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Prefácio



O Espiritismo é uma ciência cujo fim é a demonstração experimental da existência da alma e sua imortalidade, por meio de comunicações com aqueles que impropriamente têm sido chamados mortos.


Há quase meio século foram empreendidas as primeiras investigações sobre esse assunto; homens de ciência da mais alta notoriedade consagraram longos anos de estudos para certificar os fatos que formam a base dessa doutrina, e foram unânimes em afirmar a autenticidade dos fenômenos que pareciam produto da superstição e do fanatismo.


Na França, conheciam-se imperfeitamente essas pesquisas, de sorte que, aos olhos do grande público, o Espiritismo não passava de farsa de mesas girantes.


Contudo, o tempo desempenhou o seu papel, e essa doutrina apresenta hoje ao experimentador imparcial uma série de experiências rigorosas, metodicamente conduzidas, que provam, com segurança, a sobrevivência do eu humano à desagregação corporal.


São esses fatos que queremos expor, a fim de que eles implantem em todas as consciências a convicção da imortalidade, não mais baseada somente na fé ou no raciocínio, mas solidamente firmada na Ciência e no seu método severo e positivo.


A geração atual está fatigada de especulações metafísicas; recusa crer naquilo que não está absolutamente demonstrado, e se o movimento espírita, que já conta milhões de adeptos no mundo inteiro, não ocupou ainda o primeiro lugar, deve-se isso a que seus adeptos negligenciaram, até então, pôr sob os olhos do público fatos bem averiguados.


A maior parte das publicações periódicas contém comunicações de Espíritos, as quais podem ser interessantes sob certos pontos de vista; todavia, como sua autenticidade não está absolutamente provada, não produzem o efeito desejado.


As obras francesas aparecidas desde Allan Kardec sobre esse assunto são repetições, com exceção dos livros de Eugène Nus, Louis Gardy e Doutor Gibier, ou, então, não apresentam originalidade alguma sobre a questão, de modo que o movimento tem sido retardado. É preciso que se lhe dê novo impulso.


Para tal, é mister caminhar com o século e saber curvar-se às necessidades da época.


O materialismo triunfa por toda parte, mas já se pressente ser de pouca duração o seu reinado; basta servirmo-nos de suas próprias armas e combatê-lo em seu próprio terreno.


A escola positivista encerra-se na experimentação; imitemo-la: nenhuma necessidade temos de apelar para outros métodos, porque os fatos são obstinados, como diz o sábio Alfred Russell Wallace, e deles não é fácil desembaraçar-se.


Em vez de apresentar aos incrédulos toda a doutrina formulada pelos Espíritos e codificada por Allan Kardec, demos-lhes, simplesmente, a ler os trabalhos de mestres como Robert Hare, Crookes, Wallace, Oxon, Zöllner, Aksakof, pois que não poderão recusar os testemunhos desses grandes homens, que são, por títulos diversos, sumidades intelectuais no vasto domínio das ciências.


Não esqueçamos que Crookes fez a Física dar um passo gigantesco com a demonstração do estado radiante. Wallace é, com certeza, neste momento, o primeiro naturalista do mundo, pois, ao mesmo tempo que Darwin, achou e formulou a lei da evolução. Os trabalhos de Zöllner, em Astronomia, são universalmente conhecidos; os de Fechner, sobre a sensibilidade, são ensinados em toda parte; e quanto aos professores Mapes e Robert Hare, temos a dizer que eles gozam de indiscutível autoridade na América do Norte.


Eis aí os principais campeões do Espiritismo; mas o leitor encontrará, no fim deste volume, uma lista de numerosas notabilidades que afirmam categoricamente a realidade dos seus fenômenos.


É tempo de reagir contra os bonzos oficiais que tentam abafar as verdades novas, afetando uma desdenhosa indiferença. Se temos respeito e admiração pela Ciência sem prevenções, a que imparcialmente encara todos os fenômenos, estuda-os e explica-os friamente, fornecendo boas razões, também nos sentimos cheios de indignação contra a falsa ciência, rebelde a todas as novidades, encerrada em convicções adquiridas e crendo, orgulhosamente, ter atingido a meta do saber humano.


Foram homens desta classe, diremos como Wallace, que fizeram oposição a Galileu, a Harvey, a Jenner. Foram esses ridículos teimosos que repeliram a maravilhosa teoria das ondulações luminosas de Young; que zombaram de Stephenson, quando este quis fazer correr locomotivas sobre as linhas férreas de Liverpool e Manchester. Atiraram todos os sarcasmos possíveis contra a iluminação a gás, e repeliram Arago no próprio seio da Academia, quando este quis discutir a telegrafia; seres ignaros que classificaram o Magnetismo como embuste e charlatanice, e que, ainda ultimamente, qualificaram de grande peta a descoberta do telefone.


Não foi por vão prazer de mostrar quanto o espírito humano, mesmo nas classes mais esclarecidas, está sujeito ao erro, que citamos alguns dos mais frisantes exemplos de obstinação nas corporações sábias e o seu horror pelas novidades. Nosso intuito é suscitar um sério movimento em prol dessas investigações, que têm considerável alcance, tanto no domínio material quanto no domínio psicológico.


Se realmente a alma não morre e pode agir sobre a matéria, achamo-nos em face de forças desconhecidas, cujo estudo é interessante; pela mesma forma verificaremos modos novos de energia, que podem conduzir-nos a resultados grandiosos; o mesmo sucede com a personalidade, que, conservando-se depois da morte, nos pôs em presença de um outro problema: a produção do pensamento sem os órgãos materiais do cérebro.


Deixemos de parte os rotineiros obstinadamente encerrados em seus sistemas, abramos bem os nossos olhos quando homens probos, sábios e imparciais nos falem de recentes descobertas, e fechemos os ouvidos ao alarido de todos os eunucos do pensamento, impotentes para saírem da órbita das idéias preconcebidas.


Diremos, como um sábio que não teme desviar-se dos caminhos trilhados, o Sr. Charles Richet, que uma boa e completa experiência vale por cem observações, e acrescentaremos:


Vale dez mil negações, ainda mesmo quando essas negações emanassem de sumidades da maior notoriedade, se estas não se dignassem repetir as experiências e demonstrar-lhes a falsidade.


Este simples resumo não tem outras pretensões além da de expor aos olhos do público as experiências feitas por homens eminentes, por mestres nesta arte tão difícil da observação exata; resultará disso a prova evidente da imortalidade do ser pensante, porque ela afirmar-se-á cada vez mais nítida, cada vez mais evidente, à medida que se desenvolver o magnífico encadeamento dos fenômenos, desde o movimento das mesas até as aparições visíveis, tangíveis e fotografadas dos Espíritos.


Tal é o nosso fim escrevendo esta pequena obra de propaganda.


Depois de um histórico sucinto das origens do Espiritismo, passaremos em revista os trabalhos dos sábios, salientando o que eles têm de convincente e incontestável. Em seguida, consagraremos um capítulo à exposição dos métodos pelos quais se podem evocar os Espíritos; enfim, terminaremos pelas conseqüências filosóficas que resultam dessas pesquisas.


Esperamos que este demonstrativo consciencioso e imparcial produza a convicção no espírito de todos os que souberem desprender-se dos preconceitos vulgares e das idéias preconcebidas, para friamente encararem esta ciência nova, cujos frutos são muito importantes para a Humanidade. É em nome do livre pensamento que convidamos os investigadores a se ocuparem com os nossos trabalhos; é com instância que lhes pedimos não repelirem sem exame esses fatos, tão novos e tão imperfeitamente conhecidos, pois estamos persuadidos de que a luz brilhará a seus olhos, como brilhou para os homens de boa-fé que, há cinqüenta anos, quiseram estudar os problemas do Além, tão perturbadores e tão misteriosos antes dessas descobertas.


Gabriel Delanne



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