Capítulo 25: O Espiritismo e a Ciência
Retornar
Os fenômenos do Espiritismo, tão importantes por seus resultados científicos e suas conseqüências morais, não têm sido, entretanto, acolhidos com todo o interesse que merecem. A generalidade do público, depois de uma predileção passageira, recaiu na indiferença. Mesmo entre os homens da Ciência, muitos, que nada tinham estudado, nada observado pessoalmente, desdenhando os testemunhos dos experimentadores, declaravam impossíveis e absurdas as manifestações. Já o dissemos, o homem, tantas vezes enganado, tornou-se céptico e desconfiado. Entretanto, esse acolhimento pode parecer estranho, ao menos por parte de sábios, cuja missão, é de supor-se, consiste em estudar todos os fenômenos e em procurar suas causas e leis. Mas, isso não surpreenderá aqueles que conhecem a natureza humana e lembram-se das lições da História.
A novidade vem inquietar porque destrói teorias já afeiçoadas, velhos sistemas edificados com muita dificuldade; derriba situações obtidas e perturba comodidades, por necessitar de pesquisas e de observações para as quais já não há mais gosto. O filósofo alemão E. Hartmann muito bem disse, em sua obra sobre o Espiritismo:
“Os representantes oficiais da Ciência recusam-se a queimar os dedos com essas coisas, seja porque, em conseqüência de sua convicção atual sobre a infalibilidade da Ciência, se acreditem autorizados a decretar a priori o que é possível e o que é impossível, seja, simplesmente, porque não tenham nenhum desejo de trocar estudos especiais por outros que lhes são menos familiares.”
Os sábios são efetivamente homens, e, como todos os homens, têm suas fraquezas e suas prevenções. É preciso um verdadeiro heroísmo para acolher com imparcialidade fatos que vêm impor formal desmentido aos trabalhos de uma existência inteira, abalar uma celebridade laboriosamente conquistada.
Como todas as grandes descobertas, o Espiritismo devia receber o batismo das humilhações e da prova. Quase todas as idéias novas, particularmente as mais fecundas, têm sido escarnecidas, insultadas em seu aparecimento, rejeitadas como utopias. As descobertas do vapor e da eletricidade e mesmo o estabelecimento de estradas de ferro foram, por muito tempo, qualificados de mentiras e de quimeras. A Academia de Medicina de Paris rejeitava, a princípio, a teoria de Harvey sobre a circulação do sangue, como repelia mais tarde o Magnetismo. E, enquanto essa academia declarava que o Magnetismo não existia, a Academia de Viena proscrevia o seu uso como perigoso. Com que zombarias os sábios não saudaram, em época mais recente, as descobertas de Boucher de Perthes, o criador da antropologia pré-histórica, ciência hoje consagrada e que derrama tão vivas luzes sobre a origem das sociedades humanas!
Todos os que têm querido libertar a Humanidade da sua ignorância, revelar os segredos das forças naturais ou das leis morais, todos esses viram erguer-se diante de si um calvário e têm sido embebidos com fel e ultrajes. Galileu esteve preso; Giordano Bruno foi queimado; Jesus, crucificado; Watt, Fulton e Papin foram injuriados; Salomão de Caus ficou encarcerado entre loucos. Hoje, não se prende, não se queima, nem mais se proscreve por crime de opinião, porém o sarcasmo e a ironia são ainda formas de opressão. Por causa da coligação das classes sacerdotais e sábias, certas idéias têm necessitado de uma vitalidade inaudita para se desenvolverem. Mas, as idéias, como os homens, engrandecem-se na dor. Cedo ou tarde, a verdade triunfa das infalibilidades conjuradas!
Depois de evocadas essas penosas recordações, depois de conjeturarmos sobre as indecisões sucessivas do pensamento, lembrando-nos do acolhimento feito, no passado, a idéias, a descobertas que, centuplicando o poder do homem, asseguraram seu triunfo sobre a natureza cega; depois de termos traçado as reações do espírito de rotina, erguendo-se contra os inovadores, não haverá fundamentos para pedir aos detratores do Espiritismo um pouco de paciência e de reflexão, antes de condenarem sem exame, não diremos idéias, especulações gratuitas do pensamento, mas fatos, fatos de observação e de experiência?
Cada passo que se imprime à frente lembra ao homem seu pouco saber. As nossas conquistas científicas não são mais que esboços provisórios, superiores à ciência dos nossos pais, mas que serão substituídas por novas descobertas e novos conhecimentos. O tempo presente não é senão uma estação na grande viagem da Humanidade, um ponto na história das gerações. A utopia de ontem torna-se a realidade de amanhã. O homem pode gloriar-se de ter contribuído para aumentar a bagagem intelectual do passado. Ninguém deve jamais dizer: o que ignoro ficará sempre oculto. Comparemos o modesto domínio da Ciência com o infinito das coisas, com os campos ilimitados do desconhecido, que ainda nos resta explorar. Essa comparação ensinar-nos-á a sermos mais circunspectos em nossas apreciações.
Retornar