Capítulo 28: Utilidade dos Estudos Psicológicos



   


O caráter essencialmente racional que o Espiritismo revestiu torna pueris as acusações de empirismo e de sobrenaturalismo que muitas vezes lhe dirigem.


Não seria demasiado insistir sobre este ponto. A realidade das manifestações espíritas repousa, já o vimos, sobre testemunhos inegáveis de homens cuja competência é reconhecida. Devidamente verificados os efeitos, preciso foi procurar a causa, e se esses sábios afirmaram havê-la achado na intervenção dos Espíritos é porque a natureza dos fenômenos não permitiu outra explicação plausível. Não se segue daí, porém, que eles devam ser classificados no domínio do sobrenatural, pois nada seria mais contrário ao bom senso. O sobrenatural não existe nem poderia existir. Tudo no Universo é regulado por leis.


Demonstrar a existência de um fenômeno é colocá-lo na ordem permanente das coisas, é submetê-lo à lei natural. No meio deste Universo em que tudo, seres e coisas, se encadeia e se liga em estreita solidariedade, em profunda e sublime harmonia, não há motivo para o milagre nem para o sobrenatural. Leis tão rigorosas, tão inflexíveis como as que governam a matéria, regem o mundo invisível. Para conhecer o seu admirável funcionamento só há um meio: estudar.


Apesar das dificuldades que apresenta, não há estudo mais fecundo que esse do mundo dos Espíritos. Abre ao pensamento perspectivas inexploradas, ensina a nos conhecermos, a penetrarmos os recônditos do nosso ser, a analisarmos as sensações, a medirmos as faculdades e, em seguida, a melhor regularmos o seu exercício. É esta, por excelência, a ciência da vida da alma, não só em seu estado terrestre, mas também em suas transformações sucessivas através do tempo e do espaço.


O Espiritismo experimental pode tornar-se um meio de conciliação, um traço de união entre estes dois sistemas inimigos: o espiritualismo metafísico e o materialismo, que, há tantos séculos, se combatem e se dilaceram sem resultado algum.


Adota os princípios do primeiro, faz em ambos a luz e fornece-lhes uma base de certeza; satisfaz ao segundo, procedendo conforme os métodos científicos, mostrando, no perispírito, corpo fluídico semimaterial, a causa de numerosos fenômenos físicos e biológicos. Ainda mais: traz a síntese filosófica e a concepção moral de que estava desprovida a Ciência, sem as quais ficava esta sem ação sobre a vida social.


A Ciência, ou, antes, as ciências ocupavam-se principalmente com o estudo parcial e fragmentário da Natureza. Os progressos da Física, da Química, da Zoologia são imensos e os trabalhos realizados dignos de admiração; mas, nenhum deles tem seqüência, coesão ou unidade. Conhecendo somente um lado da vida, o exterior, o mais grosseiro, e querendo, sobre esses insuficientes dados, regular o jogo das leis universais, a ciência atual, lacônica e insípida classificação de fatos materiais, limita-se a uma teoria do mundo puramente mecânica, inconciliável à idéia de justiça, pois, em suas conseqüências lógicas, chega à conclusão de que, na Natureza, a força é o único direito.


Eis por que a Ciência ficou impotente para exercer influência moralizadora e salutar. Privada até aqui de qualquer ponto de vista sintético, ela não havia podido fazer jorrar dos trabalhos acumulados essa concepção superior da vida, que deve fixar os destinos do homem, traçar seus deveres e fornecer-lhe um princípio de melhoramento individual e social.


Essa concepção nova, que coordena os conhecimentos particulares, solidariza seus elementos esparsos e comunica-lhes unidade, harmonia; essa lei indispensável à vida e ao progresso das sociedades, tudo isso é trazido pelo Espiritismo à Ciência, com a síntese filosófica que deve centuplicar o seu poder.


É grande a missão do Espiritismo, são incalculáveis as suas conseqüências morais. Data somente de ontem e, entretanto, que tesouros de consolação e esperança já não espalhou pelo mundo! Quantos corações contristados, frios, não aqueceu ou reconfortou! Quantos desesperados retidos sobre o declive do suicídio! O ensino desta doutrina, sendo bem compreendido, pode acalmar as mais vivas aflições, comprimir as mais fogosas paixões, despertar a todos a força da alma e a coragem na adversidade.


O Espiritismo é, pois, uma poderosa síntese das leis físicas e morais do Universo e, simultaneamente, um meio de regeneração e de adiantamento; infelizmente, pouquíssimas pessoas se interessam por esse estudo. A vida da maioria delas é uma carreira frenética para os bens ilusórios. Apressa-se, receia-se perder o tempo com coisas que se consideram supérfluas: perde-se realmente o tempo, entregando-se ao que é passageiro e efêmero. O homem, em sua cegueira, desdenha aquilo que o faria viver feliz, tanto quanto se pode ser neste mundo, satisfazendo o bem e criando em torno de si uma atmosfera de paz e de recolhimento.