina de pelúcia presa por grosso cordão de seda, e dava para uma saleta onde, além dessa porta, havia uma janela dando para a casa vizinha. Para obter-se a obscuridade, as portas da janela foram fechadas e, depois, cobertas por um oleado e um pano de lã, seguros por pequenos pregos. Aí havia algumas cadeiras, um aparador e um piano, e a sala era semelhante aos outros compartimentos do terceiro andar, em que, anteriormente, nos tínhamos reunido.


Antes que o dono da casa houvesse disposto o seu aparelho, Eglinton assentou-se junto à abertura da cortina, e o foco da lente estava a tal distância que a forma inteira podia aparecer na chapa. A quatro ou cinco passos da cortina, em frente à abertura, colocou-se uma mesinha redonda, à esquerda da qual estava o aparelho, e, para retirar a lâmpada da ação direta da luz do magnésio, pus na mesa uma pasta como anteparo, prendendo na sua frente um refletor côncavo, metálico, de 7 polegadas de diâmetro.


Por mais de uma vez nos consultamos a fim de sabermos como clarearíamos a nossa sala suficientemente para vermos o que ia produzir-se e para atenuarmos o magnésio. Deliberamos, afinal, aproveitar-nos de uma pequena lâmpada de álcool, com grosso pavio de algodão; depois de experimentá-la, achamos que essa luz era suficiente. Essa lâmpada foi colocada na mesinha, perto do refletor. Junto dela, pus algumas mechas e três tiras de magnésio de 7 ou 8 polegadas de comprimento, por mim mesmo preparadas. Elas estavam ligadas, por um fio de metal, a copos de vidro, e o Sr. N... (o amigo da família) ficou encarregado de acender, com a lâmpada, a tira do magnésio, logo que se desse o sinal, e de segurar esse cordão ardente diante do refletor, tendo o cuidado de fazer que os objetos que deviam ser fotografados ficassem dentro do espaço iluminado. Em experiências anteriores, que já mencionei, tínhamos certificado por nós mesmos que, com o refletor, três tiras de magnésio davam luz bastante para obter-se bom resultado fotográfico.


Quando tudo ficou pronto, retirei-me com o dono da casa à saleta escolhida para servir de gabinete escuro. Aí, à claridade da lanterna vermelha, tirei duas chapas e marquei-as; o dono da casa colocou-as nos lugares convenientes e voltamos ao salão, fechando atrás de nós a porta de entrada. Em seguida, entregou-me a chave, e eu guardei-a no bolso.


Tomamos os nossos lugares em semicírculo diante da cortina, a cinco ou seis passos de distância.


Acendemos a lâmpada de álcool e apagamos o gás. Eram dez horas da noite. Eglinton tomou o seu lugar; primeiro, numa cadeira diante da cortina; depois, retirou-se para trás da cortina, onde havia outra cadeira para si. Ali se conservou por mais de meia hora. Nada se produziu; afinal, ele saiu e começou a falar, em estado de êxtase, sob a influência de um de seus guias, que exprimiu o seu pesar pelo insucesso, acrescentando que seria necessária uma dúzia de sessões para obter o resultado desejado, e que eles duvidavam se realmente lhes assistia o direito de impor ao médium tal esgotamento de forças. Contudo, na próxima vez, fariam os maiores esforços; e, se alguém aparecesse, seria Ernesto, o principal guia do médium. Isso disseram porque, conversando antes da sessão, eu tinha emitido a opinião de que, provavelmente, nessa espécie de prova, outra forma apareceria. Eglinton tornou a si alguns instantes depois e a sessão terminou.


A segunda sessão da série, a última de todas, foi fixada para 26 de julho de 1886. O resultado negativo das precedentes confirmou as minhas apreensões; fiquei totalmente convencido de que nada se produziria nessa nova ocasião. Reunimo-nos à mesma hora e, depois de todos os preparativos, fui, com o dono da casa, ao gabinete escuro; tirei do guardanapo duas novas chapas, marquei-as em russo – A. Aksakof – 14 de julho de 1886 –, e o dono da casa colocou-as como convinha. Tornando à sala, fechamos a porta e assentamo-nos na mesma ordem. Acendemos a pequena lâmpada de álcool e apagamos o gás. Eglinton acomodou-se na cadeira diante da cortina e, bem depressa, caiu em êxtase e começou a falar. Nossos preparativos estavam terminados. Haviam prometido que todos os esforços seriam feitos para obter-se êxito, sem que, entretanto, o garantissem. Quando chegasse a ocasião de acender o magnésio, deviam, por sugestão, avisar o Sr. N..., o qual pronunciaria a palavra agora. Se a primeira experiência falhasse, devíamos ir ao gabinete escuro para a fotografia, e, então, esforçar-se-iam para dar-nos uma sombra feminina. Desejando aproveitar-me dessa última ocasião, dirigi ao médium a seguinte pergunta: Por que, na última reunião, obtivemos a apresentação de uma cabeça em atitude tão estranha? Responderam que o momento não era próprio para se tratar disso; depois o saberíamos.


Às 21h55m, mais ou menos, Eglinton retirou-se para trás da cortina; eu podia ver a hora à luz da pequena lâmpada. Daí a pouco, Eglinton saiu; começou a concentrar suas forças, aproximando-se de nós, como se nos retirasse fluidos. Retirou-se de novo para trás da cortina e assentou-se na cadeira que correspondia à abertura da mesma, com a frente completamente voltada para nós. Movia-se muito, erguendo e abaixando as mãos. Vimos alguma coisa branca sobre a sua cabeça. Pancadas foram ouvidas; ficamos incertos, e elas fizeram-se ouvir de novo... Devemos acender?... – Sim, responderam por pancadas. O magnésio foi aceso, o dono da casa descobriu as lentes, e vi, sob essa luz ofuscante, a forma de Eglinton parecendo dormir tranquilamente, com os braços cruzados. Em seu ombro esquerdo estava uma terceira mão, com um pedaço de véu branco, e em sua cabeça, perto da testa, vimos uma quarta mão, que parecia completamente viva. Terminada a exposição, essas mãos não desapareceram, mas seguraram Eglinton pelas costas e este desapareceu atrás da cortina. O dono da casa correu ao caixilho e descobriu a outra chapa.


Eu tinha suposto que a sessão estava terminada, que se havia feito tudo o que era possível; mas, apenas o dono da casa se assentou, emergiu de detrás da cortina e avançou três ou quatro passos uma grande forma masculina, vestida de branco, com barba negra e turbante na cabeça.


– É Abdulhah –, notei eu.


– Não –, replicou o dono da casa –, porque esta figura tem duas mãos.


A forma de Abdulhah, que apareceu nas sessões de Eglinton, em S. Petersburgo, só tinha metade do braço esquerdo. Em conseqüência disso, a forma fez um sinal de assentimento, movendo os seus dois braços; em seguida, cruzando-os sobre o peito e fazendo uma saudação de reconhecimento, desapareceu atrás da cortina. Alguns segundos depois, Eglinton apareceu. Ele deteve-se fora da cortina e, atrás dele, mostrou-se outra forma branca, a mesma que já tínhamos visto. Ambos se colocaram diante da cortina e uma voz disse: Luz! Pela segunda vez, o magnésio brilhou, e vi com espanto a grande forma abraçando e sustentando Eglinton com o seu braço esquerdo. Eglinton estava em profundo êxtase e mal podia conservar-se de pé. Eu estava assentado a cinco passos e, com a ofuscante luz do magnésio, pude ver perfeitamente o estranho visitante. Era um homem cheio de vida. Vi exatamente a pele viva do seu rosto, sua barba negra natural, suas espessas sobrancelhas e seus olhos brilhantes, com os quais olhava ardente e fixamente para a chama, que brilhou durante quinze segundos. A figura vestia branco, dos pés à cabeça, estando esta coberta por um turbante. Com o seu braço esquerdo segurava Eglinton e com a mão direita o seu véu. Quando o Sr. N... bradou agora, para se tapar as lentes, a forma desapareceu atrás da cortina, mas não teve tempo para levar Eglinton, que caiu como um morto diante da cortina. A situação era crítica, mas não nos movemos, conhecendo que os médiuns estão sob um poder o qual não temos meios de dirigir. Bem depressa, a cortina abriu-se de novo, e a mesma forma apareceu pela terceira vez. Aproximou-se de Eglinton, ficando de pé, e, depois, inclinando-se um pouco sobre ele, começou a fazer passes sobre esse corpo imóvel. Contemplávamos em silêncio esse estranho espetáculo. Eglinton começou a erguer-se lentamente e, afinal, pôs-se em pé. A forma passou-lhe o braço ao redor da cintura e conduziu-o para trás da cortina. Daí a pouco, ouvimos uma voz muito fraca, a de Joey, um dos guias do médium, aconselhando-nos a expô-lo imediatamente ao ar e a dar-lhe aguardente e água. Eram 22h25m quando a sessão terminou: tinha durado trinta e cinco minutos. A dona da casa apressou-se em ir buscar água e, como a porta se achasse fechada, tive de ir abri-la. Eglinton permanecia estendido numa cadeira, em profundo êxtase, sendo absolutamente impossível tê-lo em pé. Conduzimo-lo para a sala de jantar, onde o colocamos em uma cadeira, perto de uma porta aberta; porém, ele rolou para o solo e foi agitado por convulsões. Tinha sangue nos lábios. Friccionamo-lo vigorosamente, demos-lhe sais a respirar, etc. Em um quarto de hora, ele, que se achava tão mal, voltou a si, respirou profundamente e abriu os olhos.


Nesse estado, confiei-o aos cuidados do dono da casa e da sua senhora e fui com o Sr. N... ao gabinete escuro para revelar as chapas. Logo que em uma delas o contorno das duas formas começou a aparecer, dirigi-me à sala de jantar para dar a Eglinton a boa nova, pois ele não podia vir conosco, mas, impacientemente, esperava notícias do resultado. Quando compreendeu que este era perfeito, suas primeiras palavras foram: Será isso bastante para a convicção do Sr. Von Hartmann? Respondi-lhe: Agora, acabaram-se as alucinações. Eglinton, porém, pagou caro o seu triunfo. Foi-lhe preciso uma hora para que ele estivesse apto de arrastar-se até à estação do metrô.


As fotografias preparadas apressadamente saíram perfeitas, sobretudo aquela em que se viam as quatro mãos. Eglinton havia feito em Londres o mesmo que fizera em S. Petersburgo: tinha suportado a ofuscante luz do magnésio com a maior tranqüilidade. As mãos pousadas sobre ele estão perfeitamente distintas na fotografia. A mão que descansa em seu ombro mostra-nos uma particularidade estranha: parece que lhe falta a metade da frente e os dedos do meio. O mesmo defeito mostrou-se na materialização.


A segunda fotografia é, infelizmente, menos distinta. As duas formas em pé destacam-se um pouco, ainda que não sejam totalmente perceptíveis à vista. Entretanto, para o fim proposto, o resultado é inteiramente satisfatório.”


Observação do Sr. Aksakof


“Assim, meus esforços em Londres foram coroados de êxito; obtive séries completas das fotografias prometidas e devo totalmente esse êxito ao círculo que teve a bondade de prestar-se a auxiliar-me nas experiências. Eu sabia que a primeira condição para obter-se bons fenômenos mediúnicos é o grupo; sabia que tudo dele depende, porém ainda não tinha tido a ocasião de convencer-me dessa verdade de um modo tão seguro. A facilidade, a pontualidade, a força e a exatidão com que se deram os fenômenos excederam tudo o que havíamos visto em S. Petersburgo.


Além disso, à disposição harmoniosa desse círculo aliavam-se as circunstâncias importantes de já eu ter obtido nele o fenômeno de fotografia transcendental e de existir aí o elemento mediúnico necessário para o êxito das experiências que eu ia fazer. Não me devo estender mais sobre a importância e a vantagem de se fazerem essas experiências em uma casa particular. Não é fácil a um estrangeiro achar, para esse fim, um lugar conveniente. Se nos tivéssemos acomodado em uma casa onde já se fizessem experiências, as nossas teriam perdido metade do seu valor. De modo que os excelentes serviços que de tão boa-vontade me foram prestados tiveram para mim grande importância, e eu lanço mão desta ocasião para exprimir a essas pessoas a minha profunda e sincera gratidão, e isso não só em meu nome, mas no de todos aqueles que desejam o progresso do Espiritismo.


É necessário acrescentar que ninguém em Londres, com exceção dos imediatamente interessados, sabia coisa alguma a respeito dessas fotografias, que foram obtidas na casa do Sr. X... Essas sessões foram totalmente privadas e nenhuma notícia delas foi comunicada à imprensa inglesa. Quando fui admitido nesse círculo, foi sob a condição de não publicar os nomes dos seus membros. Quando terminamos as nossas sessões, o Sr. X... disse-me que, à vista dos magníficos resultados obtidos, se eu julgasse necessário mencionar seu nome, ele dispensava o seu incógnito por mais tempo. Respondi que, certamente, o nome do dono da casa em que as nossas experiências se tinham efetuado seria algo desejável para completar a narrativa, mas que eu lhe dispensaria o sacrifício, pois que o era no estado atual da questão, quando se via que Crookes e Wallace não tinham atraído a crença pública para os fenômenos. Exprimi ao Sr. X... a minha profunda convicção de que a publicação do seu nome e da sua morada não teria utilidade, pois ninguém nisso acreditaria, a não ser aqueles que já eram crentes ou que o conhecessem pessoalmente; e que, além disso, ele ia sujeitar-se às importunações dos zombadores e dos curiosos de toda espécie. Contudo, sugeri que talvez fosse melhor eu poder dizer, sem publicar lhe o nome, que tinha a sua autorização para comunicá-lo em particular às pessoas interessadas na matéria e que eu julgasse dignas de confiança. Ficamos de acordo a esse respeito. Quanto aos incrédulos, é seu hábito suspeitar de fraude os médiuns profissionais, como tendo no fato um interesse material. É claro que, nas minhas experiências, Eglinton não podia fazer o que era necessário para pôr em prática uma fraude. Pode alguém querer supor que ele estivesse de combinação com os membros do círculo e mesmo com o negociante que vendeu as preparações para a fotografia; mas, o Sr. X... é um homem muito rico, independente e da mesma posição que eu. A possibilidade de uma fraude de sua parte, teria sido de difícil execução e arrastaria complicações, motivo bastante para fazê-la descobrir. Não se podia aí tratar de um interesse material. Que interesse, pois, podia ter ele em me enganar? difícil conhecê-lo. Por que quereria iludir-me? Era mais fácil e lógico supor que o fraudulento fosse eu, e o motivo é evidente: tendo-me devotado ao Espiritismo, eu deveria defendê-lo a todo custo. Havia ido a Londres, tinha obtido todas essas fotografias com Eglinton e agora publicava os nossos trabalhos.


A incredulidade, todavia, nem me surpreende nem me confunde. Ela é inteiramente natural e escusável. As convicções não são devidas ao acaso, e, sim, ao resultado do trabalho de uma vida, de uma época inteira. A crença nos fenômenos da natureza não se adquire com a razão e a lógica, mas pela força do hábito, e a força desse hábito faz que o maravilhoso deixe de ser maravilha.


Devo, sobretudo, dizer que o meu objetivo imediato, empreendendo as experiências que acabo de descrever, era responder a um homem que respeita o testemunho dos outros, reconhece-lhes o valor e incita os que se interessam pelos fenômenos mediúnicos a fazer experiências semelhantes. Recordarei as palavras seguintes do Dr. Von Hartmann, no Psychische Studien, número de 1885, pág. 50:


“É, certamente, uma questão do mais alto interesse teórico saber se um médium é ou não capaz de excitar em outrem a alucinação de uma figura e bem assim representar, de qualquer maneira que seja, uma materialização rarefeita, de um modo objetivo, no espaço real de uma reunião comum a todos os assistentes, projetando, para essa formação, a matéria do seu próprio organismo, depois construindo a sua forma. Se a esfera máxima da ação de um médium tiver um limite intransponível, a prova da realidade objetiva dos fenômenos de materialização poderia ser fornecida pelas produções mecânicas de um efeito durável e colocadas fora dos limites da ação do médium. Como este, porém, não é o caso, e como, além disso, nunca se vê os fenômenos de materialização produzirem-se além da esfera física de ação, só a prova fotográfica poderá estabelecer o fato de que tal fenômeno apresenta superfície capaz de refletir a luz num espaço objetivo. “Uma vez que o material restrito do médium não nos oferece segurança, deve-se procurar obter na fotografia as figuras reunidas do médium e do fantasma, antes de se poder admitir a objetividade das aparições percebidas somente pela vista dos espectadores.” (Spiritisme, pelo Dr. Von Hartmann.)


Era esse o propósito que eu tinha em vista e que, enfim, foi obtido nas próprias condições impostas a nós pelo Dr. Von Hartmann. Acredito que ele próprio, apreciando as condições físicas e morais que a prova fotográfica reclama, e que foram fornecidas, achá-las-á suficientes para reconhecer a realidade objetiva da materialização. Para evitar qualquer erro de interpretação, citarei as suas palavras:


Para essa prova fotográfica, entendo não se dever admitir que algum fotógrafo de profissão ou algum médium trabalhe no aparelho com as chapas ou com o caixilho, de modo que toda suspeita de uma preparação antecipadamente feita no caixilho ou na chapa, antes de ser nesta estendido o colódio, ou de qualquer outro artifício, não possa ser admitida. Essas precauções, ao que eu saiba, ainda não foram tomadas; em todo caso, elas não têm sido mencionadas nos relatórios aparecidos, nem a sua importância tem sido reconhecida pelos escritores.


Sem elas, porém, uma chapa negativa em que o médium e a aparição sejam visíveis simultaneamente não guarda o menor valor. As cópias positivas de tais placas, por mais que as multipliquem, não podem, naturalmente, ser aceitas como evidência.”


“Essas condições, entretanto, como se vê, referem-se à fotografia transcendental, que é a fotografia da materialização invisível para os assistentes. Elas são supérfluas para a fotografia ordinária de uma materialização visível para todos os espectadores da sessão. As narrativas a respeito das fotografias transcendentais, nas quais o médium e as aparições foram visíveis simultaneamente, são numerosas; mas, relativamente às da segunda ordem, a minha narrativa parece ser a mais completa que até hoje apareceu.” Essas experiências tão criteriosamente dirigidas, tão honestas e demonstrativas, estabelecem com a máxima evidência o fato da fotografia espírita.


Não só os trabalhos de Aksakof confirmam todas as investigações anteriores sobre o assunto, mas também nos oferecem a prova absoluta da possibilidade de se fotografar em plena obscuridade. Pois bem! Esses notáveis trabalhos passaram em silêncio: nenhuma voz se ergueu na ciência oficial para discutir esses fatos ou dar-lhes uma explicação plausível; todos os pontífices do saber recuaram diante desses fenômenos imprevistos, que vinham destruir suas teorias materialistas, esperando, sem dúvida, que jamais a opinião pública julgasse o seu procedimento.


Entretanto, chegou o dia em que é preciso se expliquem. Ou todas as narrativas precedentes são falsas, e todos os grandes homens citados não passam de pobres iludidos, vítimas dos charlatães, ou esses homens de ciência viram e é tempo de expelir esse torpor dos que estão satisfeitos com o seu saber, de abandonar suas teorias caducas, substituindo-as por ensinos mais verdadeiros, mais justos, mais em harmonia com as descobertas contemporâneas.


Eis, agora, uma outra ordem de fenômenos que apóiam e confirmam toda a série de manifestações espíritas que até aqui expusemos.


Impressões e moldagens de formas materializadas


Depois das numerosas fotografias de Espíritos obtidas em todos os países, não é mais plausível a dúvida quanto à sua existência objetiva, resultando desses fenômenos a certeza de que a alma, depois da morte do corpo, não é essa entidade que as religiões e as filosofias nos tinham habituado a considerar.


O Espiritismo ensina, há muito tempo, que o eu consciente, ou alma, está envolvido em um corpo sutil chamado perispírito.53


Esse perispírito é o molde fluídico no qual se incorpora a matéria durante a vida; é ele que, sob o impulso da força vital, mantém o tipo específico e individual, porque é invariável no meio do fluxo incessante da matéria orgânica. Esse perispírito não se destrói na morte, mas se conserva intacto em plena desorganização da matéria; é nele que se acham gravadas as conquistas da alma, de modo que esta possa recordar-se do passado.


O Espírito é capaz, em certas condições, de acumular em seu perispírito a força vital suficiente para dar uma vida momentânea ao organismo fluídico, o qual, com a matéria que retira do médium, adquire a tangibilidade de um corpo qualquer; é uma criação verdadeira, mas que só tem uma duração efêmera, visto ter sido executada fora dos processos habituais da natureza. 54


Esse perispírito, concretando-se, pode deixar impressões em moldes de parafina, na argila ou em folhas de papel enegrecido. Vamos apresentar exemplos dessas diversas manifestações.


Antes de obter moldes de formas materializadas, verificou-se que os Espíritos podiam deixar impressões provando a sua tangibilidade. Eis o testemunho de Zöllner:


“Em um vaso cheio de farinha finíssima, achou-se a impressão de uma mão, com todas as sinuosidades da epiderme distintamente visíveis; ao mesmo tempo, uma porção da farinha, com os traços de uma grande e forte mão, foi deixada na calça do Sr. Zöllner, na altura do joelho, onde ele se tinha sentido seguro um minuto antes. As mãos de Slade estavam constantemente sobre a mesa e, examinadas, não tinham traço algum de farinha. A impressão era a de uma mão maior que a de Slade.


Obteve-se uma impressão mais durável com o papel enegrecido à luz de uma lâmpada de petróleo, pregado numa prancheta e sobre o qual apareceu o sinal de um pé descalço; a pedido dos experimentadores, Slade levantou-se, tirou seus sapatos e mostrou seus pés, mas nenhum traço negro de fumo ali se encontrou. Seu pé, que foi medido, tinha quatro centímetros menos que a impressão. Slade e Zöllner repetiram a experiência, empregando uma lousa em vez da prancheta, e a impressão recebida foi fotografada e reproduzida. “Zöllner chama a atenção para o fato de a impressão ser, evidentemente, a de um pé que foi comprimido pelas botinas, estando um dedo tão coberto pelo outro que se tornava indistinto. Essa impressão não podia ter sido produzida pelo pé de Slade...


Uma tentativa para obter impressões do pé foi bem sucedida sem o contacto de Slade, ainda que ele tivesse declarado que a coisa parecia-lhe impossível; o Sr. Zöllner colocou folhas enegrecidas com fumaça da lâmpada no interior de uma lousa, e esta foi posta em seus joelhos, a fim de se a ter à vista. Cinco minutos depois, em uma sala bem clara, todas as mãos estando sobre a mesa, o Sr. Zöllner notou que, por duas vezes, se fez uma pressão na lousa depositada em seus joelhos. Após três pancadas na mesa, anunciando que tudo estava acabado, abriu-se a lousa, e duas impressões, uma de pé direito e outra de um pé esquerdo, foram encontradas no papel disposto de cada lado.”


Em Nápoles


Eis, agora, impressões deixadas em farinha e em argila.56


O professor Chiaia, de Nápoles, também obteve materializações de Espíritos por meio da médium Eusápia Paladino. Não satisfeito de fotografar Espíritos, quis conservar uma lembrança ainda mais comprobativa: a própria forma da aparição. Para isso, imaginou a disposição seguinte: Tomando um prato cheio de farinha, pediu que o Espírito aí imprimisse o seu rosto, a sua mão: o resultado foi conseguido, mas um tanto confuso por causa da friabilidade da substância empregada. Então, teve ele a idéia de utilizar-se da argila dos escultores, e perguntou se o Espírito poderia ali moldar uma cabeça. A vista da resposta afirmativa, a argila foi posta numa mesa coberta com um véu. A sala achava-se em obscuridade quase completa; mas, as cinco pessoas que assistiam à experiência seguraram as mãos uma às outras e, por acréscimo de prudência, tocaram também mutuamente os pés. Assinalando o Espírito a sua presença, pediu-se-lhe que produzisse o efeito desejado, no que ele consentiu, e, depois de três minutos, declarou que estava terminado.


Abriram-se as janelas e viu-se, então, a massa de argila cavada ou, melhor, comprimida e prestes a receber o gesso. A moldagem apresentou uma bela cabeça de homem sem barba, com expressão de grande melancolia. Um escultor, a quem a mostraram, declarou que lhe seria preciso um dia de trabalho para reproduzir em relevo tal obra. A figura estava coberta por um véu, cujas malhas se viam distintamente no gesso e que tinham grande analogia com um tecido de fio. Não correspondia a nenhuma das fazendas que se achavam, então, na sala ou que algumas das pessoas presentes trouxessem em seu vestuário.


Essas experiências reproduziram-se muitas vezes e a moldagem deu sempre resultado análogo ao pedido feito, com maior ou menor grau de exatidão e nitidez. Pedia-se ora a frente ou o perfil de um rosto, ora a mão de um homem ou de uma criança, e, em quase todas as vezes, isso foi satisfeito.57


Na América


Vamos fornecer provas de que o perispírito é bem o molde fluídico do corpo e verificaremos que, no espaço, ele não perdeu nenhuma das suas propriedades plásticas; basta fornecer-lhe a força vital e a matéria para que o corpo material se reproduza total ou parcialmente.58


Recorremos ainda ao Sr. Aksakof, que garante a autenticidade dos fenômenos seguintes, assim como a perfeita honorabilidade e a capacidade científica dos observadores. Veremos ainda uma vez que, como todos os outros fatos espíritas, estes também se produziram em todos os países.


Eis o modo de operar, vulgarmente utilizado nessas circunstâncias:


Duas vasilhas, uma com água fria e outra com água quente, são colocadas na sala onde se faz a experiência; na superfície da água quente flutua uma camada de parafina fundida. Se se quiser obter, por exemplo, um molde de mão materializada, pede-se ao Espírito que mergulhe a sua mão na parafina fluida e, imediatamente após, na água fria, e que repita por muitas vezes essa operação. Desse modo se forma na superfície da mão uma luva de parafina, de uma certa espessura. Quando a mão do Espírito se desmaterializa, deixa um molde perfeito que se enche de gesso. Basta, depois, mergulhar tudo em água fervendo para que, fundindo-se a parafina, reste uma impressão exata e fiel do membro materializado. Tal experiência, desenvolvida com as precauções necessárias, dar-nos-á, de um modo absolutamente demonstrativo, a cópia durável e minuciosa do fenômeno temporário de uma aparição tangível.


A idéia da obtenção desses moldes é devida ao Sr. Denton, professor de geologia assaz conhecido na América. Foi em 1875 que esse experimentador obteve, pela primeira vez, o molde de um dedo. Eis como ele descreveu o fenômeno em carta dirigida ao Banner of Light, e reproduzida pelo periódico The Medium, em 1875, pág. 17:


“Eu soube, há algum tempo, que, quando o dedo é mergulhado na parafina derretida, sendo esta em seguida resfriada, pode-se destacá-la e, no molde assim formado, deitar gesso, obtendo-se, dessa maneira, uma perfeita reprodução do dedo. Dirigi ao Sr. J. Hardy uma carta, informando-o de que eu conhecia um bom processo de obter moldes e pedindo-lhe autorização para assistir às sessões da Sra. Hardy, a fim de tentar obter o molde das mãos do Espírito que ali, com tanta freqüência, se manifestava. Convidado, compareci em sua residência, munido de parafina e gesso, e, tomadas as convenientes disposições, começamos as experiências.”


Não sabendo o gênero de experiência que o professor Denton queria tentar, não se pode acusar o médium de haver, com antecedência, preparado as coisas. “Colocou-se no centro da sala uma grande mesa, que foi coberta com um pano acolchoado e com a capa do piano, de modo a evitar-lhe a luz tanto quanto possível. Debaixo da mesa colocou-se um balde de água quente, em cuja superfície flutuava a parafina derretida. O Sr. e a Sra. Hardy e eu assentamo-nos ao redor da mesa e, em plena luz, pousamos as mãos sobre ela; ninguém mais se achava presente.


No fim de pouco tempo, percebemos um movimento na água e, de conformidade com uma comunicação recebida por pancadas, a Sra. Hardy pôs suas mãos a algumas polegadas da mesa, entre o pano acolchoado e a capa do piano; assim se recebeu, com intervalos variados, moldes de quinze ou vinte dedos, cujas dimensões variavam, desde as de uma criança até as de um gigante; mais da metade desses dedos eram de dimensões maiores que os da médium. “Foram reproduzidos todos os traços da pele, os sulcos das falanges, de um modo muito distinto. Disseram-nos que o maior era o polegar de Big Dick; este apresentava justamente a dupla grossura do meu no começo da unha, ao passo que o menor, com a unha perfeitamente definida, era um dedinho gordo que, aparentemente, só podia pertencer a uma criança de um ano de idade. “Estou perfeitamente certo de que, enquanto esses moldes eram obtidos, a mão da médium achava-se distante cerca de 2 pés da parafina. Muitos moldes estavam ainda quentes no momento em que a Sr. Hardy retirava-os das mãos que se apresentavam; muitas vezes, a parafina tinha tão pouca consistência que o molde ficava inutilizado.


Desejo chamar a atenção dos Eddys, dos Allan Boy e de outros médiuns de efeitos físicos para este processo pelo qual os cépticos quanto à realidade das formas apresentadas podem convencer-se, visto ficar demonstrado que elas são distintas das do médium. Se moldagens de mãos maiores que as de qualquer homem podem ser assim obtidas, como acredito, podem também ser produzidas a distância, fornecendo, desse modo, uma evidência irresistível.


“Wellesley, Mass. William Denton.”


Operando do modo acima descrito, obtiveram-se moldes de mãos inteiras e de pés, com a maior variedade de conformações, em grande número de sessões.


As condições observadas nas experiências e os resultados obtidos foram integralmente satisfatórios; a crítica, todavia, esforçou-se em descobrir aí a fraude, porque acreditava por força haver fraude.


Em primeiro lugar, sugeriu-se que a médium podia ter anteriormente preparado os moldes, trazendo-os às sessões e fazendo com que eles passassem por ser ali obtidos.


Para afastar essa suposição, o professor Denton recorreu à prova seguinte: pesou a massa de parafina antes e depois da sessão, achando o mesmo peso nos dois casos. Esta experiência foi repetida por três vezes publicamente, diante de grande número de pessoas, em Boston, em Charlestown, Portland, Baltimore, Washington, etc.; sempre com êxito completo.


Então, surgiu uma outra objeção: a médium podia ter subtraído a quantidade de parafina necessária, com os pés ou as mãos, e escondê-la em algum lugar; exigiram que ela fosse encerrada num saco; assim se fez. Nas vinte sessões públicas seguintes, a médium foi encerrada num saco, fortemente amarrado ao seu pescoço, e sempre sob as vistas da Comissão escolhida. Bem depressa, essa medida foi julgada insuficiente; insinuaram que a médium podia ter desfeito uma parte na costura do saco e tornado a fazê-la, depois de se haver utilizado de suas mãos, apesar de a Comissão nada de semelhante ter observado. Para afastar essa objeção, inventou-se uma nova condição que devia fornecer a mais absoluta prova da realidade do fenômeno: o molde devia ser produzido dentro de uma caixa fechada. Efetivamente, como essa prova deve ser considerada a mais correta e concludente, daremos a descrição da caixa que foi preparada para as experiências, segundo as indicações do Dr. Gardner. Eis o testemunho do professor Denton:


Essa caixa, de forma retangular, mede 30 polegadas de comprimento e 24 de largura. Os quatro montantes da estrutura são de madeira, do mesmo modo que o fundo e a tampa; a parte compreendida entre a tampa e o gradeamento metálico é de madeira, e mede 8,5 polegadas de altura.


Essa parte apresenta orifícios afastados cerca de uma polegada um do outro, e a cada um deles se deu, no começo, um diâmetro de 3/4 de polegada, sendo, depois, esse diâmetro reduzido de 1/4 por meio de um forro interior. O fio metálico, que cerca a caixa, é inteiriço, tendo as suas extremidades presas no mesmo canto, coberto por forte peça de madeira solidamente pregada. A tampa tem duas portas: uma fixada por dois parafusos; a outra por uma corrediça.


O gradeamento é de malha forte, medindo 3/8 de polegada. Depois de muitas experiências coroadas de êxito, a atenção foi atraída para certos defeitos da caixa, que foram reparados de modo a evitar-se objeções. As tampas foram munidas de duas fechaduras, garantindo um fechamento perfeito e seguro. Os orifícios da madeira foram reduzidos, como dissemos acima, e nenhum defeito ficou sem correção. Fomos minuciosos na descrição da caixa, porque a consideramos como instrumento de uma prova inteiramente inatacável quanto à boa-fé do médium. Seguem os detalhes da experiência.


Na segunda-feira, 1º de maio de 1876, reuniram-se na residência do Sr. Hardy, Concord Square n.º 4, o Coronel Frederick A. Pope, Boston, John Wetherbee, J. S. Drapper, Epes Sargent, as Sras. Dora Brigham e Hardy. A caixa foi cuidadosamente examinada. O Coronel Pope, experiente em marcenaria, voltou-a e examinou-a por todos os lados, interior e exteriormente, os outros observadores fazendo a mesma coisa. Teve-se o especial cuidado de verificar até que ponto, empregando-se um instrumento de ferro, era possível alargar a malha do gradeamento metálico e aproximá-lo de novo, de modo a permitir a introdução de um objeto, cujo diâmetro era maior meia polegada que o da malha. Isso foi julgado impossível. O alargamento da malha, para a introdução de uma mão, não podia ser feito sem se desviar e separar-se, de modo reconhecível, os fios da malha.


Satisfazendo a todos a construção da caixa, o Sr. Wetherbee encheu um balde de água fria e clara, o qual foi posto dentro da caixa, depois de ter sido examinado. O Coronel Pope levantou o balde que continha água quente, sobre a qual flutuava uma camada de parafina, e colocou-o, depois do exame, na caixa; tínhamos, igualmente, examinado a parafina pelo tato: agitamo-la e achamo-la em fusão e bem quente. As duas portas da tampa foram, então, abaixadas, parafusadas e fechadas; para maior segurança, ainda que a precaução fosse inútil, pois a médium estaria sempre diante de nós, lacramos os orifícios das fechaduras e as junturas da tampa. Estando clara a sala, podíamos ver, e vimos realmente, através do gradeamento metálico, que, com exceção dos baldes e do seu conteúdo, nada mais havia na caixa. Com o fim de produzir-se a obscuridade necessária para a operação, lançou-se um véu sobre a caixa, ao passo que a luz que iluminava a câmara foi moderada, mas somente até ser possível distinguir a hora nos nossos relógios, as nossas fisionomias e os nossos movimentos, bem como os da médium. A Sra. Hardy tomou uma cadeira e colocou-se em frente do círculo, justamente por detrás da caixa.


O Sr. Hardy conservou-se afastado de todos, e sua liberdade de ação não foi sujeita a restrições. Não houve cântico nem ruídos, mas, durante todo o tempo, se conversou em voz baixa. A Sra. Hardy estava em seu estado normal, alegre e sem preocupações; a harmonia do círculo era perfeita e todos os olhos observavam a médium. Na ocasião, se fizéssemos uma pergunta à força operante, a resposta teria vindo por pancadas.


Afinal, depois de quarenta minutos de espera, uma série rápida de alegres pancadinhas anunciou-nos a obtenção de alguma coisa. Levantamo-nos todos, erguemos o véu e, através do gradeamento metálico, descobrimos, flutuando no balde d’água, o molde perfeito de uma grande mão. Examinamos, então, os baldes e achamo-los intactos. A caixa foi ainda sujeita a rigorosa observação, mas tudo se achava em perfeito estado. Tiramos o lacre das fechaduras, abrimos a tampa, retiramos os baldes e, de um deles, o molde. Era exatamente um molde, e cremos que não há meio de fugir-se à convicção de que ele foi formado ali mesmo por uma força capaz de materializar os membros de um organismo inteiramente distinto do corpo físico da médium. 59


Na Inglaterra


O Dr. Nichols, servindo Eglinton de médium, fez uma experiência em condições idênticas. Nesta experiência não só as mãos e os pés do médium estiveram visíveis, mas também se obteve um resultado cuja importância está no fato de as moldagens obtidas na sessão representarem mãos que foram reconhecidas.


Eis o artigo do Dr. Nichols, no Spiritual Record, de dezembro de 1883:


“Durante a estada do Sr. Eglinton em minha casa, em South Kensington, tentamos a experiência para obter moldes de mãos dos Espíritos. Minha filha Willie, cujos desenhos e escrita já apresentei, prometeu tentar a experiência e apresentar-nos um molde da sua mão. Fizemos, para isso, os preparativos necessários. Compramos 2 quilos da melhor parafina, como a empregam na iluminação, substância branca, cerosa, porém um pouco mais quebradiça que a cera; fundi-a e derramei-a em um balde meio cheio de água quente para conservá-la no estado fluido. Enchi, depois, um outro balde de água fria.


Tínhamos reunido um círculo escolhido de cerca de doze pessoas; o único estrangeiro era um médico alemão, o Dr. Friese, que se interessava pelas investigações espíritas. Uma cortina isolava um canto da nossa sala de sessões. O Sr. Eglinton assentou-se atrás dela, no meio, no ponto de junção das cortinas, colocando-se à sua frente o Dr. Friese, que lhe segurava as mãos. A luz do gás era brilhante a ponto de nos vermos perfeitamente. Quando tudo ficou pronto, eu trouxe do meu gabinete os dois baldes e coloquei-os no canto da sala, por trás da cortina, distante 6 pés de Eglinton, cujas mãos, como acima dissemos, foram seguras pelo Dr. Friese. As pessoas e os objetos estavam colocados na ordem seguinte:


Os dois baldes O Sr. Eglinton A cortina


O Dr. Friese


“Os assistentes ficaram sentados o mais longe possível desta última. Todos estavam distintamente visíveis; ninguém se aproximava nem podia aproximar-se dos baldes. Ao fim de alguns segundos, ouvimos vozes no canto da sala, junto dos baldes, e barulho na água. Depois, feitos os sinais por meio de golpes, corri e retirei os baldes que estavam atrás da cortina. Na água fria boiavam duas mãos de parafina solidificada. Uma delas assemelhava-se a uma espessa luva branca de alabastro; a outra era semelhante, porém menor. Quando levantei a maior, verifiquei que ela estava oca e que apresentava uma forma de mão humana; a menor era um molde de mão de criança. Uma dama presente reconheceu nesta uma particularidade de formação que assinalava a mão de sua filha, afogada na África austral com a idade de cinco anos. Conduzi os dois baldes para o meu gabinete, repondo os moldes na água; fechei a porta e pus a chave no meu bolso.


No dia seguinte pela manhã, o gesso fino que mandamos vir de Paris foi diluído e introduzido no molde grande. Para obter a moldagem, o molde tinha de ser sacrificado. Um molde de mão humana com todos os seus dedos separados exigiria muitos predicados, a fim de serem visíveis na moldagem obtida. O que eu fiz consistiu apenas em introduzir o gesso liquefeito no molde, deixá-lo endurecer e sacrificar o molde, fazendo-o derreter na água quente. Esse belo molde da mão de minha falecida filha Willie, com seus dedos delicados e artísticos e seu ar gracioso, justamente como os tinha ela em vida, acha-se hoje dentro de uma redoma, sobre a minha mesa. Quando coloco a minha mão na mesma posição, a semelhança da moldada, ainda que menor um terço, torna-se logo evidente; não se assemelha às mãos de convenção feitas pelos escultores: é mão verdadeira, natural, anatômica, com cada um dos seus ossos e tendões, apresentando claramente marcados os mais finos traços da pele. Era a mesma mão que eu conhecera durante a sua vida mortal e que tantas vezes eu tinha visto e sentido quando se materializava.”


Cumpre lembrar que o Espiritismo não inventou nenhuma teoria para explicar os fatos: foram os próprios Espíritos que descreveram o seu estado no espaço e que, pelas experiências a que prestavam seu concurso, estabeleceram as condições em que vivem, depois de terem abandonado a Terra.


Verificamos como Katie King, o Espírito materializado, era verdadeiramente uma mulher: soubemos que ela respirava, que seu coração batia, em uma palavra: que tinha todos os caracteres fisiológicos de um ser vivo. Agora, vemos os moldes de parafina reproduzirem membros do corpo, com seus ossos, tendões e mesmo os menores traços da pele; igual observação é aplicável às impressões deixadas pelo pé descalço, na experiência de Zöllner com Slade.


Que se conclui desses fatos, a não ser que o perispírito, isto é, o invólucro fluídico da alma, é o molde em que se incorpora a matéria terrena durante a encarnação? Na morte, os elementos que formavam o corpo humano voltam à natureza, mas o invólucro indefectível do Espírito subsiste e conserva todas as aptidões e propriedades que tinha na Terra. Forneça-se-lhe matéria e força vital, e logo esse organismo entra em função e reproduz o indivíduo; essa vida, porém, é momentânea, temporária, porque é anormal; sua duração é também muito reduzida, e raramente o fenômeno atinge a intensidade que vimos em casa de William Crookes.


Em outra obra, intitulada A Evolução Anímica, estudamos minudentemente todos esses fenômenos, mostrando a ação do perispírito durante a vida. Indicamos ali como esse perispírito pôde adquirir suas propriedades funcionais e, ao mesmo tempo, estabelecemos suas relações com o Espírito, do qual ele constitui o que chamamos o inconsciente.


Em relação à explicação espírita, não é inútil mostrar como os sábios incrédulos, obrigados a se dobrarem à evidência dos fatos, tentam forjar teorias para explicar esses fenômenos, tão estranhos às suas idéias sobre a força e a matéria. Eis a narrativa das experiências do professor Lombroso, feita por ele mesmo.


O Espiritismo e a Psiquiatria


Explicação psiquiátrica de certos fatos espíritas,pelo professor C. Lombroso


“Poucos homens de ciência foram, mais do que eu, incrédulos acerca do Espiritismo. Para se convencerem disso, basta que consultem a minha obra Pazzi ed Anomali (Loucos e Anormais), e bem assim os meus Studi sul Ipnotismo (Estudos sobre o Hipnotismo), nos quais me deixei empolgar até insultar os espíritas. Achava e ainda acho completamente inadmissíveis muitas asserções dos espíritas, tais como a possibilidade de se fazer conversar e agir os mortos. Nada mais sendo os mortos que um acúmulo de substâncias inorgânicas, dizer-se isso equivale a pretender que as pedras pensem ou possam falar.


Uma outra razão da minha incredulidade era a obscuridade em que se efetuam, quase sempre, tais experiências, pois um fisiologista não admite senão os fatos que pode observar em plena luz.


Mas, depois de ter ouvido alguns sábios negarem os fatos do hipnotismo, como a transmissão do pensamento ou a transposição dos sentidos, que, pelo fato da sua raridade, não deixam, por isso, de ser positivos, e que por mim foram constatados de visu, fui levado a perguntar a mim mesmo se o meu cepticismo em relação aos fenômenos espíritas não era da mesma espécie que o dos outros sábios relativamente aos fenômenos hipnóticos.


Tendo eu sido convidado para examinar os fatos produzidos em presença de uma médium realmente extraordinária, a Sra. Eusápia, aquiesci com todo o empenho, pois que assim podia estudá-los com o concurso de alienistas distintos (Tamburini, Virgilio, Bianchi, Vizioli), que eram quase tão cépticos quanto eu nessa matéria e que poderiam auxiliar-me na verificação dos fenômenos. “Tomamos as maiores precauções. Tendo nós examinado a médium segundo o processo da psiquiatria moderna, constatamos nela uma notável obtusidade do tato (3, 6), perturbações histéricas, talvez mesmo epilépticas, e traços de uma lesão profunda no parietal esquerdo.


Os pés e as mãos da Sra. Eusápia foram imobilizados pelo Dr. Tamburini e eu, por meio dos nossos pés e das nossas mãos.


Começamos e terminamos as nossas experiências com a lâmpada acesa e, de tempos a tempos, um de nós riscava, de improviso, um fósforo, para evitar qualquer embuste.


Os fatos observados foram assaz singulares; pudemos verificar, em plena luz, o levantamento de uma mesa e das nossas cadeiras, e achamos que o esforço necessário para fazer isso equivalia a um peso de 5 a 6 quilos. A pedido de um dos assistentes, o Sr. Ciolfi, que já conhecia a médium de longa data, fizeram-se ouvir pancadas no interior da mesa. As pancadas (na linguagem convencional entre os espíritas) respondiam perfeitamente às perguntas que se faziam a respeito da idade das pessoas presentes e dos fatos que deviam acontecer, e que aconteceram efetivamente, dizendo que eles eram produzidos por um Espírito.


Feita a obscuridade, começamos a ouvir pancadas mais fortes no meio da mesa e, pouco depois, uma campainha, colocada num aparador distante a mais de um metro de Eusápia, começou a tocar no ar e por cima das cabeças dos assistentes, descendo, depois, sobre a mesa. Passados alguns momentos, ela foi colocar-se num leito situado a 2 metros da médium. Nesse tempo, a pedido dos assistentes, enquanto soava a campainha, o Dr. Ascenti foi colocar-se por trás da Sra. Eusápia e riscou um fósforo, de modo que pôde ver a campainha suspensa no ar e indo cair atrás da médium.


Depois, ainda na obscuridade, vimos uma mesa mover-se e, enquanto as mãos da médium estavam sempre bem seguras pelo Dr. Tamburini e por mim, o professor Vizioli sentia que lhe puxavam o bigode, que lhe batiam nos joelhos, contactos estes que lhe pareciam provir de uma mão pequena e fria.


Ao mesmo tempo, senti puxarem a cadeira em que eu estava sentado e, em seguida, deixarem-na.


Uma pesada colcha, saindo da alcova, distante a mais de um metro da médium, veio a mim, de súbito, como que impelida pelo vento, e envolveu-me completamente. Busquei desembaraçar-me dela, mas só com dificuldade consegui isso.


Os outros assistentes observaram, na altura de 10 centímetros, acima da minha cabeça e da do professor Tamburini, pequenas chamas amareladas. O que mais me admirou foi o transporte de um prato cheio de farinha, efetuado de modo que esta ficou coagulada como gelatina. Esse prato tinha sido posto na alcova, afastado mais de um metro e meio de nós; a médium tinha pensado no deslocamento do prato, mas para lançar-nos ao rosto a farinha.


No meio de suas convulsões, a Sra. Eusápia tinha dito: “Cuidado, vou lançar aos vossos rostos a farinha que aqui se acha.”


“Reacendendo a lâmpada, rompemos a cadeia que formávamos ao redor da mesa e verificamos o transporte do prato e da farinha.


Pouco depois, vimos um grande móvel, que se achava a 2 metros de nós, aproximar-se, lentamente, como se alguém o conduzisse. Parecia um gigantesco paquiderme que avançava para nós.


Ultimamente, repetindo eu essas experiências com os professores de Amicis, Chiaia, Verdinois, vi uma cadeira saltar do solo para cima da mesa e, depois, voltar ao seu lugar. Eu tinha feito a Sra. Eusápia segurar dois dinamômetros: eles marcaram 37 e 36 quilogramas.


Durante a sessão e enquanto segurávamos as mãos da médium, esta nos disse: “Agora estão forçando os aparelhos.” Acendemos a luz, e os dois dinamômetros, que estavam a meio metro distantes dela, marcavam 42 quilogramas.


Experiências análogas foram executadas pelos Drs. Barth e Defiosa, que me escreveram terem visto e ouvido, por muitas vezes, uma campainha soar no ar, sem ser agitada por pessoa alguma. O banqueiro Hirsch, que se achava com eles, tendo pedido para conversar com uma pessoa amiga já falecida, viu sua imagem e ouviu-a falar em francês (essa pessoa era francesa e tinha falecido vinte anos antes).


Do mesmo modo, o Dr. Barth viu seu pai também falecido, e sentiu-se por duas vezes abraçado por ele. Todos viram pequenas chamas na cabeça da Sra. Eusápia.”


A explicação


“Nenhum desses fatos (que convém, entretanto, admitir, porque ninguém pode negar fatos verificados) são de natureza a fazer supor, para explicá-los, um mundo diferente do admitido pelos neuropatologistas.


Antes de tudo, não se deve perder de vista que a Sra. Eusápia é neuropata; que ela, em sua infância, recebeu um golpe no parietal esquerdo, produzindo uma cavidade assaz profunda para se poder aí introduzir um dedo; que, depois, ficou sujeita a acessos de epilepsia, de catalepsia e de histeria, que se produzem sobretudo durante os fenômenos mediúnicos; que, enfim, apresenta, notável obtusidade do tato.


Também eram neuropatas os médiuns admiráveis, tais como Home, Slade, etc.


Pois bem! Nada vejo de inadmissível em que, nos histéricos e hipnóticos, a excitação de certos centros, que se torna poderosa em conseqüência da paralisia de todos os outros e provoca, então, uma transposição e uma transmissão das forças físicas, possa também produzir uma transformação em força luminosa ou em força motriz. Compreende-se que a força, a que eu chamarei cortical ou cerebral, de um médium, pode, por exemplo, levantar uma mesa, puxar a barba de alguém, bater-lhe, acariciá-lo, fenômenos assaz freqüentes nesses casos.


Durante a transposição dos sentidos devido ao histerismo, quando, por exemplo, o nariz e o queixo vêem (é o fato que eu próprio observei), no momento em que todos os outros sentidos estão paralisados, o centro cortical da visão, que tem sua sede no cérebro, adquire tal energia que se substitui ao olho. Foi o que verificamos, eu e Ottolenghi, em três hipnotizados, servindo-nos de lentes e de um prisma.


Quando o indivíduo hipnotizado vê um objeto sugerido, principalmente quando se lhe sugere que não veja uma coisa existente (sugestão negativa), apesar de estar ela sob seus olhos, o centro visual cortical substitui então os olhos: ele vê quando os olhos não vêem o que deviam ver.


As imagens provenientes de excitações interiores, tais as alucinações sugeridas (como, por exemplo, quando se faz ver ao indivíduo uma mosca imaginária sobre um papel branco), apresentam-se a alguns hipnotizados como se fossem reais. Deve-se, pois, admitir que elas vão do cérebro à periferia, isto é, em sentido contrário das imagens verdadeiras, que vão da periferia ao centro. Com efeito, elas sofrem as modificações que podem provir dos meios interpostos.


Assim, tentamos fazer ver uma mosca imaginária a um indivíduo hipnotizado. Fizemos avançar e retrogradar essa imagem no espaço, e a pupila variava como se a imagem fosse real; ainda mais, por meio da lente, a mosca imaginária crescia ou decrescia conforme os movimentos daquela. Conseguimos mesmo obter do sugestionado o emprego de um prisma imaginário, como se existisse realmente. Para que, porém, isso aconteça, é necessário que o centro cerebral da visão seja substituído ao órgão natural da visão, isto é, que o cérebro veja como os olhos.


Examinemos agora o que se dá quando há transmissão do pensamento. Em certas condições, muito raras, o movimento cerebral a que chamamos pensamento transmite-se a uma distância pequena ou considerável. Ora, do mesmo modo que essa força se transmite, ela pode também transformar-se, e a força psíquica torna-se força motriz; há no cérebro aglomerações de substância nervosa (centros motores) que presidem precisamente aos movimentos e que, sendo irritadas, como nos epilépticos, provocam movimentos muito violentos nos órgãos motores.


Objetar-me-ão que esses movimentos não têm como intermediário o músculo, que é o meio mais comum de transmissão dos movimentos; mas, tampouco o pensamento, nos casos de transmissão, se serve de seus meios ordinários de comunicação, que são a mão e o laringe. Nesses casos, portanto, o meio de comunicação é o que serve a todas as energias, e a que podemos chamar, servindo-nos de uma hipótese constantemente admitida, o éter, pelo qual se transmitem a luz, a eletricidade.


Não vemos o ímã fazer mover o ferro, sem intermediário visível?


Nos fatos espíritas, o movimento toma uma forma, aproximando-se mais da volitiva, porque parte de um motor que é, ao mesmo tempo, um centro psíquico: o córtex cerebral.


A grande dificuldade consiste em admitir o cérebro como órgão do pensamento e o pensamento como um movimento; porque, em física, não há dificuldade em se admitir que as energias transformam-se e que uma energia motriz pode tornar-se luminosa ou calorífica.


Depois da obra do Sr. Janet sobre o automatismo inconsciente, não se tem mais que buscar explicar o caso dos médiuns escreventes.


Esse médium, que acredita escrever sob o ditado de Tasso ou de Ariosto e que compõe versos indignos de um colegial, age em estado de semi-sonambulismo, no qual, graças à ação preponderante do hemisfério direito durante a inatividade do esquerdo, ele não tem consciência do que faz e acredita escrever sob o ditado de um outro.


Esse estado de atividade inconsciente explica os movimentos e os gestos que a mão pode fazer, sem que participem disso o resto do corpo e o indivíduo, e que parecem ser o efeito de uma intervenção estranha.


Muitos fatos espíritas são apenas o efeito da transmissão do pensamento dos assistentes, colocados junto ao médium, ao redor da mesa, que, até certo ponto, favorece essa transmissão, pois, como observei outrora, as transmissões chegam mais facilmente quando se está a pequena distância do hipnotizado e melhor para as pessoas que estão em maior contacto com ele. A mesa ao redor da qual se forma a cadeia é uma causa de fácil contacto e uma causa certa de aproximação.


Sempre vi os fatos espíritas (puxamento de barba, contacto de mãos) darem-se mais freqüentemente com as pessoas que estão mais perto do médium.


Quando a mesa dá uma resposta exata (por exemplo, quando ela diz a idade de uma pessoa só por esta conhecida), quando cita um verso em língua que o médium não conhece, o que assombra os profanos, isso sucede porque um dos assistentes conhece essa idade, esse nome, esse verso, e neles fixa o seu pensamento vivamente concentrado na ocasião da sessão e transmite, depois, o seu pensamento ao médium, que o exprime por seus atos ou o reflete, algumas vezes, sobre um dos assistentes.


Justamente por ser o pensamento um movimento, não só ele se transmite, como também se reflete. Observei casos de hipnotismo em que o pensamento não só se transmitia, mas também se refletia sobre uma terceira pessoa, que não era o agente nem o percipiente, e que não tinha sido hipnotizada. É o que acontece com a luz e a onda sonora.


Se, no círculo formado ao redor da mesa misteriosa, não houver pessoa que saiba o latim, a mesa não fala latim. O grande público, porém, que não raciocina assim, logo acredita que o médium fala o latim por inspiração dos Espíritos e crê também que pode conversar com os mortos.


Assim se explicam os casos dos Srs. Hirsch e Barth, que viram seus parentes mortos e ouviram suas vozes: o pensamento da mulher, transmitido ao médium, irradiou sobre eles e, como o pensamento toma em todos os homens a forma de imagem fugitiva, por causa da rapidez com que se associam as idéias, eles viram a imagem de seus parentes, cuja lembrança conservavam inteiramente viva.


Quanto às fotografias espíritas, tenho visto muitas, mas em nenhuma tenho confiança. Enquanto eu mesmo não tiver obtido uma, não poderei emitir juízo sobre o assunto.


A objeção, pela maioria apresentada, é a seguinte: Por que a médium, a Sra. Eusápia, por exemplo, tem um poder que falta aos outros?


Dessa diferença surge a suspeita de uma fraude, suspeita natural, sobretudo nas pessoas vulgares, e que é a explicação mais simples e mais do gosto da multidão que evita refletir e estudar.


Essa suspeita, porém, desaparece do espírito do psicologista prático no exame dos histéricos e dos simuladores.


Aqui, trata-se de fatos muito simples e assaz vulgares (puxar a barba, suspender a mesa), sempre mais ou menos os mesmos e repetidos com invariável monotonia, ao passo que um simulador os variaria, inventaria outros mais divertidos e maravilhosos.


Além disso, os charlatães são numerosos e os médiuns, bastante raros. Na Itália somente conheci dois, ao passo que tenho encontrado e tratado de uma centena de histéricos simuladores.


Se os fatos espíritas fossem sempre simulados, deveriam ser numerosos, não excepcionais.


Repito, devemos buscar a causa dos fenômenos nas condições patológicas do médium, precisamente como o demonstrei para os fenômenos hipnóticos.


O grande erro da maioria dos observadores consiste em estudarem o fenômeno hipnótico e não a pessoa em que ele se produz; ora, a médium, a Sra. Eusápia, apresenta anomalias cerebrais bastante graves, das quais procede, sem dúvida, a interrupção das funções de alguns centros cerebrais, ao mesmo tempo que o crescimento da atividade de outros centros, especialmente os dos centros motores. Eis a causa dos singulares fenômenos mediúnicos. Algumas vezes, os fenômenos, especiais aos hipnotizados e aos médiuns, operam-se, é certo, em indivíduos no estado normal; mas, isso sucede no momento de profunda emoção, nos moribundos, por exemplo, que pensam na pessoa querida com toda a energia do período pré-agônico.


O pensamento transmite-se, pois, sob a forma de imagem, e aí temos o fantasma a que chamam, hoje, alucinação verídica ou telepática.


Justamente por ser um fenômeno patológico e extraordinário, só se encontra em circunstâncias graves e em indivíduos que não dispõem de grande inteligência, ao menos no instante do acesso mediúnico.


É provável que, em tempos já muito remotos, quando a linguagem se achava no estado embrionário, a transmissão do pensamento fosse muito mais freqüente, como os fenômenos mediúnicos então chamados magia, profecia, etc. Porém, com o progresso, com o aperfeiçoamento da escrita e da linguagem, o modo da transmissão direta do pensamento foi desaparecendo pouco a pouco, tornando-se ele inútil, nocivo e mesmo pouco cômodo, porque traía os segredos e comunicava as idéias com uma exatidão insuficiente.


Quando, enfim, se compreendeu que essas formas neuropáticas não tinham a importância que lhes queriam atribuir e que eram patológicas, não divinas, viu-se diminuírem e desaparecerem as magias, os fantasmas, os intitulados milagres, que eram, quase todos, fenômenos reais, mas mediúnicos.


Nos povos civilizados não se mostraram essas manifestações senão em casos raros, ao passo que continuam em vasta escala entre os povos selvagens e nos indivíduos neuropatas.


Estudemos, observemos, pois, como na neurose, as convulsões, o hipnotismo, o indivíduo mais que o fenômeno, e acharemos uma explicação mais completa e menos maravilhosa do que parecia a princípio. Por ora, desconfiemos dessa pretendida finura de espírito que consiste em ver por toda parte simuladores e em crer que só nós somos os sábios, quando precisamente essa pretensão pode mergulhar-nos no erro.


Turim, 12 de março de 1892.

Lombroso.”


Observações sobre a teoria do professor Lombroso


Os cientistas, em geral, são muito circunspectos quando se acham diante de um fenômeno pouco conhecido ou ainda insuficientemente estudado. Em fisiologia, eles abster-se-iam de formular hipóteses para explicar um fato, antes de haverem longamente experimentado e reunido considerável número de evidências para apoiarem o seu modo de ver. Quando, porém, se trata do Espiritismo, toda essa prudência desaparece e o sábio arroja-se a construir sistemas, cada qual mais inverossímil.


Precedentemente, vimos as teorias de Babinet, de Faraday, de Chevreul, sobre as mesas girantes. Sabemos o que resta agora de todas elas, depois das experiências de Crookes e da Sociedade Dialética de Londres. Eis, portanto, o professor Lombroso caindo no mesmo engano e, depois de assistir apenas a duas sessões, buscando uma explicação do fato exteriormente à Doutrina Espírita. Viu ele todos os fenômenos produzidos pelos Espíritos? Viu a escrita direta, a fotografia dos Espíritos materiali-zados e as moldagens? Não, Lombroso não verificou a realidade senão de pequena parte do domínio espírita e, apesar dessa pequena bagagem de observações, não teme proclamar urbi et orbi que conhece a causa desses fenômenos. Vimo-lo, em sua demonstração, fazer um mea culpa acerca da realidade dos fatos que, como bom materialista, negou por tanto tempo. Estamos certos de que, se o professor Lombroso quiser prosseguir nesses estudos, retratar-se-á também, a exemplo dos seus sábios colegas Wallace, Mapes, Robert Hare, Varley, Fechner, etc. 60


Estes, a princípio, também haviam acreditado na ação inconsciente do médium; um estudo mais atento, porém, convenceu-os de que essa hipótese não era aceitável e, por isso, só adotaram as afirmações espíritas quando lhes não foi possível achar outras mais racionais.


Examinemos a teoria psiquiátrica do célebre criminalista e veremos que ela não prova coisa alguma; nem mesmo é nova. Aí acharemos reunidos esses velhos conhecidos dos espíritas, chamados transmissão do pensamento, personalidade inconsciente ou segunda personalidade; mas o professor ligou-os todos pela teoria da transformação da força, de modo que, juntando-lhes a alucinação, que ele não podia decentemente esquecer, temos a coleção quase completa dessas objeções, sem fundamento, contra a nossa doutrina, e que há vinte anos rastejam por toda parte.


Essa ressurreição, menos maravilhosa que a de Lázaro, seria necessária? Ah! não, porque todas essas hipóteses não adquiriram, envelhecendo, uma nova virtude, e os fatos, sempre mais numerosos e melhor estudados, lhes imporão desmentidos tão flagrantes que quase nos parece inútil prosseguir nesta discussão. Basta, simplesmente, pedir ao professor Lombroso que estude. Isso, no entanto, pode parecer pouco respeitoso; por essa razão vamos examinar rapidamente as peças do processo.


Eusápia é neuropata e histérica, está entendido; suponhamos mesmo que ela carregue todas as anomalias imagináveis do sistema nervoso. Explicará isso: 1º- O passeio da campainha pelo espaço? 2º- O deslocamento de um grande móvel, como se fosse um paquiderme? 3º- O puxamento, por muitas vezes, da barba de um dos respeitáveis professores? 4º- O transporte do prato de farinha?


Evidentemente não, porque a força que emana do médium não possui, que o saibamos, mãos. Ora, como pode agir essa força sem intermediário? Que essa força seja capaz de produzir clarões já é de difícil compreensão, mas poderá isso, a rigor, ser explicado por uma transformação da energia que se escapa do médium; porém, que ela atue de modo a acariciar alguém, eis o que é absolutamente incompreensível.


Que o éter seja o veículo da força, estamos de acordo, mas essa força não dispõe de órgãos. A vontade do indivíduo (outra dificuldade, porque é preciso admitir-se uma vontade inconsciente) não pode substituir as mãos. Suponhamos ter um sopro assaz poderoso para poder deslocar um móvel: esse sopro será, se o quiserem, a imagem da força que emana do médium; o sopro que pode, a rigor, suspender uma mesa ou arrastar um aparador pela sala poderá fazer uma campainha passear pelo espaço ou puxar a barba de um assistente? Certamente que não, e a explicação do professor deixa muito a desejar, e de tal modo que é inadmissível.


O professor Vizioli sentia um contacto de mão pequena e fria. Como a força do médium se havia transformado em mão? O professor Lombroso reconhece que o cérebro vê sem o auxílio dos olhos.


Perguntar-lhe-emos, respeitosamente, quem vê? Serão as camadas corticais, os centros ópticos? Porém, estas não são mais que simples aglomerações de matéria fosfórica, e ainda não foram dotadas da faculdade de ver! Só a câmara escura, a que chamamos olhos, é capaz de armazenar os raios luminosos e dar-nos a sensação da luz. Entretanto, reconheceis, sábio Doutor, que a vista se exerce pelo cérebro, sem aparelho óptico; logo, a alma existe; é ela quem vê, como lhe acontece depois da morte, quando não mais dispõe de um corpo material.


Ela existe, pois, durante a vida, e a prova é-nos fornecida por vós mesmo.


Vimos o que se deve julgar da explicação do Sr. Janet acerca da escrita automática dos histéricos; contentar-nos-emos, pois, em lembrar que nada há de comum entre essas experiências e os fenômenos espíritas.


O professor Lombroso não insiste sobre as fotografias, que são, no entanto, uma prova decisiva, contentando-se em dizer que ainda as não obteve.


É lamentável que o eminente fisiologista despreze os fatos que destroem totalmente a teoria da alucinação, porque as visões do Dr. Barth e do Sr. Hirsch, se fossem irradiações do seu pensamento, poderiam ser fotografadas, pois estavam tão materializadas que falaram. As palavras pronunciadas por essas aparições não são reflexos do pensamento, pois os operadores ignoravam o que o Espírito ia dizer; tendo sido ouvidas por todos os assistentes, não existiam nos cérebros dos Srs. Hirsch e Barth: logo, a teoria de Lombroso é manifestamente insuficiente e, além disso, totalmente inexata para explicar tais fenômenos.


O célebre fisiologista procede fazendo afirmações acerca da transmissão do pensamento. Diz ele: assim, e não pode ser de outro modo, o pensamento irradia, reflete-se no cérebro do médium. Quando, porém, o médium dá nomes inteiramente desconhecidos dos assistentes, será isso um reflexo de quem ou de quê? Dos Espíritos que a fazem mover.


Outra coisa: Quando a mesa se expressa em uma língua estranha, é, diz Umbroso, porque algum dos assistentes conhece essa língua. Admitimos o fato de um dos experimentadores conhecer essa língua, porque, sem isso, não se poderia constatar que uma língua estranha era empregada; mas, como é que esse conhecimento tem influência bastante para agir sobre o cérebro do médium e ditar-lhe discursos? O fato de eu saber o latim não fará que um médium escreva nessa língua, sobretudo quando ignoro o que o médium está escrevendo e não tenho vontade de influenciá-lo.


Que resta, pois, dessa famosa teoria? Absolutamente nada. Não só ela não explica racionalmente os fatos para os quais foi imaginada, mas também deixa de parte grande número de outros. Nessas condições, só temos de regozijar-nos vendo os sábios reduzidos a imaginar hipóteses inverossímeis e a negarem a existência dos Espíritos, por quererem explicar os fenômenos a seu modo.


Que o professor Lombroso estude mais e, talvez, melhor instruído, encontre en-fim uma explicação menos banal e mais adequada aos fatos, tais são os nossos votos.


Resumo


Acabamos de ver, rapidamente, desenrolar-se diante de nós o encadeamento dos fatos, desde as mesas giratórias até as aparições materializadas. Verificamos que cada uma das fases do fenômeno foi estudada no mundo inteiro pelos sábios de maior competência. Vimos em ação os incrédulos negando obstinadamente os fatos, até que estes fossem mais bem demonstrados, e que alguns, sendo forçados a admitir-lhes veracidade, encastelaram-se em teorias que julgaram inatacáveis. Bem depressa, porém, essas teorias tornaram-se insuficientes, à vista do desenvolvimento cada vez mais característico das experiências. À mesa girante, à escrita automática seguiram-se os altos fenômenos do Espiritismo transcendental, e vemos o cepticismo tentar seus esforços com as hipóteses do Dr. Von Hartmann e do professor Lombroso, tão extemporâneas e lastimáveis. A última palavra ficou para o Espiritismo, que, mais forte, mais vivaz, mais convincente que nunca, dirige-se para a conquista do mundo.


Poderia ser de outro modo?


Sem idéia preconcebida, sem espírito de sistema, essas maravilhosas manifestações não trazem em si próprias a sua certeza? Que se poderia objetar contra a sua autenticidade ou contra o seu valor?


No mundo inteiro, fenômenos, desde os mais simples até os mais complexos, são reproduzidos em abundância diante de observadores, incrédulos, a princípio, e que os estudaram com uma desconfiança quase injuriosa, até o momento em que foram convencidos da sua realidade.


Entre essa inumerável quantidade de testemunhos, escolhemos, propositalmente, aqueles cuja autoridade era maior, tanto pelo valor científico dos observadores quanto pela honorabilidade de seus autores. Discutimos imparcialmente as teorias opostas pelos negadores; vimos que os fatos desmentem por si mesmos essas hipóteses e que não foi com argumentos lógicos, com artifícios de raciocínio que a sua falsidade se demonstrou, mas, simplesmente, com outros fatos que destruíram essas pretendidas explicações.


Todos aqueles que têm um nome no domínio das ciências foram chamados a se pronunciarem; os mestres mais competentes, quando aplicaram tempo suficiente a essas investigações, proclamaram a incontestável realidade das manifestações espíritas. Os Espíritos, não se contentando em falar pela mesa e pela escrita, não satisfeitos em se fazerem ver ou ouvir pelos médiuns, escrevem diretamente, aparecem aos olhos de toda uma assembléia, deixam-se fotografar e, como lembrança da sua passagem, legaram-nos reproduções de seus membros materializados. São as mais cabais e as menos contestáveis provas da existência da alma depois da morte do corpo; nenhuma negação, nenhum anátema será capaz de desenraizar de nossos corações a sublime e inabalável certeza da imortalidade do ser pensante.


As teorias materialistas não são mais que orgulhosas declamações, sem apoio real. As religiões sentem desabar a sua andaimaria de dogmas e de mistérios, e, sobre essas ruínas amontoadas, paira a alta e serena doutrina da imortalidade, perpetuando a vida inesgotável através do infinito dos tempos e das extensões.


É pelo estudo do mundo de além-túmulo, como veremos adiante, que se explicam as dificuldades da vida terrena. É na erraticidade que se verifica a execução dessa justiça, tantas vezes desfalecente no nosso mundo; é aí que se encontra, enfim, essa felicidade, em cuja procura aqui se gasta a vida; é aí que o Espírito, desembaraçado dos cuidados materiais, pode entrever, de outro modo que não seja através de uma vã fraseologia, a verdadeira fraternidade: o amor sem limites de cada um por todos e de todos por cada um.


Espalhemos profusamente essas idéias, elevemos o coração até essas alturas serenas donde o egoísmo é banido, e teremos feito uma obra de bons cidadãos, e teremos preparado o advento do reinado da verdade, que é concórdia e fraternidade.


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