Retornar


XXVI


A mediunidade gloriosa


Os médiuns do nosso tempo são muitas vezes tratados com ingratidão, desprezados, perseguidos. Se, entretanto, num golpe de vista abrangermos a vasta perspectiva da História, veremos que a mediunidade, em suas várias denominações, é o que há de mais importante no mundo. Quase todos os privilegiados – profetas, videntes, missionários, mensageiros de amor, de justiça e de verdade – foram médiuns, no sentido de que se comunicavam com o invisível, com o infinito.


Bem se poderia, sob muitos pontos de vista, dizer que o gênio é uma das formas de mediunidade. Os homens de gênio são inspirados, na acepção fatídica e transcendental dessa palavra. São os intermediários e mensageiros do pensamento superior. Sua missão é imperativa. É por eles que Deus conversa com o mundo; que incita e atrai a si a Humanidade. Suas obras são fanais que ele acende pela extensa rota dos séculos a fora.


Devemos, por isso, considerá-los meros instrumentos, e não terão eles direito algum à nossa admiração? Assim não o entendemos. O gênio é antes de tudo uma aquisição do passado, o resultado de pacientes estudos seculares, de lenta e penosa iniciação, que vieram a desenvolver no indivíduo aptidões imensas, uma profunda sensibilidade, que o predispõe às influências elevadas. Deus reserva a luz unicamente àquele que por muito tempo a procurou, pediu e com veemência a desejou.


Schlegel, falando dos gênios, formula esta pergunta “São verdadeiramente homens, esses homens?”


São homens, sim, em tudo que têm de terrestre, por suas fraquezas e paixões. Padecem todas as misérias da carne, as doçuras, as necessidades, os desejos materiais. O que, porém, os faz mais que homens, o que neles constitui o gênio, é essa acumulação dos tesouros do pensamento, essa lenta elaboração da inteligência e do sentimento através de inumeráveis existências, tudo isso fecundado pelo influxo, pela inspiração do Alto, por uma assídua comunhão com os planos superiores do Universo. O gênio, sob as mil formas que reveste, é uma colaboração com o invisível, uma assunção da alma humana à Divindade.


Os homens de gênio, os santos, os profetas, os grandes poetas, sábios, artistas, inventores, todos quantos têm dilatado o domínio da alma, são enviados do Céu, executores dos desígnios de Deus em nosso mundo. Toda a filosofia da História aí se encerra. Haverá espetáculo mais belo que essa ininterrupta cadeia mediúnica que liga os séculos entre si, como as páginas de um grande livro da vida, e integra todos os acontecimentos, mesmo os mais aparentemente contraditórios, no plano harmônico de solene e majestosa unidade? A existência de um homem de gênio é como um capítulo vivo dessa grandiosa Bíblia.


Surgem ao começo os grandes iniciados do mundo antigo, os próceres do pensamento, aqueles que viram o Espírito fulgurar nos cimos ou se revelar nos santuários da iniciação sagrada: Orfeu, Hermes, Crisna, Pitágoras, Zoroastro, Platão, Moisés; os grandes profetas hebreus: Isaías, Ezequiel, Daniel.


Virão mais tarde João Batista, o Cristo e toda a plêiade apostólica, o vidente de Patmos, até à explosão mediúnica de Pentecostes, que vai iluminar o mundo, segundo a palavra de Joel; e ainda Hipatia, a alexandrina, e Veleda, a druidesa.


É no augusto silêncio das florestas e das montanhas, pelo desprendimento das coisas sensíveis, na prece e na meditação, que o profeta, o vidente e o inspirado se preparam para sua tarefa. O invisível só se revela ao homem solitário e recolhido. Platão recebe suas inspirações no cimo do Himeto; Maomet no monte Hira; Moisés no Sinai. Jesus entra em comunhão com o Pai, orando e em lágrimas, no monte das Oliveiras.


*


O profetismo em Israel, durante vinte consecutivos séculos, é um dos fenômenos transcendentais mais notáveis da História. A crítica contemporânea nada compreendeu ou fingiu nada compreender em tal sentido; acreditou simplificar tudo, recorrendo à negação. A exegese católica desnaturou o fato, imaginando explicar tudo com uma só palavra: o milagre. E, todavia, outra expressão mais justa a encontrou, quando denominou os profetas de “harpas vivas do Espírito Santo”. Assim, nesse ponto, como em tantos outros, a Ciência e a Religião, isoladas, não podem ministrar mais que incompletas noções; só a doutrina espírita, que serve de traço de união entre uma e outra, as pode reconciliar. O Espiritismo penetrou o mistério aparente das coisas; projeta as claridades do Além sobre a teologia, que completa, e sobre o experimentalismo, que esclarece. A verdade é que os profetas israelitas são médiuns inspirados; esta é a única denominação que lhes convém, como veremos adiante, com exemplos colhidos na Bíblia. Eles nos demonstrarão que a História de Israel é o mais belo poema mediúnico, a epopéia espiritualista por excelência. É o que um dia indubitavelmente dirá a exegese científica. E graças a ela se dissiparão as obscuridades dos Livros sagrados. Tudo se explicará, tudo, ao mesmo tempo, se tornará simples e grande.


A origem do profetismo em Israel é assinalada por imponente manifestação. Um dia, Moisés escolhe 70 anciães e os coloca ao redor do tabernáculo. Jeová revela sua presença em uma nuvem; imediatamente as poderosas faculdades de Moisés se transmitem aos outros e “eles profetizaram”.cclxxvi O tabernáculo aí representa um acumulador ou condensador fluídico; é um meio de exteriorização, como os espelhos de metal brilhante; fixando-se nele o olhar, provocava-se o transe. A manifestação de Jeová na nuvem é uma espécie de materialização. Esta, como vimos, sempre começa por uma aglomeração nebulosa, vaga a princípio, na qual a aparição se desenha e toma forma pouco a pouco. Jeová é um dos Eloim, Espíritos protetores do povo judeu e de Moisés em particular. Sob a influência que no momento exerce, os poderes espirituais de Moisés se transmitiram aos 70 anciães, como os poderes do Cristo se transmitiram mais tarde, parcialmente, aos apóstolos, no Cenáculo, e como hoje em dia vemos, em certos casos, a mediunidade transmitir-se de uma pessoa a outra por meio de contacto e de passes.


Assim começa o profetismo, ou mediunidade sagrada, em Israel. Moisés, iniciado nos mistérios de Ísis, graças à sua longa permanência no Egito, e sobretudo em conseqüência de suas relações familiais com seu sogro Jetro, grã-sacerdote de Heliópolis, foi a seu turno o grande iniciador psíquico de seu povo, antes de se constituir o seu imortal legislador.


Desde então a mediunidade profética se tornou permanente na raça judaica, posto que intermitente em suas manifestações. Está visivelmente subordinada a certos estados psicológicos, que não são sempre constantes nem nos indivíduos nem nos povos. Ao tempo dos Juízes, o profetismo era “coisa rara”. Com Samuel reaparece, fulgura com um novo esplendor. Nessa época o estado de alma do povo hebreu se prestava melhor a tal fenômeno. Na vida das nações há períodos de perturbação intelectual e depressão moral que obrigam o Espírito a momentaneamente se afastar. A França também tem conhecido suas horas de obscuridade e de incerteza.


Tendo compreendido que a mediunidade transcendente está subordinada às disposições morais dos indivíduos e das sociedades, Samuel instituiu escolas de profetas, isto é, agremiações em que os seus membros se iniciavam nos mistérios da comunicação fluídica.


Essas escolas eram estabelecidas em certas cidades, de preferência, porém, nos vales solitários ou nos recôncavos das montanhas. O estudo, a contemplação do infinito, no silêncio e beleza das noites, ao cintilar das estrelas, ou ainda à claridade do dia, sob o límpido céu do Oriente, prepara o discípulo-profeta para receber o influxo do Alto. A soledade o atrai; à medida que se afasta dos homens e se insula, uma comunhão mais íntima se estabelece entre ele e o mundo das forças divinas. Pelos desfiladeiros profundos das montanhas da Judéia, nas desertas cavernas da cadeia selvagem de Moab, ele sonha, presta ouvido atento às mil vozes dessa Natureza austera e grave que o rodeia.


É que a Natureza inteira, penetrada pela substância divina, é um médium, isto é, um intermediário entre o homem e os seres superiores. Tudo se liga no Universo imenso; uma cadeia magnética prende entre si todos os seres, os mundos todos. Só a nossa ciência fragmentária e o excesso dissolvente do espírito crítico foram capazes de destruir essa magnífica síntese e insular o homem moderno do resto do Universo e de seus harmoniosos planos. A música desempenhava também grande papel na iniciação profética.cclxxvii É sabido que essa arte imprime o ritmo na emissão fluídica e facilita a ação das entidades invisíveis. A preparação era laboriosa, difícil o noviciado. Durante os dois primeiros anos, o aspirante profeta era simplesmente médium passivo; depois, aprendia a tornar-se ativo e, pela exteriorização, a ler no invisível os quadros, a norma dos acontecimentos futuros. Esse exercício era longo e sujeito muitas vezes a enganos.cclxxviii


Influências sucessivas e contrárias se apossavam não raro dos profetas. Tal é o exemplo de Balaão, que parte para amaldiçoar as tribos e é obrigado a profetizar a sua glória. Nunca, como nesse episódio bíblico, foi mais patente a dualidade dos Espíritos inspiradores. Será difícil, às vezes, distinguir na mediunidade, qualquer que seja a sua natureza, a parte do médium e a do Espírito. Daí contradições aparentes, uma espécie de luta psicológica íntima entre o médium e o que o inspira; é o combate simbólico de Jacob e o anjo; mas o Espírito sempre termina por vencer e sua luz impregna vitoriosamente a mentalidade e a vontade do sensitivo. Convém, todavia, não esquecer que o Espírito, quando é de natureza elevada, jamais violenta o sensitivo de que se apodera, respeita a sua personalidade, a sua liberdade, procede sempre com delicadeza e só emprega a persuasão. É por esse motivo que cada profeta, quer seja grande como Isaías ou humilde como o pastor Amós, conserva, no desempenho de sua missão, a linguagem habitual e o cunho de sua personalidade. Assim, em nossos dias, dois médiuns, ao interpretarem a mesma revelação, não se exprimirão nos mesmos termos nem verão com igual clareza.


*


A cada página da Bíblia encontramos textos que afirmam a mediunidade sob todas as suas formas e em todos os seus graus. Sob os nomes de anjos, deuses, etc., os Espíritos protetores dos homens ou das nações tomam parte em todos os fatos, intervêm em todos os acontecimentos.cclxxix


Moisés é vidente e auditivo. Ele vê Jeová, o Espírito protetor de Israel, na sarça do Horeb e no Sinai. Quando se inclina diante do propiciatório da arca da aliança, escuta vozes (“Núm.”, VII, 89). É médium escrevente quando, sob o ditado de Eloim, escreve as tábuas da lei; médium ativo, magnetizador poderoso, quando fulmina com uma descarga fluídica os hebreus revoltados no deserto; médium inspirado, quando entoa seu maravilhoso cântico após a derrota do Faraó. Moisés apresenta ainda o gênero especial de mediunidade – a transfiguração luminosa – observada em certos fenômenos contemporâneos. Quando ele desce do Sinai, traz na fronte uma auréola de luz.


Samuel, cujo nascimento, como o dos predestinados, foi precedido de oráculos e de sinais, tornou-se profeta desde a infância. Dormindo no templo, é muitas vezes despertado por vozes que o chamam, lhe falam no silêncio da noite e lhe anunciam as coisas futuras (I, “Reis”, III, 1 a 18).


Esdras (liv. IV, cap. XIV) reconstitui integralmente a Bíblia que se tinha perdido, e isso em condições em que ainda se patenteiam diferentes gêneros de mediunidade. A voz lhe diz:


“Prepara uma grande porção de tabuinha e ajunta-se com cinco escribas expeditos e hábeis. E eu acenderei em teu coração a lâmpada da inteligência, que não se apagará até que tenhas acabado de escrever o que houveres começado. – Minha boca se abriu e não tornou a fechar-se. Ditei sem cessar, noite e dia. E o Altíssimo deu inteligência aos cinco homens que estavam comigo, e eles escreveram as revelações da noite, coisa que não compreendiam. E assim, durante quarenta dias, foram escritos 204 livros.” cclxxx


Job teve uma visão que é o tipo perfeito da materialização espírita. Todo o livro de Job está repleto de iluminações e de inspirações mediúnicas. Sua própria vida, atormentada de maus Espíritos, é um assunto de estudos muitíssimo sugestivos.


A Bíblia menciona casos freqüentes de obsessão, entre outros, em Saul, que é muitas vezes subjugado por um Espírito colérico: “Em sua alma abandonada, um Espírito maligno se introduz” .cclxxxi É um fenômeno de incorporação perfeitamente caracterizado.


Saul foi ao começo um médium “do Senhor”; mas, em conseqüência de faltas graves e de uma vida desordenada, perdeu sua faculdade ou, antes, se tornou instrumento de Espíritos inferiores. Essa perda, ou enfraquecimento dos poderes mediúnicos é freqüente nos que se deixam dominar pelas paixões. A mediunidade se deprime e desaparece sem causa aparente; mas, ordinariamente, porque se modificaram as disposições íntimas do médium.


A missão dos profetas, como a dos médiuns contemporâneos, era acidentada de ciladas. São dignos de ler-se, no capítulo XI da Epístola aos Hebreus, as provas, as humilhações, os sofrimentos por que passavam esses médiuns inspirados. Uma das mais penosas tarefas da vida do profeta era lutar contra os impostores. Sempre houve, e haverá sempre, falsos profetas, isto é, médiuns impulsionados por Espíritos malignos. Seu objetivo, ao que parece, é contrariar a ação dos verdadeiros profetas, semear a discórdia em seus centros habituais. Muitos grupos espíritas se têm desorganizado sob a influência dos Espíritos inferiores. É por isso que a grande habilidade do espiritualista consiste em acautelar os centros contra a preponderância dessas nefastas influências, que se comprazem obstinadamente em perturbar a ação dos missionários de paz e de verdade.


Em resumo, a obra dos profetas hebreus foi considerável. Suas prédicas monoteístas e moralizadoras prepararam o advento do Cristianismo e a evolução religiosa da Humanidade. Homens que praticavam a meditação, o recolhimento e a prece, os grandes médiuns israelitas sabiam e ensinavam que o comércio com o invisível é um princípio regenerador. Eles tinham por missão espiritualizar a religião de Moisés, que tendia a materializar-se, do mesmo modo que o Espiritismo contemporâneo tem também a missão de espiritualizar a sociedade atual, que cada vez mais se dissolve, e reconduzir as Igrejas às límpidas tradições do Cristianismo primitivo.


Os profetas hebreus foram os conselheiros dos reis de Israel, os verberadores dos abusos de poder, os consoladores do povo aflito e oprimido. Como todos os homens de gênio, haviam percorrido numerosas vidas, existências de trabalho, de investigação penosa, que neles tinham desenvolvido a intuição profunda. Sua penetração das coisas e sua maravilhosa perspicácia eram simplesmente os frutos de encarnações anteriores. Tendo vivido no passado de Israel, possuíam uma perfeita inteligência da alma de sua nacionalidade. Assim, João Batista, que era a reencarnação de Elias, preparou eficazmente seus irmãos para a revelação de Jesus.


O tema habitual do ensino profético era antes de tudo a adoração “em espírito e verdade”. Os profetas combatiam energicamente o formalismo farisaico da lei e proclamavam abertamente que a circuncisão do sentimento vale mais que a da carne. Assim também em nossos dias os Espíritos condenam as práticas materiais e o acanhado farisaísmo dos falsos devotos, de todos quantos, a pretexto de religião, substituem os preceitos do Evangelho por supersticiosas práticas.


A virtude, que os videntes de Israel mais recomendavam, era a justiça. A palavra justo significava então o conjunto das virtudes: “Dar a Deus o que é de Deus e aos homens o que lhes pertence.” Por toda parte se constituíam eles os advogados dos pobres, desses deserdados que então eram chamados os Ebionim. Depois do pecado de idolatria, o desprezo dos pobres e opressão dos fracos era o mais vivamente profligado.


Isaías, sobretudo, é o eloqüente defensor dos pobres. O Messias por ele anunciado é aquele que julgará os pobres com justiça (Isaías, XI, 4). É precisamente por esse grande amor aos humildes que certos racionalistas modernos qualificaram os profetas de demagogos, de apaixonados inimigos de toda dinastia.


Na realidade, três grandes revelações mediúnicas dominam a História. Aos profetas de Israel sucedeu o médium divino, Jesus. O Espiritismo é a última revelação, a difusão espiritual anunciada por Joel (II, 28, 29), “quando o Espírito se derramará como uma aurora sobre o mundo, e os velhos serão instruídos por sonhos e os mancebos terão visões”.


O próprio Reuss concorda que, segundo esse oráculo, “a efusão do Espírito será tão ampla que a nação inteira se tornará um povo de profetas”. Assim, a ação física do Além transformará o mundo futuro numa humanidade de videntes e auditivos. A mediunidade será o último estado da raça humana encaminhando-se ao termo de seu destino.


*


Acompanhemos o curso das idades e veremos a mediunidade expandir-se nos mais diversos meios, uniforme em seu princípio, variada ao infinito em suas manifestações. A história dos profetas de Israel se encerrou com a aparição do filho de Maria. Vimos noutro lugar cclxxxii que a vida do Cristo está cheia de manifestações que fazem dele o mediador por excelência. Jesus foi vidente e um inspirado, o maior de quantos o sopro divino vivificou em sua passagem pela Terra. Toda a sua pessoa e toda a sua existência estão envoltas no mistério do invisível. Ele conversava no Tabor com Moisés e Elias, e legiões de almas o assistem. Seu pensamento abrange dois universos; sua palavra tem a doçura dos mundos angélicos; seu olhar lê no recesso dos corações, e com um simples contacto ele faz cessar o sofrimento.


Essas maravilhosas faculdades são por ele transmitidas parcialmente a seus apóstolos. E lhes diz:


“Não cuideis como ou o que haveis de falar; porque naquela hora vos será inspirado o que haveis de dizer. Porque não sois vós os que falais, mas o Espírito de vosso Pai é o que fala em vós.” (Mateus, X, 19, 20.)


Decorrem os séculos; muda-se a cena. Além, no Oriente, surge outra imponente figura.


No silêncio do deserto, esse grande silêncio dos espaços que comunica à alma uma serenidade e um equilíbrio quase nada conhecidos por habitantes das cidades, Maomet,cclxxxiii o fundador do Islam, redige o “Alcorão”, sob o ditado de um Espírito, que adota, para se fazer escutar, o nome e a aparência do anjo Gabriel.cclxxxiv Ele mesmo o afirma no livro sagrado dos árabes:


“Vosso compatriota, ó Koraichitas, não está transviado, nem foi iludido. O Alcorão é uma revelação que lhe foi feita. Foi o Terrível quem o instruiu. E ele revelou ao servo de Deus o que tinha a revelar-lhe. O coração de Maomet não mente; ele o viu.” cclxxxv


“O Alcorão – diz ele – permanece como o mais belo monumento da língua em que foi escrito, e nada vejo que o iguale, na história religiosa da Humanidade. É o que explica a influência enorme que esse livro tem exercido sobre os árabes, que estão convencidos de que Maomet, cuja instrução era rudimentar, não podia escrever esse livro, e que ele lhe foi ditado por um anjo.”


Singular coincidência: sua missão começa como a de Joana d'Arc; se lhe revela mediante vozes e visões.cclxxxvi Como Joana, também ele por muito tempo se esquivara; mas o poder misterioso o arrasta contra sua vontade e o humilde condutor de camelos torna-se fundador de uma religião que se estende sobre uma vasta região do mundo; ele cria integralmente um grande povo e um grande império. Acerca de suas faculdades mediúnicas assim se exprime E. Bonnemère:cclxxxvii


“Maomet cala de vez em quando num estado que metia medo aos que em torno se achavam. Nesses momentos em que sua personalidade lhe fugia e ele se sentia subjugado por uma vontade mais poderosa que a sua, subtraía-se às vistas estranhas. Os olhos, desmesuradamente abertos, se tornavam fixos e sem expressão; imóvel, Maomet parecia invadido por um desfalecimento que nada lograva dissipar. Em seguida, pouco a pouco, a inspiração fluía, e ele escrevia, com vertiginosa rapidez, o que vozes misteriosas lhe ditavam.”


Na Idade Média, mencionemos duas grandes figuras históricas: Cristóvão Colombo, o descobridor de um novo mundo, impelido por uma obsessão divina, e Joana d'Arc, que obedece às suas vozes.


Em sua aventurosa missão, Colombo era guiado por um gênio invisível. Tratavam-no de visionário. Nas horas das maiores dificuldades, ele escutava uma voz desconhecida murmurar-lhe ao ouvido: “Deus quer que teu nome ressoe gloriosamente através do mundo; ser-te-ão dadas as chaves de todos esses portos desconhecidos do oceano que se conservam atualmente fechados por formidáveis cadeias.” cclxxxviii


A vida de Joana d'Arc está na memória de todos. Sabe-se que em todos os lugares seres invisíveis inspiravam e dirigiam a heróica virgem de Domrémy. Todos os êxitos de sua gloriosa epopéia são previamente anunciados. Surgem aparições diante dela; vozes celestes ciciam-lhe ao ouvido. Nela, a inspiração flui como o borbotar de uma torrente impetuosa. Em meio dos combates, nos conselhos, como diante de seus juízes, por toda parte, essa criança de 18 anos comanda ou responde com segurança, consciente do sublime papel que desempenha, jamais variando na fé nem nas palavras, inquebrantável mesmo diante das súplicas, mesmo em face da morte – iluminada e como transfigurada pelo clarão de um outro mundo. Ouçamo-la:


“Eu amo a Igreja e sou boa cristã. Mas, quanto às obras que tenho feito e à minha vinda, devo confiar-me ao rei do Céu que me enviou.


Eu vim da parte de Deus e dos santos e santas do paraíso, da Igreja vitoriosa lá de cima e por sua determinação; a essa Igreja submeto todos os meus atos e tudo o que tenho feito ou por fazer.” cclxxxix


A vida de Joana d'Arc, como médium e missionária, seria sem igual na História se não tivesse havido antes dela o mártir do Calvário. Pode-se pelo menos dizer que nada se viu de mais augusto desde os primeiros tempos do Cristianismo.


A esses nomes gloriosos temos o direito de acrescentar os dos grandes poetas. Depois da música é a poesia um dos focos mais puros da inspiração; provoca o êxtase intelectual, que permite entrar em comunicação com as esferas superiores. O poeta, mais que os outros homens, sente, ama e sofre. Nele cantam as vozes todas da Natureza. O ritmo da vida invisível regula a cadência de seus versos.


Todos os grandes poetas heróicos principiam seus cantos por uma invocação aos deuses ou à musa; e os Espíritos inspiradores atendem à deprecação. Murmuram ao ouvido do poeta mil coisas sublimes, mil coisas que só ele entende, entre os filhos dos homens.


Homero tem cantos que vêm de mais alto que a Terra.


Platão dizia (“Diálogos do Íon e do Menon”): “O poeta e o profeta, para receberem a inspiração, devem entrar num estado superior em que seu horizonte intelectual se dilata e ilumina por uma luz mais alta.” – “Não são os videntes, os profetas ou os poetas que falam; é Deus que por eles fala.” Segundo Pitágoras (Diog. Laerte, VIII, 32), “a inspiração é uma sugestão dos Espíritos que nos revelam o futuro e as coisas ocultas”.


Virgílio foi por muito tempo considerado um profeta, em virtude de sua “Écloga messiânica de Polion”.


Dante é um médium incomparável. Sua “Divina Comédia” é uma peregrinação através dos mundos invisíveis. Ozanam, o principal autor católico que já analisou essa obra genial, reconhece que o seu plano é calcado nas grandes linhas da iniciação nos mistérios antigos, cujo princípio, como é sabido, era a comunhão com o oculto.


É pelos olhos da sua Beatriz, morta, que Alighieri vê “o esplendor da viva luz eterna”, que iluminou toda a sua vida. Em meio daquela sombria Idade Média, sua vida e sua obra resplandecem como os cimos alpestres quando se coloram dos últimos clarões do dia e já o resto da terra está mergulhado na sombra.


Tasso compõe aos 18 anos seu poema cavalheiresco “Renaud”, sob a inspiração de Ariosto, e mais tarde, em 1575, sua obra capital, a “Jerusalém Libertada”, vasta epopéia, que afirma haver-lhe sido igualmente inspirada. Shakespeare, Milton e Shelley foram também inspirados.


Falando do grande dramaturgo, disse Victor Hugo: “Forbes, no curioso fascículo compulsado por Warburton e perdido por Garrick, afirma que Shakespeare se entregava à magia e que em suas peças o que havia de bom lhe era ditado por um Espírito.” ccxc


Todas as obras geniais são povoadas de fantasmas e de aparições: “Ali, ali – diz Ésquilo,ccxci falando dos mortos – vós não os vedes, mas vejo seres.”


O mesmo acontece a Shakespeare. Suas obras principais ccxcii – “Hamlet”, “Macbeth”, etc. – contêm cenas célebres em que se movem aparições. Os espectros do pai de Hamlet e de Banquo, presos ao mundo material pelo jugo do passado, se tornam visíveis e impelem os vivos ao crime.


Milton fazia suas filhas tocarem harpa antes de compor seus cantos do “Paraíso Perdido”, porque, dizia ele, a harmonia atrai os gênios inspiradores. Eis o que disse de Shelley seu historiador, Medwin:


“Ele sonhava desperto, numa espécie de abstração letárgica que lhe era habitual; e depois de cada acesso os olhos lhe cintilavam, os lábios se agitavam em crispações e sua voz tremia de emoção. Ele entrava numa espécie de sonambulismo, durante o qual sua linguagem era antes de um Espírito, ou de um anjo, que de um homem.” ccxciii


Goethe se abeberou amplamente nas fontes do invisível. Suas relações com Lavater e a Sra. De Klettenborg o haviam iniciado nas ciências profundas, de que cada uma de suas obras traz o cunho. O “Fausto” é uma obra mediúnica e simbólica de primeira ordem. Outro tanto se pode dizer de Klopstock e de sua “Messiada”, poema em que se sente perpassar o sopro do Além.


“Eu corria às vezes à minha escrivaninha – diz Goethe – sem me preocupar em endireitar uma folha de papel que estivesse de través, e escrevia minha peça em versos, de começo ao fim, naquela posição, sem mexer-me. Para isso, tomava de preferência um lápis que melhor se prestava à grafia, porque algumas vezes me havia acontecido ser despertado de meu sonambulismo poético pelo ranger da pena ou os salpicos de tinta, e distrair-me, e sufocar em o nascedouro minha pequena produção.” ccxciv


W. Blake afirma ter escrito suas poesias sob a direção do Espírito Milton e reconhecer que todas as suas obras foram inspiradas.


Mais próximo de nós, Alfred de Musset tinha visões, via aparições e ouvia vozes. Uma noite, sob as janelas do Louvre, escutou ele estas palavras:


“Assassinaram-me na rua de Chabanais.” Correu para lá, e deparou-se-lhe um cadáver...ccxcv “Onde, pois, me conduz essa mão invisível que não quer que eu me detenha?” dizia ele.ccxcvi


Ora sublime e puro como os anjos, ora pervertido como um demônio, Musset vivia submetido às mais diversas influências, e ele próprio o assinalava. Duas testemunhas de sua vida íntima, George Sand e a Sra. Colet, descreveram com fidelidade esse aspecto misterioso da existência do “filho do século”:


“Sim – dizia ele a Teresa – eu experimento o fenômeno que os taumaturgos denominam “possessão”. Dois Espíritos se têm apoderado de mim.ccxcvii


Há muitos anos que tenho visões e ouço vozes. Como o poderia eu pôr em dúvida, quando todos os meus sentidos mo afirmam? Quantas vezes, ao cair da noite, tenho visto e ouvido o jovem príncipe que me foi caro e um outro amigo meu, ferido num duelo, em minha presença! Parece-me, no momento em que essa comunhão se opera, que meu espírito se me desprende do corpo, para responder à voz dos Espíritos que me falam.” ccxcviii v

A Sra. Colet conhecia, feita pelo poeta, a narrativa de três aparições femininas – criaturas amadas e já mortas – de que ela faz uma comovedora descrição.ccxcix


Acrescenta-lhe diversos casos de exteriorização semelhantes aos de nossos médiuns contemporâneos. G. Sand e a Sra. Colet afirmam que o poeta caía em transe com a maior facilidade.ccc Ele próprio fala de sopros frios, cuja sensação experimentara, e de súbito desprendimento, o que lhe seria difícil imaginar.


Desses fatos resulta que A. de Musset devia a influências ocultas uma parte, pelo menos, do ascendente que exercia sobre os seus contemporâneos. Ele foi ao mesmo tempo um poeta de elevada inspiração e, propriamente falando, um vidente e um auditivo.


Em todos os tempos essas comunicações sutis dos Espíritos aos mortais têm vindo fecundar a arte e a literatura. Certamente, não consideramos literatos esses alinhadores de frases, que nunca sentiram os inspiradores do Além. Os escritores sobre os quais baixam os eflúvios superiores são raros. É preciso haver predisposições anteriores, um lento trabalho de assimilação, para que a força ignota possa atuar na alma do pensador. Naqueles que, porém, reúnem essas condições, a inspiração se precipita como um jorro. O pensamento brota, original ou vigoroso, e a influência por ele exercida é soberana.


A forma da inspiração varia conforme as naturezas. Em alguns, o cérebro é como um espelho que reflete as coisas ocultas e projeta as suas irradiações sobre a Humanidade. Outros escutam a grande voz misteriosa, o murmúrio das palavras que explicam o passado, esclarecem o presente e anunciam o futuro. Sob mil formas o invisível penetra os sensitivos e se impõe:


“Em Goethe – diz Flammarion ccci – em certos momentos de paixão, essa comunicação dos Espíritos se revela com luminosa clareza. Em outros, como Bacon, a convicção se formou lentamente com esses mínimos indícios que o estudo cotidiano do homem faz sobressair.” Na obra de Rogério Bacon, “o doutor admirável”, “Opus Majus”, todas as grandes invenções do nosso tempo estão profetizadas e descritas.


Jerônimo Cardan, em “De Rerum Varietate” (VIII, 3), felicitava-se por ter os “dons” que permitem cair em êxtase à vontade, ver objetos estranhos com os olhos do espírito e ser informado do futuro.


Schiller declarou que seus mais belos pensamentos não eram de sua própria criação; ocorriam-lhe tão rapidamente e com tal energia que ele tinha dificuldade em apreendê-los com suficiente presteza para os transcrever.


As faculdades mediúnicas de Emmanuel Swedenborg, o filósofo sueco, são atestadas pela célebre carta de Kant à Srta. De Knobich. Nessa missiva, o autor da “Crítica da razão pura” refere que a Sra. Harteville, viúva do embaixador alemão em Estocolmo, obteve por intermédio do Barão de Swedenborg uma comunicação de seu defunto marido, relativa a um documento precioso que não fora possível encontrar, apesar de repetidas buscas; estava guardado numa gaveta secreta, cuja existência foi revelada pelo falecido, e que só ele conhecia.


O incêndio de Estocolmo, visto e descrito por Swedenborg a trezentas milhas de distância, é também uma prova da pujança de suas faculdades. Pode-se, portanto, admitir que as teorias por ele formuladas acerca da vida invisível não são produto de sua imaginação, mas lhe foram inspiradas por visões e revelações. Quanto à forma sob a qual ele as descreveu, não se lhe deve ligar mais que uma importância relativa. Todos os videntes cedem à necessidade, em que se encontram, de traduzir a percepção que têm do invisível com o auxílio das formas, das imagens, das expressões impostas por sua educação e familiares ao meio em que vivem. É assim que, conforme o tempo e as latitudes, darão aos habitantes do outro mundo os nomes de deuses, anjos, demônios, gênios ou espíritos. Vejamos agora os grandes escritores do século XIX.


Chateaubriand e sua irmã Lucília têm igual direito a ser considerados inspirados:


“A primeira inspiração do poeta, sua primeira musa – assegurase cccii – foi sua irmã Lucília. Não há a mínima dúvida de terem os anos passados ao pé dessa criatura sonhadora e mística, deixando um sulco no coração do moço, comovido, como o recorda ele (Memórias de AlémTúmulo), pelos súbitos desalentos dessa natureza consternada e extática. Essa criatura misteriosa, meio sonâmbula, quase dotada da dupla vista, como uma habitante das ilhas Hébridas, atravessou a infância de Chateaubriand como a figura da dor. Transmitiu sua poética enfermidade moral a esse irmão já tão mortificado; é assim que ela entra por metade em todas as concepções do poeta. Nesse coro de brancas visões... por toda parte a encontraremos. Suas estranhas predições não lhe teriam feito entrever o tipo de uma Veleda?”


Balzac, em “Ursule Mirouet”, “Séraphita”, “Louis Lambert”, “La Peau de Chagrin”, etc., tocou em todos os problemas da vida invisível, do ocultismo e do magnetismo. Todas essas questões lhe eram familiares. Tratava-as com a competência do verdadeiro mestre, numa época em que ainda eram pouquíssimo conhecidas. Era não somente um profundo observador, mas também um vidente na mais elevada acepção do termo.


Edgard Quinet teve as mesmas intuições geniais, a acreditarmos no Sr. Ledrain, crítico literário extremamente céptico, que assim se exprimia num artigo do “L'Éclair”, por ocasião do seu centenário, em 1903:


“Ao mesmo tempo em que o mundo visível o extasiava, tinha ele os olhos fixos no mundo invisível. Foi um fervoroso espiritualista, como todos os de sua geração, como Lamartine, Victor Hugo, Michelet. Acreditava na “cidade imortal das almas”, na pátria de onde se não pode ser banido por homem algum. O sopro de não-sei-quê país supraterrestre em certo momentos o envolve e transporta como suspenso em asas, aos espaços infinitos. Lede seu discurso ao pé do túmulo de sua mãe, de seu genro Georges Mourouzi; que inflexões do Alto! É um nabi (profeta), a elevar-se acima de todos os sacerdócios e a falar em nome do Eterno, como investido de uma missão direta.”


Lamartine, em “Jocelin” e na “Chute d'un Ange”, e Jean Reynaud, em “Terre et Ciel”, podem também ser considerados inspirados.


Lamartine escrevia a Arlès Dufour, para se defender de uma censura de Infantin:


“Eu tenho meu objetivo; não o suspeita ele; ninguém sabe qual seja, exceto eu. Elevo-me em sua direção, na medida que o comporta o tempo e não mais depressa. Esse objetivo é impessoal e puramente divino. Mas tarde será desvendado. Enquanto espero, como quer ele que eu fale a homens de carne e osso a pura linguagem dos Espíritos?” ccciii


Michelet, em certas ocasiões, parece estar sob o império de algum poder desconhecido. Escutai-o falando de sua “Histoìre de la Révolution”:


“Nunca, desde a minha Donzela de Orléans, havia eu sentido semelhante lampejo do Alto, uma tão luminosa projeção do Céu...


Inolvidáveis dias; quem sou eu para os haver descrito? Ainda não sei, nem saberei jamais, como os pude reproduzir. A inacreditável felicidade de encontrar de novo isso tão vivo, tão intenso, depois de sessenta anos, tinha-me intumescido o peito de uma alegria heróica.”


Inspirado, pregoeiro do invisível, não é menos Victor Hugo: “Deus se manifesta através do pensamento do homem – disse ele –; o poeta é sacerdote”.ccciv Acreditava na comunhão com os mortos. São conhecidas suas sessões de Espiritismo em Jersey, com a Sra. De Girardin e Augusto Vacquerie, descritas por este em suas “Miettes de l'Histoire”, como são conhecidos os versos por ele dirigidos ao Espírito Molière e os terrivelmente irônicos que a “Sombra do Sepulcro” lhe ditava com o auxílio dos pés de urna mesinha.cccv


Sem dúvida, a propósito dos homens de gênio, ele repele esse “erro de todos os tempos, de pretender-se dar ao cérebro humano auxiliares exteriores”. Semelhante opinião – Antrum adjuvat vatem – melindra o seu orgulho. Mas a si próprio se contradirá ele em muitos casos. Leiam-se, por exemplo, estes seus versos:


“Les morts sont des vivants mêlés à nos combats.


Et nous sentons passer leurs flèches invisibles.” cccvi


Ao pé do túmulo de Emília Putron, proferia estas palavras que se tornaram célebres: “Os mortos são os invisíveis, mas não são os ausentes.”


Na poltrona dos antepassados, que se via na sala de jantar de Hautevillehouse, inscrevera estas palavras expressivas: Absentes adsunt. Não representa isso uma constante evocação dos que ele amara? Em todas as suas obras se encontram magníficas invocações às “vozes da sombra”, às “vozes do abismo”, às “vozes do espaço”.


Certamente não pretendemos que Hugo fosse médium no sentido restrito do vocábulo, como grande número de pessoas, aptas a obter fenômenos de mínimo valor. Esse pujante espírito não podia ser restringido ao papel secundário de intérprete dos pensamentos de outrem. Queremos dizer que o Além projetava sobre ele suas radiações e harmonias, as quais fecundavam o seu gênio e dilatavam-lhe até ao infinito o horizonte do pensamento.


Em Henri Heine essa colaboração do invisível se traduz de modo sensível. Eis o que ele dizia no prefácio de sua tragédia “W. Radcliff”:


“Escrevi William Radcliff em Berlim, sob tílias, nos derradeiros dias de 1821, enquanto o Sol com seus enlanguescidos raios iluminava os tetos cobertos de neve e as árvores despojadas de suas folhas. Escrevia sem interrupção e sem fazer emendas. E, à medida que escrevia, pareciame ouvir por cima da cabeça um como que ruflar de asas. Quando referi esse fato aos meus amigos, jovens poetas berlinenses, eles se entreolharam de um modo singular e me declararam unanimemente que, escrevendo, nada de semelhante a isso haviam jamais observado.”


O que há de mais notável é que essa tragédia é inteiramente espírita; o desenvolvimento da ação e seu desenlace patenteiam a recíproca influência do mundo terrestre e do mundo dos Espíritos.


Muitos autores célebres foram médiuns sem o saber. Outros tiveram disso consciência. Paul Adam, um dos mais fecundos escritores contemporâneos, francamente o confessou:cccvii


“Fui um poderoso médium escrevente. A Força que me inspirava tinha tal intensidade física, que obrigava o lápis a subir sozinho pelo declive do papel, que eu inclinava com a mão contrariamente às leis do peso. Essa Força não somente via no passado, que eu ignorava, como possuía a presciência do futuro. Suas predições eram de surpreendente realização, visto como, nada, absolutamente nada, me podia fazer prevêlas.”


Nem todos têm essa franqueza, e preferem deixar crer em seus méritos pessoais, mas em geral os grandes gênios reconhecem de bom grado que são dirigidos por Inteligências superiores.


Encontra-se em grande número de escritores contemporâneos essa espécie de obsessão do invisível. Hoffmann, Bullwer-Lytton, Barbey d'Aurevilly, Guy de Maupassant, etc., a conheceram e exprimiram em algumas de suas obras. Participaram, em graus diversos, dessa comunhão das almas, de que surge desvendado o imenso mistério da vida e do espaço.


*


Como se vê, em todos os domínios da arte e do pensamento os Céus vivificam a Terra. Os grandes músicos, os príncipes da harmonia, parece terem estado mais diretamente ainda sob a influência da mediunidade. Não somente a precocidade de alguns, como, por exemplo, de Mozart, atesta, o princípio das reencarnações, mas também há, na vida dos compositores célebres, fenômenos absolutamente mediúnicos, que seria demasiado longo referir aqui. Sua história é de todos conhecida.


Vimos atrás (cap. XIV) que Mozart e Beethoven deram testemunho das influências ultraterrenas que lhes inspiravam o gênio. Outro tanto se poderia dizer de Haydn, Haendel, Gluck, etc. Chopin tinha visões que, às vezes, o aterravam. Suas mais belas composições – sua “Marcha Fúnebre”, seus “Noturnos” – foram escritos em completa obscuridade. Toda a obra de Wagner repousa sobre um fundo de espiritualidade. E isso tanto é expresso nas palavras de “Lohengrin”, do “Tannhauser” e de “Parsifal”, como em toda a própria música.


Os homens ilustres têm sido, em sua maior parte, médiuns auditivos. Foi ao despertar que, na maioria das vezes, compuseram suas obras. Dante denominava a manhã “a hora divina”, por ser aquela em que se exprimem as inspirações da noite. Belíssimas coisas haveria que dizer acerca das revelações noturnas feitas ao gênio. Os antigos conheciam o mistério dessa iniciação. Diziam eles: “O dia é dos homens; a noite pertence aos deuses.” Durante o sono as almas superiores remontam às esferas sublimes; mergulham nas irradiações do pensamento divino, em um oceano de sonoridade, de harmoniosas vibrações; aí descobrem os princípios e as causas da sinfonia eterna. Francisco de Assis e Nicolau de Tolentino sentiram-se imersos no êxtase, por terem escutado um eco longínquo, algumas notas esparsas dos concertos celestes, isto é, da orquestra infinita das esferas. O “Requiem” de Mozart não tem outra origem. Algumas horas apenas antes de seu desprendimento corporal, o mestre, com a mão já invadida pelo gelo da morte, traçou esse hino fúnebre, que foi a derradeira manifestação do seu gênio. Convinha que o ilustre médium, que durante toda a vida percebera as vozes melodiosas do Espaço, expirasse numa última harmonia e que sua alma se exalasse num lamento sobre-humano, de inefáveis inflexões, de que só são capazes os grandes inspirados, ao assomarem o limiar dos mundos gloriosos.


Rafael Sanzio dizia que suas mais belas obras lhe haviam sido inspiradas e apresentadas numa espécie de visão.


Dannecker, escultor alemão, afirmava que a idéia do seu Cristo, uma obra-prima, lhe tinha sido comunicada por inspiração, num sonho, depois de a ter inutilmente procurado em suas horas de estudo.


Alberto Dürer velava, uma noite, e meditava. Queria pintar os quatro evangelistas e, tendo retocado esboços, que não exprimiam a seu gosto o ideal que imaginava, atirou os pincéis, abriu a janela e pôs-se a contemplar as estrelas. A inspiração lhe veio nesse momento de tristeza; invocou os seus modelos espirituais. A Lua projetava sua claridade nos monumentos e nas agulhas das catedrais de Nuremberg. E disse ele: “Permitistes a homens transformar aí lascas de pedra em construções harmônicas, de majestosas linhas. Consenti-me transportar para a tela esses santos enviados que trago na alma.”


Viu então a igreja de São Sebald avermelhar-se em fogo, e nuvens azuis formarem um fundo em que se desenhavam as imponentes figuras dos quatro evangelistas, e exclamou: “Eis aí os rostos que tenho inutilmente procurado fixar!” Não é esse um caso de mediunidade, e não vemos atualmente o mesmo fato reproduzir-se com Helena Smith, a médium de Genebra? cccviii


Muito havia que escrever sobre a intervenção das inspirações superiores no domínio da arte.


Não haveria também a influência do Alto nesse poder da oratória que subleva e arrebata as multidões, como o vento subleva as ondas do oceano? Ela parece manifestar-se principalmente nos oradores de arrojados surtos que, em certos momentos, são como que suspensos da Terra e transportados em possantes asas, ou ainda nesses improvisadores, de frases sugestivas e sonora linguagem, cuja palavra flui em acelerados jorros, e que Cícero denominava “a torrente do discurso”.


*


O poder de curar pelo olhar, pelo tato, pela imposição das mãos, é também uma das formas por que a ação espiritual se faz sentir no mundo. Deus, fonte de vida, é o princípio da saúde física, do mesmo modo que o é da perfeição moral e da suprema beleza. Certos homens, por meio da prece e do esforço magnético, atraem esse influxo, essa irradiação da força divina que expele os fluidos impuros, causa de tantos sofrimentos. O espírito de caridade e dedicação levada até ao sacrifício, o esquecimento de si mesmo, são as condições necessárias para adquirir e conservar esse poder, um dos mais admiráveis que Deus concede ao homem.


Esse domínio, essa superioridade do espírito sobre a matéria se afirma em todos os tempos. Vespasiano cura pela imposição das mãos um cego e um estropiado.cccix


Não menos célebres são as curas de Apolônio de Tiana. Todas são ultrapassadas pelas do Cristo e seus apóstolos, operadas em virtude das mesmas leis.


Nos tempos modernos, pelo ano de 1830, um santo padre bávaro, o Príncipe de Hohenlohe, possuiu essa admirável faculdade. Ele procedia sempre mediante a prece e a invocação, e a fama de suas curas repercutiu em toda a Europa. Curava os cegos, surdos, mudos; uma multidão de doentes e achacados, incessantemente renovado, assediava-lhe a casa.


Mais recentemente, outros taumaturgos atraíram a multidão dos sofredores e desenganados. Cahagnet, Puységur, Du Potet, Deleuze e seus discípulos fizeram prodígios. Ainda hoje, inúmeros curadores, mais ou menos felizes, tratam com assistência dos Espíritos.


Esses simples, esses crentes, são enigmas torturantes para a ciência médica oficial, tão impotente em face da dor, apesar de suas orgulhosas pretensões. Charcot, esse observador genial, no fim da vida reconheceu-lhes o poder. Numa revista inglesa publicou ele um estudo que se tornou famoso:


“The faith healing” – a fé que cura. Com efeito, a fé, que é de si mesma uma fonte de vida, pode bastar para restituir a saúde. Os fatos o demonstraram com eloqüência irrefragável. Nos mais diversos meios, homem de bem – o cura d'Ars, o Sr. Vigne, um protestante das Cevennas, o padre João, de Cronstadt, outros ainda, tanto nos santuários católicos como nos do Islam ou da Índia – obtiveram pela prece inumeráveis curas.


Demonstra isso que, acima de todas as igrejas humanas, fora de todos os ritos, de todas as fórmulas e seitas, há um foco supremo que a alma pode atingir pelos impulsos da fé, e no qual vai ela haurir forças, auxílios, luzes, que se não podem apreciar nem compreender desconhecendo Deus e não querendo orar. A cura magnética não exige, na realidade, nem passes, nem fórmulas especiais, mas unicamente o desejo ardente de aliviar a outrem, a invocação profunda e sincera da alma a Deus, fonte e princípio de todas as forças.


Dessas considerações se depreende um fato: é que perpetuamente, em todas as épocas, tem o mundo invisível colaborado com o mundo dos mortais, nele transfundindo suas aspirações e socorros. Os milagres do passado são os fenômenos do presente; só os nomes mudam; os fatos espíritas são eternos.


Assim, tudo se explica, se esclarece e se compreende. Ante o imenso panorama do passado se inclina o pensador, empunhando o facho do novo Espiritualismo; e essa luz, na vastidão dos séculos, a poeira dos destroços, que a História registrou, brilha a seus olhos como auríferas centelhas.


O gênio – dissemos – é uma mediunidade; os homens de gênio são médiuns em graus diversos e de várias ordens. Há nessa faculdade, além de grande variedade de formas, graduação e hierarquia, como em todos os domínios da Natureza e da vida.


Os homens de gênio, voluntária ou involuntariamente, conscientemente ou não, se acham em relação com o Além; dele recebem os poderosos eflúvios; inspiradores invisíveis os assistem e colaboram em suas obras.


Acrescentarei que o gênio é uma mediunidade dolorosa. Os grandes médiuns, como vimos, têm sido os maiores mártires. A morte de Sócrates, o suplício de Jesus e a fogueira de Joana d'Arc são alguns desses calvários redentores que dominam a História.


Todos os grandes homens sofreram; foram, segundo uma palavra célebre:


“ilustres perseguidos”. Todo homem que se eleva, isola-se: e o homem isolado sofre; é incompreendido. Um excelente livro a escrever seria o dos infortúnios do gênio; nele ver-se-ia quão doloroso foi o destino de todos os Cristos deste mundo: Orfeu, dilacerado pelas bacantes; Moisés, enterrado provavelmente vivo no Nebo; Isaías, serrado pelo meio do corpo; Sócrates, envenenado com cicuta; Colombo, acorrentado como malfeitor; Tasso, enclausurado entre loucos; Dante, errando através dos exílios; Milton, pobre como Job e cego como Homero; Camões, agonizando numa enxerga de hospital; os grandes inventores: Galileu, encarcerado pela Inquisição; Salomão de Caus, Bernardo Palissy, Jenner, Papin, Fulton e tantos outros, reputados insensatos! Insensatez sublime, como a de Jesus, que Herodes fez coroar de espinhos e revestir com um manto de púrpura, em sinal de humanidade. Há nesse fato leis misteriosas, conhecidas outrora pelos sábios, atualmente postergadas, mas que a ciência espiritualista contemporânea deve reconstituir com paciente labor entre numerosas contradições; porque a punição dos povos consiste em readquirir ao preço de seu suor, de seu sangue e suas lágrimas, as verdades perdidas e as revelações menosprezadas. Voltemos, porém, ao estudo psíquico do gênio.


O gênio é uma mediunidade, da qual possui antes de tudo o caráter essencial, que é a intermitência. Um homem superior não o é jamais no estado habitual; o sublime a jato contínuo faria rebentar o cérebro. Os homens de gênio têm às vezes suetos vulgares. Alguns mesmo há que não foram inspirados mais que uma vez na vida; escreveram uma obra imortal e em seguida repousaram.


Numerosos exemplos o demonstram: a mediunidade genial se assemelha à mediunidade de incorporação. É precedida de uma espécie de transe, que tem sido justamente denominado “a tortura da inspiração”. A mensagem divina não penetra impunemente o ser mortal; impõe-se-lhe de alguma sorte pela violência. Uma espécie de febre e um frêmito sagrado se apoderam daquele que o Espírito visita.cccx Manifestações, transportes semelhantes aos que agitavam a pítia em sua trípode, anunciam a chegada do deus: Ecce deus! Todos os grandes inspirados – poetas, oradores, músicos, artistas – têm experimentado essa hiperexcitação sibilina, em conseqüência da qual chegaram alguns mesmo a morrer. Rafael consumiu-se na flor dos anos. Há jovens predestinados cujo invólucro demasiado frágil não pôde suportar a energia das inspirações super-humanas, e que tombaram, logo ao alvorecer do próprio gênio, como a delicada flor que o primeiro raio de sol atira morta ao chão.


A Igreja admite essa doutrina; ensina que de entre os seus autores sagrados alguns são diretamente inspirados, como os profetas, outros simplesmente assistidos.


Essa distinção entre a inspiração e a assistência é para nós representada pelos diferentes graus da mediunidade. Lembremo-nos a esse respeito do que expusemos em outro lugar.cccxi A Igreja foi espírita durante os três primeiros séculos. As Epístolas de São Paulo e os livros dos Atos dos Apóstolos são manuais clássicos de mediunidade.


A teologia escolástica veio turvar a límpida fonte das inspirações, introduzindo elementos de erro na magnífica síntese da doutrina hierática das primeiras épocas cristãs. A obra chamada de Denis o “Areopagita” é inteiramente impregnada de Espiritismo. Na vida dos santos ressuma exuberante a seiva mediúnica de que foi saturada a primitiva Igreja pelo Cristo e seus apóstolos. Os conselhos de São Paulo aos Coríntios são recomendações de um diretor de grupo aos seus iniciados. Tomás de Aquino afirma ter comentado essas epístolas sob o próprio ditado do apóstolo; ele conversava com uma personagem invisível; à noite sua cela era inundada por uma luz estranha e seu discípulo Reginaldo, três dias depois de morto, lhe veio dizer o que vira no Céu. Alberto, o Cirande, hauria sua incomparável ciência da Natureza por meio de infusão mediúnica, ciência que lhe foi retirada subitamente, do mesmo modo que lhe havia sido transmitida; e na idade de quarenta anos tornou-se ele novamente ignorante como uma criança.


Joaquim de Flora e João de Parma, seus discípulos, foram instruídos por meio de visões e escreveram, sob o ditado de um Espírito, “O Evangelho Eterno”, que contém, em gérmen, toda a revelação do futuro. Os “litterati” da Renascença, Marsilio Ficino, de Florença; Pico de Mirandola, Jerônimo Cardan, Paracelso, Pomponácio e o insigne Savonarola imergiram na mediunidade como num oceano espiritual.


O século XVII teve também seus gloriosos inspirados. Pascal tinha êxtase; Malebranche escreveu, na obscuridade de uma cela fechada, sua “Pesquisa da Verdade”. O próprio Descartes refere que o seu sistema genial da “Dúvida Metódica” lhe foi revelado por súbita intuição que lhe atravessou o pensamento com a rapidez de um raio.cccxii Ora, à filosofia cartesiana, assim oriunda de uma espécie de revelação mediúnica, é que devemos a emancipação do pensamento moderno, a libertação do espírito humano, encarcerado havia séculos na fortaleza escolástica, verdadeira bastilha do despotismo aristotélico e monástico.


Esses grandes iluminados do século XVII são os precursores de Mesmer, de Saint-Martin, de Swedenborg, da escola san-simoneana e de todos os apóstolos da doutrina humanitária, precedendo Allan Kardec e a atual escola espiritualista, cujos inúmeros luzeiros se vão acendendo em todos os pontos do Universo.


*


Assim, o fenômeno da mediunidade se patenteia em todas as épocas, ora fulgurando com intenso brilho, ora velado e obscurecido, conforme o estado de alma dos povos, jamais cessando de encaminhar a Humanidade em sua peregrinação terrestre. Todas as grandes obras são filhas do Além. Tudo o que há revolucionado o mundo do pensamento, aduzindo um progresso intelectual, nasceu de um sopro inspirador.


Na hierarquia das inteligências existe uma solidariedade magnífica. Uns aos outros se têm os grandes inspirados transmitido, através do longo rosário dos séculos, o farol da mediunidade reveladora e gloriosa. A Humanidade ainda caminha à frouxa luz crepuscular dessas revelações, à claridade desses fogos acesos, nas eminências da História, secundada por predestinados instrutores.


Essa perspectiva da história geral é consoladora e grandiosa; reveste as modalidades e o caráter de um drama sacrossanto. Deus envia seu pensamento ao mundo por emissários que incessantemente descem os degraus da escada dos seres e vão levar aos homens a comunicação divina, como os astros enviam à Terra, através das profundezas, suas irradiações sutis. Assim tudo se liga no plano universal. As esferas superiores promovem a educação dos mundos inferiores. Os Espíritos celestes se fazem instrutores das Humanidades atrasadas. A ascensão dos mundos de prova para os de regeneração é o mais belo espetáculo que pode ser oferecido à admiração do pensador.


Desde as mais elevadas e brilhantes esferas às regiões mais baixas e obscuras, desde os mais radiosos Espíritos aos homens mais grosseiros, o pensamento divino se projeta em catadupas de luz, numa efusão de amor.


Com essa doutrina ou, antes, mediante essa visão de solidariedade intelectual dos seres, compreendemos de quanto somos devedores aos nossos antepassados espirituais, aos gloriosos médiuns, que, com o labor penosíssimo do gênio, semearam o que fruímos hoje, o que outros hão de melhor colher ainda no futuro. Esses pensamentos nos devem inspirar uma piedade reconhecida aos mortos augustos que implantaram o progresso em nosso mundo.


Vivemos numa época de perturbação em que já quase se não sentem estas coisas. Pouquíssimos entre os nossos contemporâneos se elevam a essas culminâncias, donde, como de um promontório, se descortina o vasto oceano das idades, o cadenciado fluxo e refluxo dos sucessos.


A Igreja, transformada em sociedade política, não soube aplicar às necessidades morais da Humanidade essas verdades profundas e essas leis do Invisível. Os sacerdotes são impotentes para nos encaminhar, porque eles próprios esqueceram os termos sagrados da sabedoria antiga e o segredo dos “mistérios”. A ciência moderna se engolfou até agora no materialismo e no positivismo experimental. A Universidade não sabe ministrar, pela palavra dos mestres, o ensino regenerador que retempera as almas e as prepara para as grandes lutas da existência. Até as sociedades secretas perderam também o sentido das tradições que justificavam seu funcionamento; praticam ainda os ritos, mas a alma que as vivificava emigrou para outros céus.


É tempo de que um novo influxo percorra o mundo e restitua a vida a essas formas gastas, a esses debilitados envoltórios. Só a Ciência e a revelação dos Espíritos podem dar à Humanidade a exata noção de seus destinos.


Um imenso trabalho em tal sentido se realiza atualmente; uma obra considerável se elabora. O estudo aprofundado e constante do mundo invisível, que o é também das causas, será o grande manancial, o reservatório inesgotável em que se hão de alimentar o pensamento e a vida. A mediunidade é a sua chave. Por esse estudo chegará o homem à verdadeira ciência e à verdadeira crença que se não excluem mutuamente, mas que se unem para fecundar-se; por ele também uma comunhão mais íntima se estabelecerá entre os vivos e os mortos, e socorros mais abundantes fluirão dos Espaços até nós. O homem de amanhã saberá compreender e abençoar a vida; cessará de recear a morte. Há de, por seus esforços, realizar na Terra o reino de Deus, isto é, da paz e da justiça, e, chegado ao termo da viagem, sua derradeira noite será luminosa e calma como o ocaso das constelações, à hora em que os primeiros albores matinais se espraiam no horizonte.


- UFA QUE BOM QUE FOI ATÉ O FINAL DA LEITURA

- ESTARÁ MAIS SÁBIO


FIM

 


Retornar