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Capítulo II



Os tempos modernos


Capítulo II


– Na América: A família Fox; o primeiro Espírito batedor

– As perseguições em Rochester

– Desenvolvimento considerável do fenômeno; seus múltiplos aspectos

– Os sábios

– O professor Mapes

– O juiz Edmonds

– Robert Hare; suas experiências

– Robert Dale Owen

– O Espiritismo atualmente

– Na Inglaterra: As investigações de Crookes

– A Sociedade Dialética de Londres

– Os testemunhos de Alfred Wallace, Varley, Morgan, Oxon, Dr. Sexton, Dr. Chambers, Dr. Gully

– Na França: Trabalhos do Barão de Guldenstubbé – A obra de Allan Kardec

– Os adversários do Espiritismo – Agénor de Gasparin, Thury, Des Mousseaux, Chevillard, etc

– Adesões de homens célebres

– Estado atual

– Na Alemanha: As pesquisas do Dr. Kerner

– os fatos de Mottlingen; as experiências de Zöllner, Fechner e Ulrici

– Enumeração dos espíritas ilustres no resto da Europa

– Os principais jornais que tratam da Doutrina

– Importância do movimento

– Resumo.



Na América


Em 1847, a casa de um certo John Fox, residente em Hydesville, pequena cidade do Estado de New York, foi perturbada por estranhas manifestações; ruídos inexplicáveis faziam-se ouvir com tal intensidade que essa família não pôde mais repousar.


Apesar das mais numerosas pesquisas, não se pôde encontrar o autor dessa bulha insólita; logo, porém, se notou que a causa produtora parecia ser inteligente. A mais jovem das filhas do Sr. Fox, chamada Kate, familiarizada com o invisível batedor, disse: “Faça como eu”, e bateu com as suas mãozinhas um certo número de pancadas, as quais o agente misterioso repetiu. A Sra. Fox disse-lhe: “Conte dez.” O agente bateu dez vezes. “Que idade tem a nossa filha?” A resposta foi correta.


A esta pergunta: “Sois um homem, vós que bateis?”, nenhuma resposta se obteve; mas, a esta outra: “Sois um Espírito?”, houve resposta com pancadas rápidas e nítidas.


Chamados os vizinhos, estes foram testemunhas dos mesmos fenômenos. Todos os meios de vigilância foram postos em ação para a descoberta do invisível batedor, mas o inquérito da família e o de toda a vizinhança foi inútil. Não se pôde descobrir a causa real daquelas singulares manifestações.


As experiências seguiram-se, numerosas e precisas. Os curiosos, atraídos por esses fenômenos novos, não se contentaram mais com perguntas e respostas. Um deles, chamado Isaac Post, teve a idéia de nomear em voz alta as letras do alfabeto, pedindo ao Espírito para bater uma pancada quando a letra entrasse na composição das palavras que quisesse fazer compreender. Desde esse dia ficou descoberta a telegrafia espiritual; este processo é o que vemos aplicado nas mesas girantes.


Eis aí, em toda a sua simplicidade, os preliminares do fenômeno que devia revolucionar o mundo inteiro. Negado pelos sábios oficiais, escarnecido pela imprensa dos dois mundos, posto no Índex pelas religiões medrosas e ciumentas, suspeito à justiça, explorado por charlatães, o Espiritismo devia continuar seu caminho e conquistar adeptos, pois que o número destes se eleva, hoje, a muitos milhões, em virtude de o Espiritismo possuir a mais poderosa força: a verdade.


Os investigadores notaram que o fenômeno só se produzia em presença da jovem Fox; atribuía-se-lhe um certo poder chamado mediunidade.


O Espírito que se manifestava às jovens Fox declarou chamar-se Joseph Ryan e ter sido mascate durante a sua vida terrestre. Convidou as jovens para dar sessões públicas, nas quais ele convenceria os incrédulos de sua existência. A família Fox foi fixar-se em Rochester e, conforme os conselhos de seu amigo do Espaço, as jovens missionárias não hesitaram em afrontar o fanatismo protestante, propondo submeterem-se ao mais rigoroso exame.


Acusadas de impostura e intimadas pelos ministros de sua confissão a renunciarem a essas práticas, o senhor e a senhora Fox, compenetrados do dever supremo de propagar o conhecimento dos fenômenos, que consideravam como grande e consoladora verdade, útil a todos, recusaram submeter-se, e foram expulsos de sua igreja. Os adeptos que se reuniam ao seu redor foram vítimas da mesma reprovação.


Sabe-se que o espírito clerical é o mesmo, seja qual for a latitude em que reine. Intolerância e fanatismo, eis a sua divisa, e, se o braço secular não está mais em seu poder, restam-lhe ainda mil meios para perseguir aqueles que não querem inclinar-se ao seu jugo.


Os conservadores fanáticos da fé dos avós sublevaram a multidão contra a família Fox. Os apóstolos da nova fé ofereceram-se, então, para fazer a prova pública da realidade das manifestações, diante da população reunida no Corynthian-Hall, o maior salão da cidade. Começou-se por uma conferência, onde foram expostos os progressos do fenômeno desde os primeiros dias.


Esta comunicação foi acolhida por uma vaia, mas, não obstante isso, terminou pela nomeação de uma Comissão encarregada de examinar os fatos. Contra a expectativa geral e contra a sua própria convicção, a Comissão viu-se forçada a declarar que, depois de minucioso exame, não tinha podido descobrir vestígio de fraude.


Nomeou-se uma segunda Comissão, que recorreu a processos de investigação mais rigorosos; fez esquadrinhar e mesmo despir as médiuns, por senhoras, bem entendido; ouviram-se sempre os estalidos ou pancadas na mesa, viram-se móveis em movimento; respostas foram obtidas sobre todas as questões, mesmo mentais; nada havia nisso de ventriloquia, de subterfúgios; nenhuma fraude foi possível encontrar. Essa Comissão apresentou um laudo mais favorável ainda que a primeira sobre a perfeita boa-fé dos espíritas e sobre a realidade do incrível fenômeno. É impossível, diz a Sra. Hardinge, descrever-se a indignação que se manifestou ante esta segunda decepção.


Uma terceira Comissão foi escolhida entre os mais incrédulos e mais motejadores. O resultado desta investigação, ainda mais vexatória para as duas pobres jovens que as anteriores, confundiu mais do que nunca os seus detratores.


O ruído do insucesso deste exame supremo espalhou-se pela cidade.


A população, exasperada, julgando ter havido traição dos comissários e conivência destes com os impostores, declarou que, se o laudo lhes fosse favorável, lincharia as médiuns e seus advogados. As jovens, apesar do terror, escoltadas por sua família e por alguns amigos, não deixaram de apresentar-se na reunião, e pediram lugar no estrado da grande sala, decididos todos a perecer, se isso fosse necessário, mártires de uma impopular, mas incontestável verdade.


A leitura do relatório foi feita, por um membro da Comissão que havia jurado descobrir a tramóia; ele, porém, viu-se obrigado a confessar que a causa das pancadas, apesar das mais minuciosas pesquisas, era-lhe desconhecida.


Imediatamente, produziu-se um tumulto medonho; a populaça quis linchar as jovens, e o teria feito, se não fosse a intervenção de um americano chamado Georges Vilets, que fez do seu corpo um escudo e induziu a multidão a sentimentos mais humanos.


Vê-se, por esta narração, que o Espiritismo, desde o seu início, foi severamente estudado. Não foram somente os vizinhos, mais ou menos ignorantes, que certificaram o fato, então inexplicável; foram Comissões regularmente nomeadas que, após minuciosos inquéritos, viram-se obrigadas a reconhecer a autenticidade absoluta do fenômeno.


A perseguição faz, como conseqüência, angariar adeptos para as idéias que combate. Eis por que, poucos anos depois, em 1850, contavam-se já alguns milhares de espíritas nos Estados Unidos.


A imprensa, como sempre, não encontrou número suficiente de sarcasmos para vomitar contra a nova doutrina. Ridicularizava as mesas girantes e os Espíritos batedores, e não havia nenhum escrevinhador de jornais e nenhum sorumbático amanuense que não se desse por autorizado a criticar esses alucinados que acreditavam sinceramente que a alma do seu próximo pudesse erguer o pé de um móvel.


É necessário dizer-se que o fenômeno tomou, em seguida, outro aspecto. As pancadas, em vez de se produzirem sobre as paredes e sobre o soalho, faziam-se ouvir na mesa, em torno da qual estavam reunidos os experimentadores. Esse modo de proceder fora indicado pelos próprios Espíritos.


Observou-se também que, pondo-se as mãos sobre a mesa, esta última era animada por certos movimentos de balanço, e descobriu-se neste fato um novo meio de comunicação. Bastava nomear as letras do alfabeto, para que o móvel indicasse, por uma pancada, aquelas que entravam na composição da palavra que o Espírito queria ditar.


A mania de fazer girar as mesas propagou-se rapidamente. Dificilmente se pode, hoje, figurar a predileção de que essas experiências foram objeto durante os anos de 1850 e 1851. Todas essas investigações conduziram à nova crença homens de reconhecida autoridade moral e intelectual.


Escritores, oradores, magistrados, prelados ilustres aceitaram o fato e a causa da doutrina escarnecida; missionários eloqüentes puseram-se em viagem; escritores fundaram jornais, editaram brochuras que, espalhadas em profusão, impressionaram a opinião pública e abalaram as prevenções.


O movimento acelerou-se tanto que, em 1854, uma petição, apoiada por quinze mil assinaturas, foi dirigida ao congresso legislativo de Washington; seu escopo era fazer que esse congresso nomeasse uma Comissão encarregada de estudar os novos fenômenos e descobrir-lhes as leis.


Essa petição foi posta de lado, mas o impulso não foi obstado, porque os fatos tornavam-se mais numerosos e variados à medida que o estudo prosseguia com perseverança.


O fenômeno das mesas girantes foi logo conhecido em todas as suas particularidades. O modo de conversação, por meio de pancadas e movimentos da mesa, era longo e incômodo. Apesar da habilidade dos assistentes, era necessário muito tempo, muita paciência para obter-se uma comunicação de importância.


A própria mesa ensinou um processo mais rápido. Conforme suas indicações, adaptou-se a uma prancheta triangular três pernas munidas de rodinhas, e a uma delas prendeu-se um lápis; em seguida, colocou-se o aparelho sobre uma folha de papel; o médium colocou as mãos sobre o centro dessa pequena mesa. Viu-se, então, o lápis traçar letras, depois frases, e, daí a pouco, essa prancheta escrevia com rapidez e dava mensagens.


Mais tarde, percebeu-se que a prancheta era completamente inútil, e que bastava o médium colocar a mão, munida de um lápis, sobre uma folha de papel, para o Espírito movê-la automaticamente. Essa espécie de comunicação foi chamada escrita mecânica ou automática, porque o indivíduo, neste estado, não tinha consciência daquilo que a mão traçava no papel.


Outros médiuns obtiveram por esse meio desenhos curiosos, música, ditados acima do alcance da sua inteligência e, às vezes mesmo, comunicações em línguas estrangeiras que lhes eram absolutamente desconhecidas.


O estudo cada vez mais aprofundado dessas manifestações novas conduziu os investigadores a exames ainda mais rigorosos e a resultados mais inesperados para os cépticos.


O raciocínio levara os primeiros investigadores a dizer de si para si que, desde que os Espíritos podiam atuar sobre as mesas, sobre os médiuns, não lhes devia ser impossível fazerem mover diretamente um lápis e escreverem sem o auxílio de aparelhos. Foi o que se realizou. Folhas de papel em branco, encerradas em caixas hermeticamente seladas, foram encontradas, em seguida, cobertas de caracteres. Ardósias, entre as quais se achava um pequeno pedaço de lápis, continham, após a aposição das mãos, comunicações inteligentes, desenhos, etc.


O fenômeno reservava ainda outras surpresas: luzes de formas e cores variadas e em diversos graus de intensidade, apareciam em aposentos sombrios, onde não existia nenhuma substância capaz de desenvolver ação fosforescente, e isso na ausência de todos os instrumentos por intermédio dos quais a eletricidade e a combustão podem ser produzidas.


Esses clarões tomavam, às vezes, a aparência de mãos humanas, de figuras envolvidas por uma névoa luminosa. Paulatinamente, as aparições adquiriam maior consistência, tornando-se possível não somente ver, mas também tocar fantasmas que apareciam em tão singulares circunstâncias.


Fez-se melhor: pôde-se fotografá-los, como veremos mais adiante.

As narrações dessas experiências eram acolhidas com grande incredulidade; porém, como os fatos se produzissem em avultado número e os espíritas não recuassem diante de nenhum meio de propagar a sua fé, a atenção do público sábio e letrado era atraída para esse estudo e, em pouco tempo, conduzia a uma adesão pública homens altamente colocados e muito competentes.


Negligenciamos, voluntariamente, mencionar as inumeráveis declarações feitas por publicistas, médicos, advogados, a fim de reservarmos todo o apelo à atenção do leitor para os testemunhos autênticos dos homens notáveis de ciência que se têm ocupado com esta questão.


Os sábios


Em primeiro lugar, podemos citar uma das personagens mais célebres da magistratura, o juiz Edmonds, primeiro magistrado do Supremo Tribunal do Distrito de New York, onde foi eleito membro do corpo legislativo e nomeado presidente do Senado. Sua conversão ao novo espiritualismo fez grande rumor na União e atraiu contra si uma multidão de invectivas das folhas evangélicas e dos jornais profanos. O juiz Edmonds respondeu-lhes com um livro intitulado: Spirit Manifestation, que produziu nos Estados Unidos profunda sensação e, graças ao auxílio de alguns homens de ciência, cujas experiências vieram confirmar suas asserções, os quinze mil signatários da petição dirigida ao Congresso viram o seu número elevar-se a alguns milhões. Eis como a convicção nasceu na alma do grande jurista americano: Em 23 de abril de 1851 – diz ele – eu era uma das nove pessoas que se assentavam em torno de uma mesa colocada no meio de um aposento, e sobre a qual estava uma lâmpada acesa.


“Uma outra lâmpada tinha sido colocada na chaminé. Em pouco tempo, à vista de todos, a mesa foi elevada cerca de um pé acima do soalho e sacudida para diante ou para trás, tão facilmente como eu poderia agitar uma laranja em minhas mãos. Alguns de nós tentaram fazê-la parar, empregando todas as nossas forças, mas isso foi inútil. Então, retiramo-nos todos para longe da mesa e, à luz das duas lâmpadas, vimos esse pesado móvel de mogno suspenso no ar.


“Resolvi prosseguir essas experiências, julgando tratar-se de uma fraude e decidido a esclarecer o público; porém, minhas pesquisas conduziram-me a conclusão oposta.”


O que cumpre observar nos testemunhos concedidos pelos sábios é que todos os que empreenderam investigações sobre o Modern Spiritualism (nome norte-americano do Espiritismo) fizeram-no com a firme convicção de que se tratava de uma fraude e com o desejo de salvarem os seus contemporâneos dessa loucura contagiosa.


“Eu havia, a princípio, repelido desdenhosamente essas coisas – diz o professor Mapes (que ensinava Química na Academia Nacional dos Estados Unidos) –, mas, quando vi que alguns de meus amigos estavam empolgadissimos pela magia moderna, resolvi aplicar minha atenção a essa matéria, para salvar homens que, respeitáveis e esclarecidos sob tantos outros pontos, neste, corriam vertiginosamente para um abismo.”


O resultado das investigações do professor Mapes foi, como para o juiz Edmonds, uma imersão completa nas águas do Espiritismo.


Aconteceu exatamente o mesmo com um dos sábios mais eminentes da América, o célebre Robert Hare, professor na Universidade da Pensilvânia. Ele começou suas pesquisas em 1853, época em que, como por um dever para com seus semelhantes, resolveu empregar o que possuía de sua influência para embargar a carreira da onda crescente de demência popular, que, a despeito da ciência e da razão, se pronunciava tão obstinadamente a favor daquela grosseira ilusão chamada Espiritismo.


Robert Hare teve conhecimento dos trabalhos de Faraday sobre as mesas girantes (pesquisas que assinalaremos mais adiante) e acreditou que o sábio químico localizara a verdadeira explicação; mas, repetindo suas experiências, reconheceu que elas eram insuficientes e mandou fabricar, para completá-las, aparelhos novos.


Tomou esferas de cobre, colocou-as sobre uma chapa de zinco e fez o médium pôr as mãos sobre as esferas; com grande espanto, observou que a mesa moveu-se. Em seguida, mergulhou as mãos do médium em água, de modo que ele não tivesse comunicação alguma com a prancha sobre a qual estava colocado o vaso que continha o líquido; com grande surpresa sua, uma pressão de dezoito libras foi exercida sobre a prancha. Não convencido ainda, ensaiou um outro processo: a extremidade de uma grande alavanca foi colocada numa balança de espiral, com um indicador móvel e o peso marcado. A mão do médium era colocada na outra extremidade da alavanca, de modo que não lhe fosse possível fazer pressão para baixo e que, muito ao contrário, sua pressão, se fosse exercida, produzisse efeito oposto, isto é, a suspensão da outra extremidade. Qual não foi o espanto do célebre professor quando verificou, pela balança, que o peso havia aumentado de algumas libras!


Veremos, mais adiante, como em semelhante conjetura William Crookes, para se pôr ao abrigo de uma ilusão dos sentidos, construiu um aparelho que registrava automaticamente todas as variações do peso na balança.


Robert Hare, convencido da existência de uma nova força física exercendo-se em condições ainda pouco conhecidas, quis certificar-se da hipótese de que uma inteligência dirigia a manifestação.


Adaptou à mesa um disco em que se viam as letras do alfabeto e o dispôs de forma que o médium não pudesse ver as letras; o quadrante em que elas estavam gravadas mostrava a face aos espectadores instalados a alguma distância da mesa; na outra extremidade desta, mantinha-se o médium, que só podia ver o disco por detrás.


Uma agulha móvel, fixada no centro do quadrante, devia, sucessivamente, indicar as letras das palavras ditadas, completamente ignoradas do médium.


Todos esses pormenores encontram-se no livro publicado, em 1856, pelo Dr. Hare, sob o título Experimental Investigation of the Spirit Manifestation, o qual obteve ruidoso êxito e cujo efeito foi mais considerável ainda que o do juiz Edmonds. Não mais se tratava aí de algumas jovens obscuras ou de charlatães tentando explorar a boa-fé pública; era a ciência oficial que se pronunciava pela boca de um dos seus mais autorizados membros. Desde esse momento, a polêmica empenhou-se furiosa. Houve lutas apaixonadas.


Sábios movimentaram-se contra a feitiçaria moderna, mas nenhuma prova apresentavam de que as experiências tivessem sido malfeitas; a vitória coube, portanto, aos espíritas.


Em suma, vê-se que os mais importantes recrutas do Espiritismo foram forjados entre os homens que tencionavam combatê-lo. Não temos necessidade de insistir neste ponto, porque o mesmo sucedeu na Inglaterra. Os homens de ciência desses países, ciosos de sua dignidade, não quiseram recusar sua cooperação diante daquilo que consideravam superstição popular. Puseram-se corajosamente a estudar e, quando, contra a sua expectativa, foram forçados a reconhecer a realidade dos fenômenos, proclamaram lealmente a verdade, sem temor do ridículo ou do sarcasmo, arma habitual da ignorância e da prevenção.


Um dos últimos convertidos, entre os grandes nomes americanos, foi Robert Da-le Owen, que goza simultaneamente da reputação de sábio e da celebridade especial de escritor na língua inglesa. Seu livro, impresso na Filadélfia, no ano de 1877, sob o título: Footfalls on the Boundary of Another World (Região em Litígio entre este Mundo e o Outro), está pleno de elevadas idéias, de lógicas apreciações e de instrutivas particularidades históricas.


O movimento espírita está, neste momento, mais vivaz do que nunca nos Estados Unidos. Em quase todas as suas grandes cidades existem Sociedades que têm por objeto o estudo e a demonstração do Espiritismo.


Vinte e dois jornais e revistas expõem ao público os trabalhos empreendidos.


O Banner of Light, que se publica em Boston, há mais de vinte anos, é, de alguma sorte, o líder do Modern Spiritualism.


O que demonstra o vigor e a intensidade do movimento espírita são os meetings, isto é, as reuniões que se realizam todos os anos nas margens do lago de Cassadaga.


Os espíritas construíram, nessa região, habitações que podem abrigar mais de dez mil pessoas, mas a afluência é tal que centenas de famílias são obrigadas a acampar nas imediações da cidade.


Esses fatos provam a importância do moderno Espiritualismo, pois que acampamentos semelhantes existem no litoral do oceano Atlântico, do oceano Pacífico e em todas as praias dos grandes e soberbos lagos americanos.


Acrescentamos, terminando, que todas as grandes cidades da União têm Sociedades espíritas regularmente organizadas. Em 1870, já se contavam vinte Centros e cento e cinco Sociedades espíritas, duzentas e sete casas para conferências e pouco mais ou menos de vinte e dois médiuns públicos. O número total dos espíritas é, segundo Russell Wallace, calculado em onze milhões, só nos Estados Unidos.


Na Inglaterra


É, sobretudo, na Inglaterra que encontramos uma plêiade de grandes homens entregues a esses estudos. Queremos citar, em primeiro lugar, um testemunho eminente, o de William Crookes. Acreditamos ser inútil recordar ao leitor os títulos pelos quais esse sábio tornou-se merecedor da gratidão pública. É-nos suficiente dizer que a ele se deve a descoberta do tálio e a demonstração experimental da existência da matéria radiante entrevista por Faraday. Esta nova estrada, aberta às investigações científicas, rasgou imenso e grandioso horizonte à Ciência contemporânea, e pode-se dizer que é uma das maiores descobertas do século.


Um espírito tão eminente não se aventura em terreno desconhecido sem tomar todas as precauções imagináveis contra o erro ou contra a fraude.


Escutemos o que ele diz sobre o Espiritismo, em um artigo publicado em julho de 1870, no Quaterly Review, órgão da Academia de Ciências da Inglaterra:


“O espiritualista fala de corpos pesando 50 ou 100 libras que são elevados no ar, sem intervenção de forças conhecidas; mas o químico está acostumado a fazer uso de uma balança sensível a um peso tão diminuto que seriam necessários dez mil deles para pesar um grão.7 É, por conseguinte, bem fundado pedir-se que esse poder, que se diz guiado por uma Inteligência e eleva até ao teto um corpo pesado, faça mover, em condições determinadas, sua balança tão delicadamente equilibrada.


“O espiritualista fala de pancadas em diferentes partes de um aposento, enquanto duas ou mais pessoas estão tranqüilamente sentadas em volta de uma mesa. O experimentador científico tem o direito de pedir que essas pancadas sejam produzidas no tubo do seu fonógrafo.


“O espiritualista fala de aposentos e casas atormentados e, mesmo, danificados por um poder sobre-humano. O homem de ciência pede, simplesmente, que um pêndulo, colocado sob uma campânula de vidro e repousando em sólida alvenaria, seja posto em oscilação.


“O espiritualista fala de objetos de mobília a se moverem de um aposento para outro, sem a ação do homem; mas o sábio constrói instrumentos que dividem uma polegada em um milhão de partes, e lhe é lícito duvidar da exatidão das observações efetuadas, se a mesma força for impotente para fazer mover de um simples grau o indicador do instrumento.


“O espiritualista fala de flores salpicadas com um fresco rocio, de frutos e, mesmo, de seres viventes transportados através de sólidas muralhas de tijolo. O investigador científico pede, naturalmente, que um peso adicional (que fosse a milésima parte de um grão) seja depositado em uma das conchas de sua balança, quando ela está no mostrador fechado a chave; e o químico pede que se introduza a milésima parte de um grão de arsênico através das paredes de um tubo de vidro no qual se encontra água pura, hermeticamente encerrada.


“O espiritualista fala de manifestações de um poder equivalente a milhares de libras, que se produz sem causa conhecida. O homem de ciência, que crê firmemente na conservação da força e que pensa que ela jamais se produz sem o esgotamento de alguma coisa para substituí-la, pede que as ditas manifestações sejam produzidas em seu laboratório, onde ele poderá pesá-las, medi-as, submetê-las às suas próprias experiências.”8


Vê-se com que desconfiança, com que precaução o sábio químico começa as suas experiências. Ele não quer conceder a sua confiança senão com a condição expressa de que o fenômeno se produza em seu laboratório, de alguma sorte sob seu controle, a fim de estar bem certo de que nenhuma fraude, nenhuma ilusão influiria nos resultados que pudessem produzir-se: eis a verdadeira sabedoria. Quantos de nossos sábios, que negam a priori, estão longe de seguir-lhe o exemplo! As linhas que acima citamos foram escritas em 1870, mas, em 1876, após quatro anos de perseverantes investigações, o grande físico escreveu: “Não digo que isso seja possível, mas sim que isso é real.”


Veremos adiante as experiências que serviram para fortalecer a opinião do sábio inglês.


A Sociedade Dialética de Londres, fundada em 1867 sob a presidência de Sir John Lubbock, e contando entre os seus vice-presidentes Thomas-Henry Huxley, um dos professores mais sábios da Inglaterra, o Sr. Georges-Henry Lewes, fisiologista eminente, decidiu, em sua sessão de 6 de janeiro de 1869, que uma Comissão seria nomeada para estudar os pretendidos fenômenos espíritas, dando conta deles à Sociedade.


O debate suscitado por essa decisão mostrou que a maior parte dos seus membros não acreditava no Espiritismo, e os jornais ingleses acolheram, com júbilo, a nomeação dessa Comissão que, pensava-se, cortaria pela raiz o Modern Spiritualism.


Com profunda surpresa do público inglês, a Comissão, depois de dezoito meses de estudo, concluiu a favor da realidade das manifestações. Daremos o texto do seu relatório no momento em que expusermos as experiências espíritas.


Entre os membros que tomaram parte nesse inquérito, estava o grande naturalista inglês Alfred Russell Wallace, êmulo e colaborador de Darwin, já convencido da realidade dos fenômenos.


Como Mapes, como Hare e tantos outros, o Sr. Wallace, vencido pela evidência, fez corajosamente a sua profissão de fé, em um livro: Miracles and Modern Spiritualism, que apaixona ainda os espíritos na Inglaterra.


No número das testemunhas ouvidas pela Comissão da Sociedade Dialética de Londres figuravam o professor Auguste de Morgan, presidente da Sociedade Matemática de Londres, secretário da Sociedade Real Astronômica, e o Sr. Varley, engenheiro-chefe das companhias de telegrafia internacional e transatlântica, inventor do condensador elétrico, que resolveu definitivamente o problema da telegrafia submarina.


O Sr. de Morgan afirmou alto e bom som a realidade dos fenômenos, pelo seu livro: From Matter to Spirit; e, mais adiante, veremos uma carta onde o Sr. Varley rende, publicamente, homenagem aos Espíritos.


Semelhante concurso de nomes eminentes poderia parecer suficiente para estabelecer solidamente a teoria espírita, mas, em assuntos tão debatidos, convém não deixar de apresentar as afirmações autorizadas. Eis ainda outros testemunhos:


O Sr. Oxon, professor da Universidade de Oxford, estudou durante cinco anos o fenômeno da escrita direta, isto é, da escrita produzida sem a intervenção de pessoa vivente. Publicou um livro intitulado Spirit Teachings, que terá a sua utilidade na discussão que adiante vamos apresentar.


Somos assaz escrupulosos para não deixar passar em silêncio o testemunho de outro homem eminente, Sergent Cox, jurisconsulto filósofo, escritor que também se convenceu pelo exame.


Igualmente, lembramos que o Sr. Barkas, membro da Sociedade de Geologia de Newcastle, narrou suas experiências em um livro muito interessante, intitulado Outlines of Investigation into Modern Spiritualism. Convidamos as pessoas que se queiram convencer a lerem esta obra.


A luta na Inglaterra não foi menos vivaz que nos Estados Unidos: os adversários do Espiritismo deviam, aí também, fazer todos os esforços para destruir a verdade nascente; mas, nesses países de livre discussão, onde o receio do ridículo é menos vivo que entre nós, os convertidos não recearam dar afirmação nítida e franca de sua mudança de idéias.


Entre os cépticos mais tenazes, achava-se o Dr. George Sexton, célebre conferencista que fizera grande campanha contra a nova doutrina. O estudo dos fatos conduziu-o, depois de quinze anos de investigações, à convicção.


“Obtive – diz ele –, em minha própria casa, na ausência de todos os médiuns públicos, mas no seio dos membros de minha família e dos meus amigos particulares e íntimos, nos quais o poder mediúnico tinha sido desenvolvido, a prova irrefutável, de natureza a impressionar a fria razão, de que as comunicações recebidas vinham de parentes e amigos falecidos.”9


Um outro sábio, o Dr. Chambers, durante muito tempo adversário declarado do Espiritismo, foi obrigado a render-se à evidência e, lealmente, confessou o seu passado erro, no Spiritual Magazine.


Citamos também, terminando, entre os espíritas ilustres, o Dr. James Gully, autor da Névropathie et Névrose e da Hygiène dans les maladies chroniques, acatada autoridade na Inglaterra.


Como se observa, o Espiritismo tem recrutado seus adeptos entre os homens de ciência. O lado fenomenal foi estudado com todo o rigor de que são capazes os sábios, e ele saiu triunfante das provas múltiplas a que foi submetido.


Há dez anos, uma agremiação intitulada Society for Psychical Research, abriu um grande inquérito sobre as aparições. Publicou regularmente o relatório de seus trabalhos, nos Proceedings, e fez editar um livro: Phantasms of the Living (Fantasmas dos Vivos) que relata mais de duzentos casos de aparições bem averiguadas. Os Srs. Myers, Gurney e Podmore, os autores, atribuem esses fenômenos ao que eles chamam Telepatia, isto é, ação a distância de um espírito humano sobre outro; a aparição chama-se, então, alucinação verídica. Eis aí uma tentativa científica para fazer o fenômeno entrar no quadro das leis conhecidas. Essa investigação teve como conseqüência dar ao Espiritismo uma feição de atualidade, e vemos sábios como Lodge, cognominado o Darwin da Física, conjurar, na Academia Britânica para o adiantamento das ciências, seus colegas a caminhar para diante e a verificar resolutamente esses estudos tão cativantes e ainda tão novos. Mencionaremos, entre os numerosos jornais ingleses, o Light, fundado pelo Sr. Oxon, e The Medium and Daybreak. Vejamos agora o que se passa na França.


Na França


A notícia dos fenômenos misteriosos que se produziam na América suscitou na França viva curiosidade e, em pouco tempo, a experiência das mesas girantes atingiu grau extraordinário.


Nos salões, a moda era interrogá-las sobre as mais fúteis questões. Era um passatempo de nova espécie e que fez furor. Durante os anos de 1851 e 1852, ninguém viu nessas práticas senão um agradável divertimento; não se tomava o fenômeno a sério e, como fossem ignorados os notáveis trabalhos dos quais esse estudo era objeto do outro lado do oceano, não se tardou a abandonar as mesas girantes, que só tinham tido para as massas o atrativo da novidade e a singularidade dos processos.


Todavia, literatos como Eugène Nus, homens do mundo diplomático, como o Conde d'Ourches e o Barão de Guldenstubbé, tinham sido impressionados pelo caráter inteligente que revestia o movimento da mesa, e este último publicou, em 1857, um livro intitulado La Réalité des Esprits. Encontram-se neste livro relatadas as primeiras experiências da escrita direta que foram obtidas na França.


Essa publicação não fez rumor de importância. A imprensa, segundo o seu antigo costume, ridicularizou livremente alguns fiéis que tinham perseverado nesses interessantes estudos, e tudo parecia ter sido esquecido, quando surgiu, em 1857, O Livro dos Espíritos, por Allan Kardec. Essa publicação atiçou a guerra. O público soube, com espanto, que aquilo que tinha sido considerado até então como distração encerrava as mais profundas deduções filosóficas; admirou-se de que, do movimento das mesas girantes, se deduzisse a prova da imortalidade do ser pensante, e achava-se em face de uma nova teoria sobre o futuro da alma depois da morte.


Semelhantes afirmações não podiam ser aceitas sem contestações. De todas as partes elevou-se uma gritaria contra o desventurado autor. Os jornais, as revistas, as academias protestaram, mas, honra seja feita à França, não se viram aí reproduzidas as cenas de violência que tinham acolhido o Espiritismo na América.


Retomou-se o estudo sobre o fenômeno das mesas girantes e duas correntes de opiniões desenharam-se nitidamente. Para uns, o fenômeno não tinha nenhuma realidade; as pancadas, os movimentos das mesas, eram produzidos pela fraude ou, antes, por movimentos inconscientes da parte dos operadores.


Tal foi a opinião da Academia e a dos Srs. Babinet e Chevreul. Veremos mais adiante o que induziu esses cientistas a essa forma de ver.


Para outros, os deslocamentos da mesa e suas respostas eram devidas a uma ação magnética, exercendo-se de um modo ainda indeterminado. Pode-se contar entre os partidários desta doutrina o Conde Agénor de Gasparin, que fez numerosas pesquisas sobre o assunto e publicou um volume sob o título Des tables tournantes, du Surnaturel en général et des Esprits.


Tal interpretação foi adotada por um certo número de escritores, como o Sr. Chevillard. O professor Thury, de Genebra, deu como causa do fenômeno um agente especial, que ele chama psicode, fluido que atravessa os nervos e todas as substancias orgânicas e inorgânicas, como o éter luminoso dos sábios.


Um escritor americano, o Sr. Roggers,10 admitira, desde a origem, as manifestações, mas explicava-as pela ação automática dos centros nervosos: o cérebro, a matéria ativa da medula alongada, o cordão espinhal e as inúmeras glândulas dos nervos espalhados no abdômen; esses centros diversos agiriam por meio do fluido universal e imponderável, descoberto por Reichenbach, que o denominou od ou odilo.


Todas essas pesquisas, todas essas controvérsias conduziram grande número daqueles que se ocupavam do assunto a concluir que nos movimentos das mesas girantes havia alguma coisa mais que pura ação física.


Admitiu-se a existência de forças psíquicas que poderiam agir sobre a matéria, em certas condições; mas, ainda dois horizontes se descortinaram. Os filósofos espiritualistas concluíram a favor das comunicações das almas de pessoas falecidas, enquanto os escritores religiosos se esforçavam por demonstrar que esses fatos eram produzidos pelo espírito do mal, denominado Satanás. Pode-se classificar nesta última classe o Marquês de Mirville, que, em seu livro Des Esprits et de leurs manifestations fluidiques, cita grande número de observações, atribuindo-as ao demônio. Na mesma ordem de idéias acha-se o Sr. Gougenot des Mousseaux, que intitula o Espiritismo de magia moderna e, como o padre Ventura, arrisca-se, com os textos na mão, a demonstrar que as manifestações dos anjos maus estão assinaladas nos Evangelhos e pelos padres da Igreja.


Enfim, citaremos também os livros do Sr. Abade Poussin, de Nice, e do Abade Marousseau, que concluem no mesmo sentido.


A diversidade das opiniões que acabamos de assinalar nada tem de singular.


Em face de um fenômeno ainda mal conhecido, é natural a divergência em sua explicação conforme a escola à qual se pertence, mas estamos bem certos de que ninguém jamais se lembrará, como a Academia de Medicina de Paris, em 1859, de atribuir o fenômeno a um certo músculo rangedor da perna.


Essa Academia “descobriu” que as pancadas produzidas na mesa eram devidas a um músculo rangedor da perna, que, de tempos a tempos, se entregava a facécias, sendo que as pessoas ingênuas tomavam isso por manifestações de Espíritos.


Certo dia, um Sr. Jobert de Lamballe foi “iluminado” por essa descoberta genial, e a Academia apressou-se em louvar o perspicaz sábio que tinha encontrado nos músculos humanos propriedades tão inesperadas.


O público não adotou, tão facilmente como essas sumidades médicas, a explicação dos músculos sonoros, e podemos citar bom número de homens ilustres que aderiram inteiramente ao Espiritismo.


Com o seu estilo nervoso e poético, Auguste Vacquerie conta, nas Miettes de l'Histoire, as experiências que fez em companhia da Sra. de Girardin, em casa de Victor Hugo, em Jersey; leremos mais adiante essa instrutiva narração. O célebre literato escreveu esta frase original: “Creio nos Espíritos batedores da América, atestados por quinze mil assinaturas.”


O maior dos nossos poetas modernos, Victor Hugo, diz:


“A mesa girante e falante foi muito ridicularizada. Essa zombaria é sem alcance. Estimaríamos que fosse um dever estrito da ciência sondar todos os fenômenos. Negar a atenção a que tem direito o Espiritismo é desviar a atenção da verdade.”


O Sr. Victorien Sardou converteu-se ao Espiritismo e tornou-se excelente médium desenhista.


A Revue Spirite, de Paris, publicou desenhos mediúnicos obtidos por ele, que são obras-primas, de execução delicada e de uma fantasia verdadeiramente espiritual.


O historiador Eugène Bonnemère escreveu:


“Como todo o mundo, eu também me ri do Espiritismo, mas, o que pensava ser o riso de Voltaire não era mais que o riso do idiota, muito mais comum que o primeiro.”


O ilustre astrônomo Camille Flammarion, também, por muito tempo estudou esses fenômenos e popularizou, em seu estilo maravilhoso, as doutrinas filosóficas do Espiritismo.


Théophile Gautier, o mavioso poeta, intitula Espírita uma de suas novelas mais cativantes, e em suas obras encontram-se, a cada passo, traços de suas crenças na nova doutrina.


Maurice Lachâtre, o autor do grande dicionário, é também partidário convicto dessas idéias. O Dr. Paul Gibier, laureado pela Academia de Medicina, encarregado de diversas missões científicas, reuniu suas experiências sobre o Espiritismo em dois volumes: Le Spiritisme ou Fakirisme occidental e Analyse des Choses.


Encontram-se, nesses livros, fatos bem observados e confirmações de trabalhos anteriores sobre o mesmo assunto.


Não podemos dar aqui uma bibliografia completa das obras espíritas; falta-nos espaço para tal e, além disso, preferimos citar sábios notoriamente conhecidos, a fim de dar aos documentos que apresentamos toda a sua autoridade. Ser-nos-ia muito fácil citar bastantes nomes de médicos, advogados, engenheiros, homens de letras, como prova incontestável de que o Espiritismo penetrou principalmente nas classes instruídas da sociedade.


O movimento atual está mais florescente do que nunca. Por instâncias da Sociedade de Investigações Psíquicas de Londres, formou-se em Paris uma Sociedade de Psicologia Fisiológica, cujo fim é estudar os fenômenos telepáticos, isto é, de aparições.


Essa Sociedade nomeou uma Comissão cujo papel é analisar os fatos apresenta-dos. Eis os nomes dos comissionados: Srs. Sully Prudhomme (da Academia Francesa), presidente; G. Ballet, professor adido à Academia de Medicina; Beaunis, professor na Faculdade de Medicina de Nancy; Charles Richet, professor na Faculdade de Medicina de Paris; Coronel de Rochas, diretor da Escola Politécnica; Marillier, diretor de conferências na Escola de Altos Estudos, este último como secretário.


Um jornal mensal, Les Annales Psychiques, sob a direção do Sr. Dariex, relata os trabalhos da Sociedade.


De alguma sorte, tal Sociedade é um princípio de consagração oficial desses estudos, porém os espíritas não têm esperado por esses estímulos e, há muito tempo, formaram grupos de estudos em número considerável, em todas as partes da França.


Em Paris, existe regular quantidade de pequenos Centros onde se realizam evocações. Duas Sociedades abrem suas portas ao público: a Fédération Spirite, 55 rue du Châteaud’Eau, e a Société du Spiritisme Scientifique, Boulevard Enselman, 40. Entre as associações mais importantes da província, mencionaremos: La Fédération Spirite Lyonnaise, em Lyon, da qual é órgão La Paix Universelle; em seguida, a Union Spirite de Reims e a Union Spiritualiste de Rouen, cujos trabalhos aparecem mensalmente em um jornal intitulado La Pensée des Morts.


As cidades de Marseille, Avignon, Toulouse, Bordaux, Nantes, Tours, Le Mans, Orléans, Lille, Bar-le-Duc, Nancy e Besançon têm uma organização de propaganda bem estabelecida, assim como o número de adeptos vai sempre aumentando. Os principais jornais espíritas são: Revue Spirite, Revue Scientifique et Morale du Spiritisme, Le Progrès Spirite, La Lumière, La Relígion Laïque, Revue des Étudiants Swedenborgiens e Le Phare de Normandie.


A recrudescência do movimento espiritualista é devida ao Congresso Espírita que se reuniu em Paris, no ano de 1889.


O relatório dos trabalhos11 mostra que esse Congresso contava 40.000 aderentes. Os grupos espíritas do mundo inteiro nele se fizeram representar.


Vamos ver como o movimento espírita, começado nos Estados Unidos, espalhou-se não somente na Europa, mas também por todas as partes do mundo.


Na Alemanha


O Dr. Kerner, uma das celebridades da Alemanha contemporânea, foi levado a constatar fenômenos espíritas em 1840, ao ministrar seus cuidados à Sra. Hauffe, mais conhecida sob o nome de Vidente de Prévorst, denominação de uma aldeia de Wurtemberg, onde ela nasceu, no princípio do século XIX.


O doutor conta que ela era, muitas vezes, atormentada por aparições de fantasmas, as quais ele não podia considerar como alucinações, porque pessoas que estavam presentes ouviam, tanto quanto ela, as pancadas produzidas pelos Espíritos ou viam certos objetos, existentes no aposento, mudarem de lugar.


Seu nome de vidente vem do fato de ela pressentir os perigos que ameaçavam os seus; ela prevenia-os, então, e os acontecimentos justificavam sempre suas previsões.


Em 1840 produziram-se manifestações em Mottlingen (Wurtemberg) e, desde essa época, verificaram-se fenômenos de visão, de audição e de comunicação provindos, incontestavelmente, da ação dos Espíritos. Esses fatos, posto que significativos, nenhum alcance tiveram, quando a notícia dos acontecimentos na América produziu, na Alemanha, o mesmo ruído que na França e determinou um grande movimento de opinião. Não podemos estudar minuciosamente os fatos; bastar-nos-á assinalar os homens de ciência que foram convencidos e que publicaram suas pesquisas.


Em primeiro lugar citaremos o célebre astrônomo Zöllner, professor na Universidade de Leipzig. Este sábio narra, em suas notas científicas (Wissenschaftliche Abhandlungen), as experiências que fez em companhia do médium Slade. Ele declara que, muito desconfiado diante dessas novidades, não emprestava grande crédito à sua possibilidade, mas que o inquérito ao qual se entregou convenceu-o perfeitamente. Veremos, mais adiante, como ele foi testemunha de fenômenos novos, tais como a penetração de uma matéria por outra matéria, sem que fosse possível distinguir a solução de continuidade entre um e outro corpo: por exemplo, um anel inteiriço cingindo a perna de uma mesa, sem que se possa notar alguma fratura.


Ele admite a ação de inteligências desencarnadas na produção desses fatos e, para explicar-lhe a ação, imagina uma quarta dimensão da matéria. Seu testemunho é confirmado pelos de Weber, o eminente fisiologista, de Fechner, cujas investigações sobre as leis da sensibilidade são clássicas, e pelo professor Ulrici.


Eis, por conseguinte, uma plêiade de sábios célebres que afirmam, mais uma vez, a veracidade dos fatos.


Uma observação bem digna de atenção é que os fenômenos espíritas foram, desde a origem, submetidos as análises mais severas, mais variadas, e por pesquisadores tão esclarecidos quão perspicazes; entretanto, esses investigadores, cépticos a princípio, convenceram-se e tornaram-se defensores dessas doutrinas. Não é essa, porventura, a melhor prova que se pode fornecer para demonstrar que o Espiritismo é bem uma verdade, e que os fatos sobre os quais repousa são inatacáveis?


A imprensa alemã é representada pelas revistas Psychische-Studien, Die Ueber-sinnliche Welt e Neu Spiritualistische Blätter, a primeira em Leipzig, as outras em Berlim.


No resto da Europa


Na Rússia, devemos citar, entre as sumidades espíritas, o professor Butlerof, que, em companhia de Home, reproduziu a maior parte das experiências de Crookes. O Conselheiro Alexander Aksakof é um sábio cujas investigações foram até às aparições materializadas. Teremos ocasião de citar seus trabalhos que confirmam absolutamente os do ilustre físico inglês, quanto à objetividade das aparições.


A imprensa espírita é aí representada por Le Rebus, editado em Petersburgo.


A Itália foi teatro de uma demonstração brilhante sobre a veracidade das experiências espíritas. O professor Ercole Chiaia, de Nápoles, obteve, com a médium de nome Eusápia Paladino, a repetição de todos os fenômenos importantes do Espiritismo: transportes, materializações, levitações, etc.


Publicou suas investigações e estas foram objeto de crítica por parte do professor Lombroso, o grande criminalista.


O Sr. Chiaia fez reproduzir essas experiências diante do seu ilustre contraditor, nos fins do ano 1891. O resultado, na Itália, foi o mesmo que na América, que na Inglaterra e que na França. Assistido pelos professores Tamburini, Virgílio, Bianchi e Vizioli, Lombroso pôde verificar, por diversas vezes, que as afirmações espíritas eram absolutamente exatas. Quanto à sua explicação, deve-se dizer, ele não admitiu a presença dos Espíritos, e veremos adiante como a teoria que ele imagina, para demonstrar o que viu, é notavelmente insuficiente.


Quando Lombroso tiver estudado tanto tempo quanto Wallace, Crookes ou Oxon, mudará certamente de opinião, porque seus predecessores, nessas pesquisas, tinham começado, como ele, por crer em uma ação inconsciente do médium; porém, um exame mais atento dos fatos convenceu-os da existência dos Espíritos.12


A imprensa que menciona os trabalhos espíritas, na Itália, é representada pela revista mensal Lux, pela Revista di Studi Psichici, em Milão, sob a direção do Dr. Giorgio Finzi, pela revista La Sfinge, sob a direção do Sr. Ungher, e pelo Vessilo Spiritista, de Vercelli, cujo diretor é o Cavº Ernesto Volpi. Na Holanda, os jornais que defendem essas idéias intitulam-se Op. de Gresen e Het Foekomstig Leven, aquele de Haia, e este de Utrecht.


Na Bélgica, o movimento é tão ardente e tão bem organizado, como em França.


Liège e Bruxelas são centros de ativa propaganda; federações regionais centralizam os trabalhos dos grupos, e os órgãos – Le Messager e Le Moniteur Spirite – registram os resultados obtidos.


Conferências realizam-se freqüentemente, e brochuras, distribuídas gratuitamente, têm vulgarizado aí o conhecimento do Espiritismo.


A Suécia e a Noruega têm por órgão o jornal Morgendœmringen, cuja redação tem sua sede em Christiania.


A Espanha é, incontestavelmente, o país onde o número dos espíritas é proporcionalmente maior que em qualquer outra parte. Todas as suas cidades importantes têm jornais, órgãos de Sociedades bem organizadas.


Citemos, entre as publicações mais notáveis: La Union Espiritista e a Revista de Estudios Psicológicos, em Barcelona; Lumen, em Tarrasa; e La Revelación, em Alicante.


Na Áustria, há poucos anos, o Espiritismo era desconhecido; mas as experiências feitas pelo falecido arquiduque Rodolfo, em companhia de Bastian, médium de materializações, experiências nas quais uma fraude teria sido desmascarada, chamaram a atenção do público para esses fenômenos e, hoje, o número de partidários da nova doutrina cresceu consideravelmente. Citemos, entre os seus jornais, o Reformidende Blaetter, que se publica em Budapeste.


Portugal é representado pelo jornal O Psiquismo, que se edita em Lisboa.


No mundo inteiro


Pode-se dizer, sem temor de desmentido, que o Espiritismo tem partidários convictos em todo o mundo.


A fim de não alongar desmedidamente este histórico, contentar-nos-emos em citar simplesmente os países nos quais se editam jornais ou revistas espíritas.


É claro que essa publicidade vai especialmente endereçada aos adeptos da doutrina dos Espíritos.


Poder-se-á julgar, pelo número de órgãos, a importância desse movimento iniciado há cinqüenta anos. 13


A República Argentina conta dois órgãos, em Buenos Aires: Constancia e La Fraternidad. Em Mendoza, um jornal: La Perseverancia; em Rosário, La Verdad.


No Brasil edita-se no Rio de Janeiro: Reformador, três órgãos no Estado do Paraná: A Luz, O Regenerador, Revista Espírita. Finalmente, Verdade e Luz, em São Paulo.


O Chile é representado por El Pan dei Espiritu, em Santiago.


O Peru, por El Sol, em Lima.


A República de S. Salvador, por El Espiritismo, em Chalchuapa.


A Venezuela, pela Revista Espiritista.


No México, citamos: La Ilustración Espirita, na cidade do México, e El Precursor, de Cisiola, Estado de Mazatlan.


As Antilhas possuem quatro órgãos: La Alborada, de Santiago; La Buena Nueva, em Porto Rico; La Revista Espiritista, em Havana; La Nueva Alianza, em Cienfuegos.


Nas Ilhas Canárias, em Santa Cruz de Tenerife, publica-se La Caridad.


Na Austrália, edita-se, em Melbourne, The Harbinger of Light.


Acrescentamos, para terminar, que o periódico La Revue Scientifique et Morale du Spiritisme, do qual somos diretores, tem por correspondentes chefes de grupos espíritas, no Canadá, Suez, Cairo, Ilha Maurícia e em Bornéu.


Resumo


Ficou estabelecido, pela breve enumeração que precede, que milhões de pessoas adotam, hoje, as crenças espíritas. O movimento, nascido na América, propagou-se com inaudita rapidez. Cento e cinqüenta jornais ou revistas instruem o público sobre as teorias novas. Os trabalhos dos sábios que temos citado foram traduzidos em quase todas as línguas do globo e semearam aos quatro ventos a boa-nova da imortalidade do ser pensante.


Debalde, a ciência oficial e as academias têm cercado esses fenômenos com a conspiração do silêncio: a verdade é mais potente que todas elas reunidas.


Esses fatos têm invadido o mundo inteiro, têm recrutado e recrutam, continuamente, adeptos. Nem o ridículo da imprensa nem os clamores dos padres nem as objurgatórias dos materialistas terá o poder de obstar esse impulso que atrai o homem para as descobertas de noções exatas sobre a vida futura.


Apesar da má-vontade de alguns sábios que passam como príncipes da ciência, aos quais o Espiritismo destrói as teorias niilistas, ao pensamento do homem realmente douto por certo não virá a idéia de que essas manifestações sejam indignas de atenção; a questão que elas elucidam é grave, pois inquieta os grandes pensadores.


Muitas teorias têm sido formuladas, muitos sistemas têm sido arquitetados, sem trazerem maior certeza quanto à imortalidade da alma, e eis que, hoje, temos os meios de cientificamente estudar o estado da alma depois da morte.


Este fato é devido à intervenção dos Espíritos no mundo, e vamos agora observar como os fatos sobre que repousa a teoria espírita são a mais evidente e melhor prova estabelecida da sobrevivência do eu consciente.


Ao terminar, diremos que é impossível que esses fatos sejam resultado de fraude ou de grosseira ilusão:


1º- Porque eles têm sido estudados por sábios eminentes, e esses químicos, físicos e naturalistas são os mais aptos, com conhecimento de causa, para se pronunciarem sobre a validade das experiências;


2º- Porque as experiências têm sido analisadas, grande número de vezes, por observadores independentes, cépticos a princípio, e o resultado desses inquéritos tem sido idêntico em todos os países;


3º- Porque esses fenômenos oferecem, em todas as latitudes, os mesmos caracteres fundamentais, donde resulta que são devidos à mesma causa;


4º- Enfim, pensamos que esses testemunhos e a sua autenticidade são tais que é impossível negá-los sem um exame aprofundado.


Eis o que vamos fazer: Passaremos, meticulosamente, em revista os fenômenos; perscrutá-los-emos sob todas as faces; analisaremos fielmente todas as hipóteses formuladas para explicá-los, e desejamos que o leitor fique convencido de que só a Doutrina Espírita lança luz sobre todos esses fatos aparentemente estranhos e sobrenaturais.


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