Capítulo 19: Testemunhos Científicos



   


Foi no seio da grande Confederação americana, em 1850, que, pela primeira vez, as manifestações espíritas atraíram a atenção pública. Pancadas faziam-se ouvir em vários aposentos, móveis deslocavam-se sob a ação de uma força invisível, mesas agitavam-se e feriam ruidosamente o solo. Tendo um dos espectadores tido a idéia de combinar as letras do alfabeto com o número de pancadas, estabeleceu-se uma espécie de telegrafia espiritual e a força oculta pôde conversar com os assistentes. Disse ser a alma de uma pessoa conhecida que tinha vivido no país, entrou em minudências muito exatas sobre a sua identidade, vida e morte, e relatou particularidades que dissiparam todas as dúvidas. Outras almas foram evocadas e responderam com a mesma precisão. Todas se diziam revestidas de um corpo fluídico, invisível aos nossos sentidos, porém que não deixava de ser material.


Rapidamente multiplicaram-se as manifestações, que, pouco a pouco, se foram estendendo por todos os Estados da União. De tal sorte preocuparam a opinião, que certos sábios, acreditando ver nelas uma causa de perturbação para a razão e paz pública, resolveram observá-las de perto, a fim de demonstrarem o seu absurdo. Foi assim que o juiz Edmonds, Presidente do Supremo Tribunal de Nova York e Presidente do Senado, e o professor de Química, Mapes, da Academia Nacional, foram levados a se pronunciarem sobre a realidade e o caráter dos fenômenos espíritas. Suas conclusões, formuladas depois de rigoroso exame, constam em obras importantes e por elas está declarado que tais fenômenos eram reais e que só podiam ser atribuídos à ação dos Espíritos.


Propagou-se o movimento a tal ponto que, em 1852, foi dirigida ao Congresso em Washington uma petição assinada por quinze mil pessoas, a fim de se obter a proclamação oficial da realidade dos fenômenos.


Um sábio célebre, Robert Hare, professor na Universidade da Pensilvânia, tomou francamente o partido dos espíritas, publicando, sob o titulo: Experimental Investigations of the Spiritual Manifestations, uma obra que fez sensação e na qual ficou estabelecida cientificamente a intervenção dos Espíritos.


Robert Dale Owen, sábio e escritor notável, também se ligou a esse movimento de opinião e escreveu várias obras para o favorecer, entre as quais a que teve por título: Footfalls on the Boundary of Another World (Investidas às fronteiras de um outro mundo, 1877), conseguindo um êxito considerável.


Segundo Russel Wallace, o Modern Spiritualism conta hoje, nos Estados Unidos, onze milhões de adeptos, representados por uma imprensa numerosa (22 jornais ou revistas), cujo órgão principal é o Banner of Light, de Boston.


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Na Inglaterra, porém, é que as manifestações espíritas foram submetidas à análise mais metódica. Numerosos sábios ingleses têm estudado os fenômenos da mesa com uma atenção perseverante e minuciosa, e é deles que nos vêm os mais formais testemunhos.


Em 1869, a Sociedade Dialética de Londres, uma das mais autorizadas agremiações científicas, nomeou uma Comissão de trinta e três membros, sábios, literatos, prelados, magistrados, entre os quais Sir John Lubbock, da Royal Society, Henry Lewis, hábil fisiologista, Huxler, Wallace, Crookes, etc., para examinar e “aniquilar para sempre” esses fenômenos espíritas, que, dizia a moção, “são somente produto da imaginação”. Depois de dezoito meses de experiências e de estudos, a Comissão, em seu relatório, reconheceu a realidade dos fenômenos e concluiu em favor do Espiritismo.


Na enumeração dos fatos observados, o relatório não só demonstra as pancadas e os movimentos da mesa, mas também menciona “aparições de mãos e de formas que, não pertencendo a nenhum ente humano, pareciam vivas por sua ação e mobilidade. Essas mãos eram algumas vezes tocadas e seguradas pelos assistentes, convencidos de que elas não eram o resultado de uma impostura ou de uma ilusão”.


Um dos trinta e três, A. Russel Wallace, colaborador de Darwin e, depois da morte deste, o mais eminente representante do evolucionismo, prosseguiu suas investigações e consignou os seus resultados numa obra de grande êxito: Miracles and Modern Spiritualism. Falando dos fenômenos, exprime-se nestes termos: “Quando me entreguei a essas experiências, era fundamentalmente materialista. Não havia em minha mente concepção alguma de existência espiritual. Contudo, os fatos são obstinados; venceram e obrigaram-me a aceitá-los muito tempo antes que eu pudesse admitir a sua explicação espiritual. Esta veio sob a influência constante de fatos sucessivos que não podiam ser afastados nem explicados de nenhuma outra maneira.”


Entre os sábios ingleses cujos testemunhos públicos podem ser invocados em favor da manifestação dos Espíritos, também citaremos Stainton Moses (mais conhecido por Oxon), professor da Faculdade de Oxford, que sobre estas matérias publicou um livro intitulado Spirit Identity e uma outra obra denominada Psychography,(lxxxiii) onde trata principalmente dos fenômenos de escrita direta; Warley, engenheiro-chefe dos telégrafos, inventor do condensador elétrico; Sergent Cox, jurisconsulto; A. de Morgan, presidente da Sociedade Matemática de Londres, que afirma claramente as suas crenças na obra: From Matter to Spirit; o professor Challis, da Universidade de Cambridge; os Drs. Charbers, Janies Oully, G. Sexton, etc.


Além de todos esses nomes, justamente estimados, há um outro, maior e mais ilustre, que vem juntar-se à lista dos partidários e defensores do Espiritismo; é o de William Crookes, membro da Royal Society (Academia de Ciências da Inglaterra).


Não há ciência que não deva uma descoberta ou um progresso a esse Espírito sagaz. Os trabalhos de Crookes sobre o ouro e a prata, sua aplicação do sódio ao processo de amalgamação são utilizados em todas as oficinas metalúrgicas da América e da Austrália. Com o auxílio do heliômetro do Observatório de Greenwich, foi ele o primeiro que pôde fotografar os corpos celestes; as suas reproduções da Lua são célebres. Seus estudos sobre os fenômenos da luz polarizada, sobre a espectroscopia não são menos conhecidos. Crookes descobriu também o tálio. Todos esses trabalhos, porém, são excedidos por sua magnífica descoberta do quarto estado da matéria, descoberta que lhe assegura um lugar no panteão da Inglaterra, ao lado de Newton e de Herschell, e um outro mais admirável ainda na memória dos homens.


William Crookes entregou-se, durante dez anos, ao estudo das manifestações espíritas e, para verificá-las cientificamente, construiu instrumentos de precisão e delicadeza inauditas. Com o auxílio de um médium notável, a jovem Florence Cook, e de outros sábios tão rigorosamente metódicos como ele, operava em seu próprio laboratório, cercado de aparelhos elétricos, que teriam tornado impossível ou mortal qualquer tentativa de fraude.


Em sua obra: Researches in the Phenomena of Spiritualism, Crookes analisa as diversas espécies de fenômenos observados: movimentos de corpos pesados, execução de peças musicais sem contacto humano, aparições de mãos em plena luz, aparições de formas e de figuras, etc. Durante vários meses, o Espírito de uma jovem e graciosa mulher, chamada Katie King, mostrou-se, todas as noites, aos olhos dos investigadores, revestindo, por alguns instantes, as aparências de um corpo humano provido de órgãos e de sentidos, conversando com Crookes, com sua esposa e com os assistentes, submetendo-se a todas as experiências exigidas, deixando-se tocar, auscultar, fotografar, após o que se esvaia como tênue névoa. Essas curiosas manifestações estão longamente relatadas na obra referida, de William Crookes.


A Society por Psychical Research, outra agremiação de sábios, entrega-se, há dez anos, a investigações profundas sobre os fenômenos de aparições. Várias centenas de casos foram descobertos por ela, consignados na sua revista, denominada Proceedings, e numa obra especial: Phantoms at the Living, dos Drs. Myers, Gurney e Podmore, que explicam tais fenômenos pela telepatia ou transmissão do pensamento entre os seres humanos. Quase todos esses fenômenos sucederam-se no momento da morte de pessoas que, em certas ocasiões, se reproduziram nas ditas aparições. Uma leitura atenciosa dos Proceedings não permite que aceitemos, para um grande número de casos, as diferentes explicações dadas por esses doutores, como sendo tais fenômenos o produto da ação mental a distância ou da alucinação, nem mesmo é razoável admitir-se o caráter subjetivo que, em geral, lhes atribuem. A objetividade, a realidade desses fatos ressalta dos próprios termos dos Proceedings e dos testemunhos recolhidos durante as investigações: “As aparições têm, em certos casos, impressionado os animais; ao seu aspecto, cães bravios são tomados pelo terror, ocultam-se e fogem; cavalos passam apressadamente, trêmulos por todo o corpo, cobrem-se de suor ou recusam-se a avançar.” (lxxxiv)


“Algumas aparições deram lugar a impressões auditivas, táteis e visuais. Fantasmas, em diversos andares de uma casa, foram vistos sucessivamente por diversas testemunhas.”(lxxxv)


Na obra Phantoms of the Living estão referidos muitos efeitos físicos que foram produzidos, tais como ruídos, pancadas, abertura de portas, deslocamento de objetos, etc.; aí também foram mencionadas vozes predizendo os acontecimentos.(lxxxvi) Certas aparições também puderam ser fotografadas.(lxxxvii)


Na Alemanha, os mesmos testemunhos da existência dos Espíritos e de suas manifestações decorrem dos trabalhos do astrônomo Zõllner, dos professores Ulricl, Weber, Fechner, da Universidade de Leipzig; Carl du Prel, de Munique. Esses sábios, cépticos todos, a princípio, e igualmente animados do desejo de desmascarar o que consideravam trapaças vulgares, foram constrangidos, pelo respeito à verdade, a proclamar a realidade dos fatos observados.(lxxxviii)


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O movimento espírita estendeu-se aos países latinos. A Espanha possui, em cada uma das suas principais cidades, uma sociedade e um jornal de estudos psíquicos. A agremiação mais importante é o Centro Barcelonês, ao qual está ligada a União Escolar Espiritista, cujo órgão é a Revista de Estudos Psicológicos. Uma federação reúne todos os grupos e círculos da Catalunha, em número superior a cem. O seu presidente é o visconde Torres-Solanot, escritor e experimentador distinto.


Na Itália também se produziram manifestações importantes em favor do Espiritismo. Depois das experiências do professor Ercole Chiaia, de Nápoles, realizadas com a médium Eusápia Paladino, aí se travaram debates apaixonados, que têm agitado o mundo sábio. Esse investigador reproduziu todos os fenômenos notáveis do Espiritismo: transportes, materializações, levitações, etc., aos quais também se devem adicionar as impressões de pés e mãos e fisionomias em parafina derretida, assim obtidas em recipientes isolados de todo e qualquer contacto humano.


A publicidade que se deu a esses fatos provocou uma crítica vivaz da parte do professor Lombroso, criminalista e antropologista célebre. Oferecendo-se o Sr. Chiaia para produzir novamente os mesmos fenômenos, realizaram-se então, em fins do ano 1891, várias sessões na própria casa de Lombroso, em Nápoles. Este, auxiliado por outros professores, os Srs. Tamburini, Virgílio, Bianchi, Vizioli, da Universidade de Nápoles, pôde assim verificar a realidade dos fatos espíritas, que depois se tornou pública.(lxxxix)


Em carta publicada ulteriormente,(xc) o professor Lombroso menciona as experiências realizadas pelos Drs. Barth e Defiosa, durante as quais o primeiro destes viu seu pai, já falecido, que então o abraçou duas vezes. Em outra sessão, o banqueiro Kirsch viu aparecer uma pessoa sua afeiçoada, morta havia vinte anos, e que lhe falou em francês, língua desconhecida do médium.


O professor Lombroso tentou explicar todos os fenômenos espíritas pela “exteriorização da força psíquica do médium”, porém não demonstrou como essa teoria poderia a eles adaptar-se.


Desde então, em 18 de novembro de 1892, L’Italia dei Popolo, jornal político em Milão, publicou um suplemento especial em que se vêem as atas das dezessete sessões efetuadas nessa cidade, em casa do Sr. Finzi, com a presença da mesma médium Eusápia Paladino. Esses documentos estão assinados pelos seguintes sábios eminentes de diversos países:


Schiaparelli, diretor do Observatório Astronômico de Milão;


Alexander Aksakof, conselheiro de Estado da Rússia, diretor da revista Psychische Studten, de Leipzig;


Carl du Prel, de Munique;


Angelo Brofferio, professor de Filosofia;


Gérosa, professor de Física na Escola Superior de Agricultura, em Portici;


Ermacora e G. Finzi, doutores em Física;


Charles Richet, professor na Faculdade de Medicina de Paris, diretor da Revue Scientifique;


Lombroso, professor da Faculdade de Medicina de Turim.


Essas atas mencionam a produção dos seguintes fenômenos, observados em plena luz:


“Movimentos mecânicos, que não podem ser explicados pelo contacto das mãos; levantamento completo da mesa; movimentos mecânicos com o contacto indireto das mãos da médium, exercido de forma a tornar impossível qualquer ação desta, movimentos espontâneos de objetos a distância, sem nenhum contacto com as pessoas presentes; movimentos da mesa também sem contacto; movimentos dos braços de uma balança; pancadas e reproduções de sons na mesa.”


Fenômenos obtidos na obscuridade, estando os pés e as mãos da médium constantemente seguros por duas das pessoas presentes:


“Transporte de diversos objetos, sem contacto, tais como: cadeiras, instrumentos de música, etc.; impressão de dedos sobre papel enegrecido por carvão; modelamento de dedos na argila; aparições de mãos sobre um fundo luminoso; aparições de luzes fosforescentes; levantamento da médium para cima da mesa; mudanças de cadeiras com as pessoas que as ocupavam; sensação de apalpadelas.”


Enfim, à meia-luz:


“Aparições de mãos humanas e vivas sobre a cabeça da médium; contacto de uma figura humana barbuda.”


Nas suas conclusões, os referidos experimentadores estabelecem que, devido às precauções tomadas, não era possível nenhuma fraude. Do conjunto dos fenômenos observados, dizem eles, depreende-se a vitória de uma verdade que injustamente muitos têm querido tornar impopular.


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No Brasil, em Portugal, nos Açores, na Austrália, nas Repúblicas do Rio da Prata e do Pacífico, no México, em Porto Rico e Cuba, o Espiritismo também se tem desenvolvido extraordinariamente, devido isso, em grande parte, à boa aceitação que ele encontra na consciência dos povos e aos fatos que se produzem.


Em todos esses países há centros e revistas ou jornais espíritas que se encarregam de propagar esta consoladora doutrina, entre as quais podemos mencionar, como mais antigos, o Reformador, órgão da Federação Espírita Brasileira, com sede no Rio de Janeiro, a Revista Espírita de La Habana, órgão da Sociedade La Reencarnación, em Havana, e a revista Constancia, órgão da Sociedade Espírita Constância, de Buenos Aires.