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XX


Aparições e materializações de Espíritos


São os fenômenos de aparição e materialização os que mais vivamente impressionam os experimentadores. Nas manifestações de que precedentemente nos ocupamos, o Espírito atua por meio de objetos materiais ou de organismos estranhos. Vamos agora apreciá-lo diretamente em ação. Cônscio de que entre as provas de sua sobrevivência nenhuma é mais convincente que sua vida terrestre, vai procurar o Espírito reconstituir essa forma por meio dos elementos fluídicos e da força vital hauridos nos assistentes.


Em certas sessões, na presença de médiuns dotados de considerável força psíquica, vêem-se formar mãos, rostos, bustos e mesmo corpos inteiros, que têm todas as aparências de vida: calor, tangibilidade, movimento. Essas mãos nos tocam, nos acariciam ou batem; mudam de lugar os objetos e fazem vibrar os instrumentos de música; esses rostos se animam e falam; esses corpos se movem e passeiam por entre os assistentes. Pode-se agarrá-los, palpá-los; depois, eles se desvanecem num repente, passando do estado sólido ao fluídico, após efêmera duração.


Assim como os fenômenos de incorporação nos iniciam nas leis profundas da Psicologia, a reconstituição das formas de Espíritos nos vai familiarizar com os estados menos conhecidos da matéria. Mostrando-nos que ação pode a vontade exercer sobre os imponderáveis, ela nos fará penetrar nos mais íntimos segredos da Criação, ou, antes, da renovação perpétua do Universo.


Sabemos que o fluido universal, ou fluido cósmico etéreo, representa o estado mais simples da matéria; sua sutileza é tal que escapa a toda análise. E, entretanto, desse fluido procedem, mediante condensações graduais, todos os corpos sólidos e pesados que constituem a base da matéria terrestre. Esses corpos não são tão densos, tão compactos como parecem. Com a maior facilidade os atravessam os fluidos, assim como os próprios Espíritos. Estes, pela concentração da vontade, secundados pela força psíquica, os podem desagregar, dissociar-lhes os elementos, restituí-los ao estado fluídico, depois transportá-los e os reconstituir em seu primitivo estado. Assim se explica o fenômeno dos transportes.


Percorrendo sucessivos graus de sua rarefação, a matéria passa do sólido ao líquido, depois ao estado gasoso, e finalmente ao estado de fluido. Os corpos mais duros podem assim voltar ao estado etéreo e invisível. Em sentido inverso, o fluido mais sutil se pode gradualmente converter em corpo tangível e opaco. Toda a Natureza nos mostra o encadeamento das transformações que conduzem a matéria, do éter mais puro ao mais grosseiro estado físico.


À medida que se rarefaz e se torna mais sutil, a matéria adquire novas propriedades, potências de intensidade progressiva. Disso nos fornecem exemplos os explosivos, as radiações de certas substâncias, o poder de penetração dos raios catódicos, a ação a grande distância das ondas hertzianas. Por eles somos levados a considerar o éter cósmico o meio em que a matéria e a energia se confundem, o grande foco das atividades dinâmicas, a fonte das inesgotáveis forças que a vontade divina impulsiona e donde se expandem, em ondas incessantes, as harmonias da vida e do pensamento eterno.


Pois bem, – e aqui vai a questão adquirir amplitude inesperada – a ação exercida pelo poder criador sobre o fluido universal para engendrar sistemas de mundos, vamos de novo encontrá-la num plano mais modesto, porém submetida a leis idênticas, na ação do Espírito a reconstituir as formas transitórias que estabelecerão, aos olhos dos homens, sua existência e identidade.


As próprias nebulosidades, agregados de matéria cósmica condensada, germens de mundos, e que na profundeza dos espaços nos mostram os telescópios, vão reaparecer na primeira fase das materializações de Espíritos. É assim que a experimentação espírita conduz às mais vastas conseqüências. A ação do Espírito sobre a matéria nos pode fazer compreender de que modo se elaboram os astros e se consuma a obra gigantesca do Cosmo.


Na maior parte das sessões, distinguem-se, ao começo, cúmulos nebulosos em forma de ovo; depois, listões fluídicos brilhantes, que se desprendem, quer das paredes e do soalho, quer das próprias pessoas, se avolumam pouco a pouco, se alongam e se tornam formas espectrais.


As materializações são infinitamente graduadas. Os Espíritos condensam suas formas de modo a serem primeiramente percebidos pelos médiuns videntes. Estes descrevem a fisionomia dos manifestantes e o que descrevem é depois confirmado pela fotografia, tanto à claridade do dia como à luz do magnésio.clxxxix Sabe-se que a placa sensível é mais impressionável que o olho humano. Num grau superior a materialização se completa; o Espírito torna-se visível para todos; deixa-se pesar; seus membros podem deixar impressões e moldes, em substâncias plásticas.


Em tudo isso a fiscalização deve ser muito rigorosa. É preciso preservarse cuidadosamente de todas as causas de erro ou ilusão. Convém por isso recorrer, tanto quanto possível, aos aparelhos registradores e à fotografia.


Vejamos, em primeiro lugar, os casos em que foi possível conseguir na placa as imagens de Espíritos, invisíveis para os assistentes.


Se têm sido cometidos numerosos abusos e fraudes, nessa ordem de fatos são abundantes, em compensação, as experiências e os testemunhos sérios.


O acadêmico inglês Russel Wallace, experimentando em sua própria casa, com pessoa de sua família, obteve uma fotografia do Espírito de sua mãe, em que um desvio do lábio constituía uma prova convincente de identidade. O médium vidente havia descrito a aparição antes de terminada a “pose”, e verificou-se que era exata a descrição.cxc


O pintor Tissot, célebre pelas ilustrações de sua “Vida de Jesus”, obteve uma prova que não é menos admirável: a fotografia de um grupo composto do corpo físico e do corpo fluídico do médium, desdobrado, simultaneamente, com a de um Espírito desencarnado e o do experimentador.cxci


Análogas comprovações foram feitas pelos Doutores Thompson e Moroni, pelos professores Boutlerov e Rossi-Pagnoni e pelo Sr. Beattie, de Bristol. Todos eles adotaram as mais minuciosas precauções. Pode-se ler em “Animismo e Espiritismo”, de Aksakof, cap. I, a narrativa minuciosa das experiências do Sr. Beattie.


Na primeira série dessas experiências, uma forma humana se desenhou na placa à décima oitava exposição. Mais tarde, o Dr. Thompson se associou às investigações e obteve-se uma série de cabeças, perfis e formas humanas, ao começo vagas, depois cada vez mais distintas, todas as quais haviam sido previamente descritas pelo médium em transe. Às vezes operava-se às escuras. Aqui está o que diz Aksakof:cxcii


“Nessas experiências nos achamos em presença, não de simples aparições luminosas, mas de condensações de uma certa matéria, invisível à nossa vista, e que ou é de si mesma luminosa ou reflete na placa fotográfica os raios de luz, à ação dos quais a nossa retina é insensível. Que se trata aqui de uma certa matéria, prova-o o fato de que ora é tão pouco compacta que deixa ver através das formas das pessoas presentes, ora é tão densa que cobre a imagem dos assistentes. Num dos casos a forma aparecida é negra.”


Como se vê, Aksakof acredita conosco que se não poderiam explicar essas manifestações sem a existência de um fluido, ou éter, substância manipulada por seres inteligentes invisíveis. É o que imprime ao fenômeno – pensa ele – um duplo caráter, ao mesmo tempo material, no estrito sentido da palavra, e intelectual, pela intervenção de uma vontade que trabalha artificialmente essa matéria invisível, com determinado fim.


Mumler, fotógrafo profissional, obtinha nas placas as imagens de pessoas falecidas. Intentaram-lhe um processo por dolo, mas não pôde ser descoberta fraude alguma e o fotógrafo ganhou a questão.


Não somente o inquérito judiciário estabeleceu o fato da produção, nas placas, de figuras humanas invisíveis à vista desarmada, como também doze testemunhas declararam ter reconhecido nessas figuras as imagens de parentes seus já falecidos. Mais ainda: cinco testemunhas, entre as quais o grande juiz Edmonds, depuseram que haviam sido produzidas, e foram reconhecidas, imagens de pessoas que em vida nunca se tinham fotografado.cxciii Obteve-se mesmo, no caso do Senhor Bronson Murray,cxciv a efígie de pessoas falecidas, na ausência de toda testemunha que as houvesse conhecido na Terra.


Conseguiu-se fotografar as sucessivas fases de uma materialização. Em meu poder conservo uma série de reproduções, que devo à gentileza do Sr. Volpi, diretor do “Vessillo”, de Roma, cuja integridade está acima de qualquer suspeita. Representam as aparições graduais da forma de um Espírito, muito vaga à primeira exposição, depois cada vez mais condensada e, por último, visível para o médium, ao mesmo tempo em que impressiona a placa fotográfica.


*


Recordemos agora alguns dos casos em que a aparição é simultaneamente visível para todos os assistentes e para o médium, o que torna impossível qualquer equívoco. O Espírito materializado tem todas as aparências de um ser humano; move-se e anda, conversa com as pessoas presentes e, depois de ter participado alguns momentos de sua vida, se desvanece lentamente, funde-se, por assim dizer, às suas vistas.


É primeiramente o caso de Katie King, forma feminina que durante alguns anos se manifestou em casa de Sir William Crookes, da Sociedade Real de Londres, e de que já tivemos ensejo de falar.cxcv


Várias vezes tem-se procurado insinuar que W. Crookes se havia retratado de suas afirmações. Ora, eis o que dizia ele, a propósito desses fenômenos, em seu discurso no Congresso para o adiantamento das ciências (British Association), realizado em Bristol, em 1898, e do qual era presidente:


“Trinta anos se passaram, depois que publiquei as narrativas de experiências tendentes a demonstrar que, fora de nossos conhecimentos científicos, existe uma força posta em ação por uma inteligência que difere da inteligência comum a todos os mortais. Nada tenho que retratar; mantenho minhas observações já publicadas. Posso mesmo acrescentarlhes outras muitas.”


A Sra. Florence Marryat, autora de grande nomeada, inseriu, numa de suas obras,cxcvi uma descrição minuciosa das sessões de Crookes, de que era das mais assíduas testemunhas. Eis aqui um fragmento:


“Assisti diversas vezes às investigações feitas pelo Senhor Crookes, para se convencer da existência da aparição. Vi madeixas escuras de Florence Cook esparsas no chão, diante da cortina, à vista de todos os assistentes, enquanto Katie passeava e conversava conosco. Vi, em várias ocasiões, Florence e Katie, ao pé uma da outra, de sorte que não posso ter a mínima dúvida de que eram duas individualidades distintas... No correr de uma sessão, pediu-se a Katie que se desmaterializasse em plena luz. Consentiu em submeter-se à prova, embora nos dissesse em seguida que lhe havíamos feito muito mal. Foi encostar-se à parede do salão, com os braços estendidos em cruz. Acenderam-se três bicos de gás. O efeito produzido em Katie foi terrífico. Vimo-la ainda durante um segundo apenas; depois, ela desvaneceu-se lentamente. Não posso melhor comparar a sua extinção que a uma boneca de cera derretendo-se ao calor de um braseiro. Primeiramente, os dois lados do rosto, vaporizados e confusos, parecia entrarem um no outro; os olhos se afundavam nas órbitas; o nariz desapareceu e a fronte se desmanchou. Os membros e o vestido tiveram a mesma sorte; ia tudo caindo no tapete, como uma coisa que desmorona. À luz dos três bicos de gás, olhávamos fixamente para o lugar que Katie King havia ocupado.”


Reproduzimos essas descrições a fim de mostrar o grande poder de desagregação que exerce a luz sobre as criações fluídicas temporárias e a necessidade das sessões obscuras, em certos casos, apesar dos inconvenientes que apresentam.


A esse respeito, o Sr. Camille Flammarion estabelece a seguinte comparação, escrevendo na “Revue” de 1906:


“Aqui está, num frasco e em volume igual, uma mistura de hidrogênio e cloro. Se quereis que a mistura se conserve, é preciso – seja ou não de vosso agrado – que o frasco permaneça na obscuridade. Tal é a lei. Enquanto ali ficar, ela se conservará. Se, entretanto, movido por uma fantasia pueril, expuserdes essa mistura à ação da luz, uma violenta explosão se fará subitamente ouvir; o hidrogênio e o cloro terão desaparecido e encontrareis no frasco nova substância: o ácido clorídrico. E, com acerto, concluireis: a obscuridade respeita os dois elementos; a luz os aniquila.”


Outro caso célebre, que reúne os melhores elementos de certeza, as mais concludentes provas,cxcvii é a aparição de Estela Livermore, falecida, a seu marido, o banqueiro Livermore, em Nova Iorque, de 1861 a 1866, em 388 sessões, dirigidas por um outro Espírito que a si mesmo se designava pelo nome de Dr. Franklin.


O fenômeno se completa com uma série de provas de caráter persistente.


Uns cem ditados são escritos por Estela, sob as vistas de seu marido, em cartões trazidos e marcados por ele. Graças a uma luz misteriosa que envolvia o fantasma, o Sr. Livermore reconhecia a mão, as feições, os olhos, a fronte, os cabelos da escrevente. “Sua fisionomia – diz ele – era de uma beleza sobre-humana e olhava-me com inefável expressão de felicidade.”


Esses fatos são antigos e já têm sido muitas vezes relatados. Não podíamos, entretanto, deixá-los esquecidos, em razão de sua importância e da extensa repercussão que se lhes tem dado. Vamos apresentar outros mais recentes. Já não se trata apenas de formas insuladas que aparecem, mas de grupos de Espíritos materializados, cada um dos quais constitui uma individualidade distinta do médium. Formas, de compleição e dimensões diferentes, se mostram ao mesmo tempo, se organizam gradualmente a expensas de uma massa fluídica nebulosa e, por fim, se dissolvem de repente, depois de terem intervindo alguns instantes nos trabalhos e nas conversas dos experimentadores.


O Dr. Paul Gibier, diretor do Instituto Pasteur, de Nova Iorque, apresentou ao Congresso de Psicologia de Paris, em 1900, extensa memória acerca das “materializações de fantasmas”,cxcviii obtidas por ele em seu próprio laboratório, na presença dos preparadores que o auxiliam habitualmente em seus trabalhos de biologia. Muitas senhoras de sua família assistiam, além disso, a essas experiências. Tinham por encargo especial vigiar a médium, Sra. Salmon, examinar-lhe os vestidos, pretos sempre, ao passo que os fantasmas apareciam de branco.


Foram tomadas todas as precauções. Empregava-se uma jaula metálica, cuidadosamente fechada, com porta de ferro presa por um cadeado. Durante as sessões, a médium era encerrada nessa jaula, cuja chave o Dr. Gibier conservava em seu poder. Por excesso de precaução, colava-se um selo postal francês no orifício do cadeado. A jaula era completada com um gabinete formado de cartinas. Outras vezes, só o gabinete era utilizado, sem a jaula.


Numerosas sessões se efetuaram nessas condições, das quais somente uma relataremos, porque resume todas as outras.cxcix


No dia 10 de julho de 1889 a médium, Sra. Salmon, é colocada no gabinete e amarrada à cadeira. Passam-lhe, além disso, uma fita em volta do pescoço, fixada por um nó cirúrgico. As extremidades da fita passam por dois orifícios abertos no forro do gabinete e são amarradas uma à outra por um duplo nó muito apertado, bem longe do alcance da médium, que está vestida de preto. Diminuiu-se a luz; mas distinguiam-se os objetos.


Aparições incompletas de braços, bustos e faces se produzem a princípio. Formas inteiras, vestidas de branco, lhes sucedem. Suas compleições variam, desde uma forma de criança, a pequena Maudy, aos fantasmas de elevada estatura. Vêm depois formas femininas, delgadas e graciosas, ao passo que a médium é pessoa de seus cinqüenta anos, bem nutrida. Entre aquelas, aparece uma figura masculina, alta e barbada. É Ellan, um Espírito de voz forte, que distribui vigorosos apertos de mãos aos assistentes. Essa mão, apertada pela do Dr. Gibier, dissolve-se pouco a pouco sob a pressão recebida.


Tais aparições se formam à vista dos experimentadores. Distingue-se ao começo um ponto nebuloso, brilhante e móbil, que se dilata e prolonga em forma de coluna; depois é um T. Este muda-se num perfil de senhora, coberto com um véu, e por fim uma encantadora figura de moça, esbelta e delicada, se esboça, se condensa. Passeia por entre os assistentes, cumprimenta, aperta as mãos que se estendem para ela, depois do que a aparição se desmorona como um castelo de cartas. Por um momento ainda se distingue uma cabeça graciosa que emerge do soalho e em seguida tudo desaparece. No mesmo instante, o Dr. Gibier apalpa a médium, que se conserva em seu lugar, amarrada, no gabinete. Dá-se toda a força à luz; as fitas são examinadas; estão intactas e é preciso algum tempo para as desatar.


Essas formas se movem e falam. Dão os nomes: Blanche, Lélia, Musiquita, etc. Esta última toca uma guitarra. Todas conversam com os assistentes; suas vozes se fazem ouvir em todos os pontos da sala. Quanto aos tecidos de que se vestem as aparições, elas mesmas afirmam produzi-los com o concurso de elementos tirados às roupas do médium, parcialmente desmaterializadas. Numa sessão, o Espírito Lélia forma com um sopro, aos olhos dos assistentes, um tecido leve de gaze branca, que se estende pouco a pouco e termina por cobrir todas as pessoas presentes. É um exemplo de criação pela vontade, que vem confirmar o que dizíamos no começo deste capítulo.


Donde vêm essas aparições, e qual é a sua natureza? O Dr. Gibier no-lo vai dizer: “Os fantasmas, interrogados, declararam todos ser entidades, personalidades distintas do médium, Espíritos desencarnados, que viveram na Terra, e cuja missão é demonstrar-nos a existência da outra vida.”


Uma particularidade, entre outras, nos vai demonstrar que esses Espíritos têm todo o caráter humano. “As formas – diz Gibier – se mostram a princípio muito tímidas e é preciso captar-lhes a confiança.”


A identidade de um desses Espíritos foi positivamente estabelecida: – a de Blanche, falecida parenta de duas senhoras que assistiam às sessões; ela era sobrinha de uma e prima de outra. Ambas puderam abraçá-la repetidas vezes e conversar com ela em francês, língua que a médium não compreende. O Dr. Gibier notou que as manifestações variavam de intensidade, na proporção do “volume de forças” fornecido aos Espíritos pela médium, e se produziam, conforme o caso, a maior ou menor distância da jaula ou do gabinete onde estava a médium sentada.


No decurso de uma sessão ocorreu um fato surpreendente. A médium, em transe, encerrada na jaula, foi encontrada do lado de fora, ao terminar das experiências. Segundo as explicações dadas pelo Espírito Ellan, a porta da jaula havia sido desmaterializada e logo reconstituída por agentes invisíveis.cc É esse um caso notável de desagregação e reconstituição da matéria, que convinha assinalar.


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Outros testemunhos, não menos importantes, foram coligidos pelo Congresso Espiritualista de Paris, em 1900.


Na sessão de 23 de setembro, o Dr. Bayol, ex-governador do Dahomey, senador e presidente do Conselho Geral das Bocas do Ródano, expôs com clareza os fenômenos de aparições observados, de 1º de janeiro de 1899 a 6 de setembro de 1900, numa quinta de Aliscamps, em Arles.cci


Visitamos, depois disso, o cemitério romano de Aliscamps (Campos Elíseos), onde se alinham, entre os teixos e terebintos, sob o límpido céu da Provença, extensas filas de sarcófagos antigos. Vimos a sepultura de Acella, de quem se vai tratar, e lemos a seguinte inscrição: “A minha filha Acella, morta aos 17 anos, na própria noite de seu noivado.” Foi numa quinta próxima, construída com pedras tumulares, que se fizeram as experiências do Dr. Bayol, em presença de eminentes personagens, como o prefeito das Bocas do Ródano, um general de Divisão, o grande poeta Mistral, autor da “Mireille”, doutores em Medicina, advogados, etc.


Os fenômenos começaram pelos movimentos de pesada mesa, que girava na sala com grande ruído. Viram-se depois dois globos luminosos circunvagar e refletirem-se nos espelhos, o que demonstrava a sua perfeita objetividade. O Dr. Bayol teve a idéia de evocar o Espírito Acella, a jovem romana, morta no tempo dos Antoninos. Apareceu uma chama, que se dirigia para ele e lhe pousou na cabeça. Com ela conversou como se o fizesse com uma pessoa viva, e a chama se agitava de modo inteligente. Viam-se, às vezes, até dez a doze chamas, que pareciam inteligentes e iluminavam toda a sala.


“Estaríamos alucinados?” – interroga o Dr. Bayol. “Éramos, algumas vezes, dezenove, e creio que é difícil alucinar-se um velho colonial como eu.”


Mais tarde, em Eyguières, Acella se tornou visível e deu uma impressão do rosto em parafina, não em côncavo, como costumam ser os moldes, mas em relevo. Produziram-se depois transportes, chuvas de pétalas de rosa, de folhas de figueira e louro, que enchiam os bolsos do narrador. Foi ditado um poema em idioma provençal e desferidas melodias num bandolim, sem contacto aparente.


Os médiuns, pessoas iletradas, obtiveram fenômenos de escrita em grego. Outras vezes se produziram efeitos físicos de grande energia. Um dos médiuns foi projetado no ar, a uma altura de quatro metros, e tornou a cair sobre a mesa, sem nada sofrer.


“Minhas experiências – disse o Dr. Bayol em seu memorial ccii – foram rodeadas de todas as precauções possíveis. Há na França uma coisa formidável, um terrível monstro, que mete medo aos franceses e que se chama ridículo. A um velho colonial como eu permitireis que o afronte. Estou convencido de que tenho razão e não devo ter medo de dizer a verdade.”


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No correr dos anos de 1901 e de 1902, toda a imprensa italiana se ocupou com uma série de sessões dadas pela médium Eusápia Paladino, no Círculo Minerva, em Gênova, em presença dos professores Lombroso, Morsélli e F. Porro e do arguto escritor, conhecido em toda a península, extremamente céptico a respeito do Espiritismo, A. Vassalo, diretor do “Século XIX”.


Dez sessões se efetuaram. Depois de numerosos fenômenos físicos e vários casos de levitação,cciii formaram-se aparições. Eis como o Sr. Vassalo as descreve em seu jornal.cciv


“O fenômeno dura tempo demasiado longo, para que possa ser atribuído à alucinação, parcial ou coletiva. Por cima da cabeça do médium mostra-se uma mão branca, num gesto de adeus a todos os assistentes. Para favorecer o desenvolvimento do fenômeno, apaga-se a luz, que impede a materialização. Sinto imediatamente atrás de mim o indubitável contacto de uma pessoa; dois braços me cingem com ternura e afeto; duas mãozinhas débeis, proporcionadas à mão entrevista, me tomam a cabeça, acariciando-a, uma luz misteriosa me ofusca e recebo longos e repetidos beijos, ouvidos por todos. Só pode ser meu falecido filho Naldino; e agora que se acende uma vela, uma silhueta se desenha ao meu lado, representando exatamente as feições do meu menino falecido; essa forma permanece imóvel durante alguns segundos.


A quarta sessão nos mostra o fenômeno em seu ponto culminante. Naldino aparece novamente. A princípio, um demorado abraço, durante o qual sinto a forma de um rapaz, franzina, comprimir-me; depois, uma multidão de beijos, percebidos por todos, e palavras em dialeto genovês – o médium só fala o napolitano – que todos ouvem e que têm um timbre particular sobre que não me posso enganar: “Papa mio! papa mio!” intercaladas de exclamação de alegria: “o Dio!”


De repente, o contacto com o invisível – tão visível, entretanto – parece querer desvanecer-se; como que se vai evaporar; depois, novo abraço. Recebo três longos e apaixonados beijos, e a voz me diz: “Estes são para mamãe.” Convidam-nos a acender de novo a lâmpada elétrica; e, como se o invisível nos quisesse dar uma derradeira prova de sua presença, um fenômeno, entrevisto em precedente sessão pelo professor Lombroso, se renova. Percebemos todos uma forma humana, de perfeita semelhança com a já designada, abrir os braços e cingir-me. Uma de suas mãos toma-me a mão direita, enquanto com a esquerda seguro sempre o médium, que, como todos pudemos certificar-nos, estava reclinado na cadeira, em hipnose profunda.”


Em certas noites são múltiplas as aparições. Perfis indistintos, contornos de cabeças, sombras obscuras se desenham num fundo escassamente iluminado; fantasmas brancos, de extrema tenuidade, se mostram nos lugares escuros da sala. O professor Morsélli reconhece a sombra de sua filhinha, morta aos onze anos. O Sr. Bozzano sente uma delicada mão de mulher o apertar, o acariciar; dois braços lhe cingem o pescoço. Uma voz débil, mas distinta, pronuncia um nome que é para ele “uma revelação de Alémtúmulo”. Durante todo esse tempo, o médium, acordado, geme, dirige súplicas aos seus amigos invisíveis e pede-lhes socorro. Seus sofrimentos chegam a tal ponto, que é preciso suspender as experiências.


No curso de uma sessão dirigida pelo Dr. Morsélli, professor de Psicologia na Universidade de Gênova, durante a qual o médium, depois de minucioso exame de suas vestes, foi amarrado em uma cama, cinco formas materializadas apareceram em meia-luz. A última era a de uma senhora, envolta em gaze transparente e trazendo nos braços uma criancinha. Outra figura de moça, cuja sombra projetada pela luz do gás se desenhava na parede, cumprimentou, e a sombra acompanhou todos os movimentos da forma.ccv

Travou-se viva polêmica entre vários jornais a respeito dessas experiências. Numa de suas réplicas, assim se exprimia o professor Morsélli:


“Declaro que o Espiritismo merece ser plenamente estudado pelos sábios e, por minha parte, confesso que nele creio inteiramente. Eu, o materialista obstinado; eu, o intrépido diretor de um jornal intransigente e positivista, pretenderiam fazer-me passar por vítima de uma alucinação ou por neófito crédulo?!”


A. Vassalo, numa conferência feita posteriormente em Roma, na sede da Associação da Imprensa, perante um público de escol, sob a presidência do Sr. Luzzatti, antigo ministro, expôs desassombradamente todos os fatos a que acabamos de aludir e afirmou as aparições de seu filho falecido.


César Lombroso, finalmente, o célebre professor da Universidade de Turim, em sua obra “Hipnotismo e Espiritismo” (tradução Rossigneux), no capítulo intitulado “Fantasmas”, depois de relatar as aparições obtidas no curso das sessões de Eusápia, por Vassalo e Morsélli, assim se exprime:


“Obtive eu próprio uma bem comovedora aparição. Foi em Gênova, em 1882. Eusápia não parecia, nesse momento, em condições de produzir grande coisa. Pedindo-lhe ao começo que fizesse mover-se em plena luz um pesado tinteiro, objetou-me em tom vulgar: “De que servem tais ninharias? Eu sou capaz de te fazer ver tua mãe.” Pouco depois, na meia obscuridade produzida por uma lâmpada de vidros encarnados, vi destacar-se da cortina uma silhueta, envolta num véu e de bem pequena estatura, como o era minha pobre mãe. Fez o giro completo em torno à mesa e se deteve ao pé de mim, sorrindo e me dirigindo palavras que os outros ouviam, mas que, em conseqüência da minha surdez, não pude perceber. Extremamente comovido, peço-lhe que repita, e ela diz: “César, fio mio”, o que, confesso, me surpreende bastante, porque de preferência costumava ela dizer, em sua língua veneziana: “mio fiol”. Depois a meu pedido faz novamente o giro em torno à mesa e me envia um beijo. Nesse momento, Eusápia estava bem segura por seus dois vizinhos e, ao demais, sua estatura excede pelo menos dez centímetros à de minha mãe, que me tornou a aparecer ainda, menos distinta, enviando-me beijos e me falando em mais oito sessões, nos anos de 1906 e 1907, em Milão e Turim.”


Massaro, de Palermo, numa sessão, a 26 de novembro de 1906, em Milão, viu aparecer seu filho, que o tomou amplamente nos braços e o abraçou.


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Já não têm conta às aparições e materializações de Espíritos. Têm sido observadas em todos os países por numerosos experimentadores. Em Tours, pude eu mesmo observar uma delas, que descrevi em meu livro “Cristianismo e Espiritismo”, cap. IX. Nesse caso, a forma era vaga e sombria; não caminhava, deslizava pelo solo.


Às vezes, porém, as aparições revestem todos os caracteres de uma beleza ideal.


O Sr. Georg Larsen, numa carta dirigida ao “Eko”,ccvi jornal que se publica na Suécia, descreve a aparição de sua esposa Ana, falecida a 24 de março de 1899. O fenômeno ocorreu em Berlim, em 1901, em presença da Princesa Karadja, da Condessa de Moltke e outras pessoas. Redigiu-se um memorial, que foi assinado por todos os assistentes. O Sr. Larsen assim se exprime:


“Abriram-se as cortinas, deixando ver um espetáculo maravilhoso. Vimos elegante mulher, vestida de noiva, com longo véu branco que lhe caía da cabeça aos pés; mas que véu! Parecia tecido de aéreos raios luminosos. E como eu lhe reconhecia as feições! Há doze anos me conduzia ao altar essa mulher, então viva. Como era formosa, com o véu sobre os cabelos negros e a estrela brilhante ao alto da cabeça! Ouvi em torno de mim exclamações de assombro. Meus olhos se conservaram fixos no adorado rosto, até que de novo cerraram-se as cortinas.


Um momento depois reapareceu ela, tal como costumava estar em nossa casa; caminhou até mais perto de mim e levantou os braços estendidos. Os cabelos negros formavam a mais bela moldura em torno do seu rosto; estava com os braços nus e tinha o esbelto corpo envolto num longo vestido de um branco de neve. Fitava-me com seus olhos luminosos; eu tornava a encontrar sua atitude e sua expressão afetuosa; era minha mulher viva; mas a aparição total tinha um beleza e uma harmonia singulares, um conjunto idealizado, que um ser da Terra não possui. Murmurei o seu nome. O sentimento de uma felicidade inexprimível se apoderava de mim. Ela deslizou silenciosamente até ao gabinete, cujas cortinas se cerraram de novo. A sala estava bem iluminada; os assistentes se conservaram sérios e calmos; o médium permaneceu visível em sua poltrona, ao lado e durante todo o tempo da aparição.”


A pedido do Sr. Larsen, foi-lhe deixado um pedaço do véu, que ele ainda conserva em seu poder. “Esse véu – diz ele – de um tecido delicado, foi urdido com matéria igual à que emprega o Espírito para se tornar visível e tem sua origem nas radiações do corpo humano.”


*


Em sua crítica aos fenômenos de aparição, recorrem quase sempre os detratores do Espiritismo à teoria da alucinação. É uma explicação, por igual, cômoda e vaga, e antes uma palavra oca, destinada a dissimular a penúria de argumentos de contraditores em apuros.


Conviria antes de tudo definir precisamente o que é alucinação. É – dizem – uma aberração dos sentidos. Mas o campo de nossas percepções é tão limitado, tantas coisas na Natureza escapam aos nossos sentidos imperfeitos, que nunca sabemos, nos casos controvertidos, se não se trata de objetos percebidos por sentidos mais sutis, mais apurados que os da generalidade dos homens.


Como vimos, grande número de manifestações espíritas baseia-se em fotografias ou moldes, que, confirmando sua autenticidade, excluem toda possibilidade de ilusão. Aksakof obteve fotografias de uma forma de Espírito materializada, que amparava nos braços o médium Eglinton, imerso em profundo transe e num estado de completo esgotamento. Todos os assistentes distinguiam a aparição, de elevada estatura, de barba preta e penetrante olhar.ccvii


Em casa da Sra. d`Espérance, em Gotenburgo, obtiveram-se, em 1897, numerosas fotografias de Espíritos, na presença de Aksakof e de outros experimentadores.ccviii


Moldes de membros materializados são obtidos em parafina derretida, moldes sobre os quais é, em seguida, calcado um modelo em gesso, que reproduz em relevo, com perfeita exatidão, todas as particularidades anatômicas da forma.


As mãos, moldadas por esse processo, não têm relação alguma com as dos médiuns. O professor de Geologia Denton as obteve de tamanhos diferentes, desde mãos gigantescas que excediam as dimensões de mãos humanas, até dedos de criancinhas. Como medida de fiscalização, as experiências foram feitas numa caixa fechada à chave e lacrada, previamente examinada por todos os assistentes. A operação se efetuou em plena luz, estando o médium constantemente vigiado, e os relatórios foram assinados pelos experimentadores, entre os quais se achavam o professor Denton, o Dr. Gardner, o Coronel Cope, Epes Sargent, literato bem conhecido nos Estados Unidos, etc.ccix


Idênticas experiências foram feitas com o mesmo resultado pelo Sr. Reimers, de Manchester, sendo a cabeça e as mãos do médium presas num saco de filó, amarrado na cintura. Os agentes ocultos são visíveis ao mesmo tempo em que o médium. Numa sessão, foram simultaneamente vistos este último e quatro formas materializadas, tendo cada uma a fisionomia e sinais particulares que a distinguiam das outras figuras. Apresentavam-se aos assistentes, após a operação da moldagem, e os convidavam a retirar eles mesmos as luvas de parafina de suas mãos e os revestimentos de seus pés materializados.ccx


Toda fraude se torna ao demais impossível pelo fato de que, estando a parafina a ferver, não haveria mão humana que lhe pudesse tolerar a excessiva temperatura, como não poderia igualmente retirar-se do molde, sem quebrar-lhe ou, pelo menos, estragar-lhe a forma, delicada e extremamente quebradiça, enquanto a mão oculta parece desmaterializar-se no próprio molde.


Ernesto Bozzano, em “Annales des Sciences Psychiques”, de janeiro de 1910, publicou um extrato das sessões organizadas em 1893 com a Sra. d'Espérance, na Noruega, por um grupo de eminentes experimentadores, as quais foram efetuadas na residência do professor E. Em quase todas se apresentou a forma de “Nefentes”. Era uma forma de mulher extremamente bela; mostrava-se à luz ao mesmo tempo em que a médium, “desperta e sentada com os outros experimentadores fora do gabinete”. Materializava-se no meio do círculo e se prestava, ora a ser fotografada, ora a escrever no canhenho de um dos assistentes, ora a fornecer o modelo de sua própria mão, imergindo-a em parafina liquefeita.


Essa última experiência é assim narrada no “diário” da Baronesa Peyron:


“O leve ruído produzido pela mão a mergulhar no líquido e ser dele retirada continuou durante alguns minutos, à sombra das cortinas, permitindo-nos divisar completamente a forma branca inclinada para o recipiente. Depois, “Nefentes” retomou a atitude erecta e voltou-se para nós, olhando em torno, até que descobriu o Sr. F. sentado atrás de um outro experimentador, que o ocultava em parte. Dirigiu-se então a ele, suspensa no ar, procurando entregar-lhe um objeto. “Ela me entrega um bocado de cera!” exclamou ele; mas logo reparando: “Não; é o modelo de sua mão, coberta até ao punho; a mão se dissolve no interior do molde.” Enquanto ele falava ainda, a forma deslizava tranqüilamente para o gabinete, deixando nas mãos do Sr. F. o modelo de parafina. Tínhamos, finalmente, obtido o tão desejado fenômeno!


Terminada a sessão, foi examinado o molde: exteriormente parecia informe, glanduloso, formado por um grande número de camadas superpostas de parafina, em cujo interior notava-se a impressão de todos os dedos de mão muitíssimo pequena. Fomos no dia seguinte levá-la a um modelador, a fim de nos dar a reprodução interior em gesso. Tal foi a sua estupefação e a de seus operários, que consideraram aquele objeto como obra de feiticeira. Executado o trabalho, pudemos então admirar uma mão muito pequena e completa até ao punho; todas as minúcias das unhas e da pele apareciam: os dedos se apresentavam curvados por forma tal que seria impossível a uma mão humana ser retirada sem quebrar o modelo.”


As materializações de membros fluídicos podem algumas vezes explicarse por um desdobramento parcial do organismo do médium. Aksakof obteve um molde do pé da forma desdobrada de Eglinton.ccxi Foi igualmente comprovado que as mãos exteriorizadas de Eusápia Paladino deixavam impressões, a distância, em substâncias plásticas.


Desses fatos acreditaram certas pessoas poder deduzir que as aparições de fantasmas não passam de desdobramentos do médium. Essa explicação é inadmissível, pois que, como vimos, em presença de um único médium puderam contar-se até cinco ou seis Espíritos materializados, de sexo diferente, alguns dos quais falavam línguas estranhas, desconhecidas do sensitivo. Mesmo nos casos de aparições insuladas, as formas materializadas diferem totalmente do médium, física e intelectualmente, como o demonstram os fatos citados.


Aksakof é induzido a crer que essas formas não são reproduções das que revestiam os Espíritos em sua existência terrestre; são antes formas de fantasia, criadas pelos agentes invisíveis, não encerrados nessas formas, senão animando-as exteriormente. Essa explicação, ao que ele diz, ter-lhe-ia sido ministrada pelos Espíritos.ccxii


Essa teoria, se é aplicável aos fenômenos de Gotenburgo, não parece poder tornar-se extensiva a todos os casos de materialização, como, por exemplo, aos fatos observados por Crookes, Wallace, Gibier, etc. Se, com efeito, pode o Espírito criar formas materiais que são simples imagens, pode também condensar seu próprio invólucro, a ponto de o tornar visível. O fenômeno das materializações se explica de modo racional e satisfatório pelo funcionamento do perispírito. Esse envoltório fluídico da alma é como um desenho, um esboço, em que a matéria se incorpora, se condensa, por sucessivas acumulações das moléculas, até chegar a reconstituir um organismo humano.


Assim, com Katie King o Espírito materializado é uma mulher terrestre; respira, seu coração palpita; possui todos os caracteres fisiológicos de uma pessoa viva.ccxiii


Nos moldes em parafina obtidos por Zoellner, Dentou, etc., moldes ou impressões de mãos, pés e rostos, as menores particularidades da pele, dos ossos, dos tendões, são reproduzidos com rigorosa exatidão. Os Drs. Nichols e Friese obtiveram, na presença de doze testemunhas, o molde de mão de criança, com um sinal particular, uma ligeira deformidade, que permitiu a uma senhora presente reconhecer a mão de sua filha, morta aos cinco anos de idade.ccxiv


Não se deve concluir daí que o Espírito conserve, no Espaço, as imperfeições físicas ou as mutilações de seu corpo terrestre. Seria um erro crasso, pois que o testemunho unânime dos desencarnados nos indica exatamente o contrário. No Além, jamais o perispírito é mutilado ou enfermo:


“Quando o Espírito se quer materializar – diz G. Delanne ccxv – é obrigado a pôr novamente em ação o mecanismo perispiritual, e este reconstitui o corpo com as modificações que sofrera durante a permanência do Espírito na Terra.”


A seguinte narrativa, transmitida ao jornal “Facts” pelo Sr. James N. Sherman, de Rumfort (Rhode Island), e reproduzida em “Light” de 1885, pág. 235, é um novo exemplo da lei de conservação das formas evolvidas pelo ser durante a sua passagem aqui na Terra:


“Estive, na minha mocidade, entre os anos de 1835 e 1839, nas ilhas do Pacifico, e havia indígenas a bordo do nosso navio, com os quais consegui aprender perfeitamente a língua que falavam. Mais tarde, a 23 de fevereiro de 1883, assisti a uma sessão em casa dos Srs. Allens, em Providência (Rhode Island), durante a qual se materializou um indígena das ilhas do Pacífico: reconheci-o pela descrição que fez da queda que havia dado da pavesada e da qual resultara contundir-se no joelho, que ficou inchado. Na aludida sessão, colocou ele a mão no joelho, que apresentava, materializado, a mesma tumefação e rijeza verificadas por ocasião do acidente e que não mais cessaram. A bordo lhe chamávamos Billie Marryat.”


*


Os elementos das materializações – dissemos nós – são temporariamente hauridos nos médiuns e nas outras pessoas presentes. Suas radiações, seus eflúvios, são condensados pela vontade dos Espíritos, inicialmente em cúmulos luminosos; depois, à medida que aumenta a condensação, a forma se desenha, torna-se cada vez mais visível. Esse fenômeno é sempre, nas sessões, acompanhado de sensação de frio, indício de dispêndio de força e de calor – não sendo calor e luz, como se sabe, senão modos vibratórios, mais ou menos intensos, da mesma substância dinâmica, num período uniforme de tempo. Nos médiuns, esse dispêndio é considerável e se traduz por diferenças de peso muito sensíveis.


W. Crookes o verificou durante as materializações de Katie King, por meio de balanças munidas de aparelhos registradores. A esse respeito, diz a Sra. Fl. Marryat: “Vi Florence Cook numa balança especialmente fabricada pelo Sr. Crookes; ela estava atrás da cortina, enquanto o fiel permanecia à vista. Nessas condições, a médium, que pesava 80 libras no estado normal, acusava apenas 40, desde que a forma de Katie estivesse completamente materializada.”


Nas experiências dos Srs. Armstrong e Reimers, feitas em Liverpool com o concurso dos médiuns Miss Wood e Fairlamb, procedeu-se à pesagem dos médiuns e das formas aparecidas, e pôde-se verificar que o peso perdido pelas sensitivas se encontrava nas aparições materializadas.ccxvi


Durante todo o tempo em que duram esses fenômenos os médiuns estão mergulhados em transe profundo, semelhante à morte. Seus corpos minguam, os vestidos flutuam em torno deles; a pele pende flácida e vazia e forma verdadeiros sacos.ccxvii


Os outros assistentes sofrem também diminuição de força e de vida. O Sr. Larsen o assinala, após a aparição de sua mulher:ccxviii


“Eu devo ter contribuído para sua materialização, porque no dia seguinte estava bastante fatigado; tinha os olhos amortecidos; os cabelos e a barba estavam um pouco embranquecidos; evidente que muita força física me havia sido subtraída. Em poucos dias readquiriu meu corpo o vigor normal; mas isso indica que as pessoas dotadas de poderes mediúnicos devem tomar suas precauções.”


A Sra. Florence Marryat descreve uma sessão que se efetuou, no dia 5 de setembro de 1884, em presença dos Coronéis Stewart e Lean, do Sr. e da Sra. Russell-Davies, do Sr. Morgan e dela própria, na qual os Espíritos mostraram aos experimentadores de que modo procediam a fim de organizar para si mesmos um corpo a expensas do médium:ccxix


“Eglinton se apresentou primeiramente entre nós, em transe completo. Entrou de costas, com os olhos fechados, a respiração ofegante, parecendo debater-se contra a força que o impeliu para o nosso lado. Uma vez aí, apoiou-se a uma cadeira e vimos sair-lhe da ilharga esquerda uma espécie de vapor, massa nevoenta como fumo. Suas pernas estavam iluminadas por clarões que as percorriam em todos os sentidos. Um véu branco se lhe estendia pela cabeça e pelas ombros. A massa vaporosa ia aumentando sempre e a opressão do médium tornava-se mais intensa, enquanto mãos invisíveis, retirando-lhe da ilharga flocos de uma espécie de gaze muito leve, os acumulavam no solo, em camadas superpostas. Acompanhávamos com alvoroçada atenção os progressos desse trabalho. De repente se evaporou a massa e num abrir e fechar de olhos um Espírito perfeitamente formado apareceu ao lado de Eglinton. Ninguém poderia dizer donde nem como se achava ele entre nós; mas aí estava. Eglinton deixou-se cair no soalho.”


Não somente são feitas consideráveis absorções do corpo do médium, mas em certos casos é este submetido à desagregação total. Nas experiências dirigidas por Aksakof, em casa da Sra. d'Espérance, em Gotenburgo, foi observada uma coisa surpreendente. O corpo do médium, isolado no gabinete escuro, havia parcialmente desaparecido. Inteiramente desagregada e tornada invisível por um poder misterioso, a parte inferior do corpo tinha servido às materializações dos Espíritos Ana, Iolanda e Leila. Seus elementos haviam sido transfundidos temporariamente nas formas espectrais, para em seguida voltarem a seu primitivo estado, tendo conservado todas as suas propriedades e sem que disso o médium tivesse tido consciência.ccxx


Fato semelhante foi registrado pelo Coronel Olcott, em condições de fiscalização que tornavam impossível toda fraude.ccxxi


A médium, Sra. Compton, a quem haviam tirado os brincos das orelhas, foi amarrada a uma cadeira com linha muito forte, enfiada nos orifícios dos lobos das orelhas e lacrada no espaldar da cadeira, sendo impresso no lacre o sinete pessoal do coronel. Além disso, a cadeira foi fixada ao soalho por meio de um barbante e cera. O Espírito de uma menina, Katie Brink, apareceu vestido de branco, circulou pela sala e tocou diversas pessoas. Convidado a deixar-se pesar, prestou-se de bom grado e o peso verificado foi de 77 libras inglesas:


“Penetrei no gabinete – diz o coronel – enquanto a menina estava na sala; não encontrei a médium; a cadeira estava vazia; nela não havia nenhuma espécie de corpo. Convidei então a menina a tornar-se mais leve, se fosse possível, e subir de novo ao prato da balança. Seu peso havia baixado a 59 libras. Ela reapareceu ainda, dirigiu-se de um a outro espectador, sentou-se nos joelhos da Sra. Hardy e, finalmente, prestou-se a uma derradeira pesagem, que não acusou mais de 52 libras, posto que, do começo ao fim dessas operações, nenhuma mudança se houvesse operado na aparência de sua forma corporal.


Efetuada essa última pesagem, o Espírito não tornou a aparecer. Penetrei com a lâmpada no gabinete e encontrei a médium tal como a havia deixado no começo da sessão, amarrada com as linhas e os sinetes de lacre intactos. Continuava sentada, com a cabeça encostada a uma das paredes; sua carne, pálida, tinha a frialdade do mármore; com as pupilas reviradas sob as pálpebras, a fronte coberta de suor frio, estava sem pulso e quase sem respiração. Permaneceu vinte minutos em catalepsia; depois a vida lhe foi pouco a pouco regressando ao corpo e ela voltou ao seu estado normal; colocada no prato da balança, pesou 121 libras.”


O venerável Arcediago Colley, reitor de Stockton, efetuou, em 6 de outubro de 1905, uma conferência relativa ao Espiritismo, durante a semana do Congresso da Igreja Anglicana. Essa conferência fez grande rumor na Grã-Bretanha; foi, em seguida, publicada em brochura e acreditamos interessante reproduzir-lhe as seguintes passagens. Nela diz o autor:


“Aqui está um extrato do meu diário, em 28 de dezembro de 1877.ccxxii Éramos cinco reunidos essa noite, com o nosso eminente médium,ccxxiii em meu aposento, 22, Bernard Street, Russel Square, em Londres. A primeira forma humana anormal que nessa ocasião se apresentou foi a de um menino, igual à de qualquer menino inglês de seis ou sete anos. Essa pequena personalidade, à vista de todos (três bicos de gás estavam bem acesos), se reconstituiu diante de nós.


Para não repetir tantas vezes, sem necessidade, como se produzem essas maravilhas, direi uma vez por todas que a aparição dos nossos amigos psíquicos se opera do seguinte modo: eu me conservava habitualmente ao lado do médium em transe, amparando-o com o braço esquerdo, de modo a assegurar-me as melhores condições possíveis para observar o que se passava.


Quando estávamos à espera de uma materialização (e, às vezes, de repente, sem nenhuma expectativa do grande parto psíquico), víamos elevar-se, como do tubo de uma caldeira, através da roupa preta do médium e um pouco abaixo do seu peito esquerdo, um filamento vaporoso, que permanecia apenas visível, estando a uma ou duas polegadas do corpo do nosso amigo.


Então esse filamento constituía pouco a pouco uma espécie de névoa, donde saiam os nossos visitantes psíquicos, utilizando-se aparentemente desse vapor fluídico para formar as amplas roupagens brancas em que se envolviam...


Ora, a forma infantil que, de modo anormal, se achava em nossa presença, vestida de branco e com lindos cabelos de ouro, tinha todas as atitudes próprias de uma criança humana; batia com as mãozinhas, aproximava a boca para que cada um de nós a beijasse, falava de modo infantil, com um leve receio. O médium, como um irmão mais velho, dava-lhe instruções e o mandava aqui, ali, levar tal e tal coisa de um lado a outro do aposento – o que o menino fazia com perfeita naturalidade. Aproximando-se, finalmente, com singeleza e confiança, do autor de sua existência momentânea, a graciosa criatura foi por ele reabsorvida e desapareceu, fundindo-se novamente no corpo do nosso amigo. Tocou depois a vez ao egípcio, nosso amigo “o Mahedi”. A cor da pele bronzeada que apresentava o nosso visitante anormal, que eu conseguia examinar de perto com uma lente, através da qual lhe observava minuciosamente a carne, as unhas, as mãos pequenas, os pés, os tornozelos, os braços e as pernas trigueiras e cabeludas, a mobilidade das feições, em que, de quando em quando, brilhava uma expressão de esfinge; o nariz pronunciado, o contorno geral do semblante, o perfil regular, os olhos negros, o olhar penetrante, não, contudo, sem benevolência, os cabelos pretos, lisos e compridos, com o bigode e a barba longos e caídos, os membros nervudos e musculosos; a grande estatura, de mais de dois metros, tudo isso me confirmava nas primeiras impressões de que “o Mahedi” era um oriental, mas não da Índia nem do Extremo Oriente.


Meu exame, feito com todo o vagar nessa ocasião, foi muitas vezes repetido e eu tinha consciência da graça que o nosso amigo misterioso achava na minha importuna e minuciosa inspeção de sua robusta pessoa físico-psíquica.


Eu não retiraria, para ser arcebispo de Cantuária, uma única palavra do que escrevi acerca de coisas vistas e anotadas, pela primeira vez, há longos anos e sobre as quais meditei em silêncio durante vinte e oito anos.


Afirmo a veracidade dessas coisas, empenhando a minha palavra de clergyman, e por ela pus em risco a minha posição eclesiástica e o meu futuro profissional.”


Às materializações de Espíritos se vêm algumas vezes acrescentar criações espontâneas de plantas, transportes de flores e frutos.


No dia 28 de junho de 1890, sob as vistas de Aksakof e do professor Boutlerov, em casa da Sra. d`Espérance, em Gotenburgo, um lírio dourado, de seis pés de altura, foi produzido pelo Espírito Iolanda. Auxiliado pelos assistentes, esse Espírito depositou areia, terra e água num vaso, que em seguida cobriu com o véu. Este se elevou lentamente, impelido de modo contínuo por um objeto invisível; e quando Iolanda retirou o véu viu-se aparecer uma linda planta coberta de flores, que exalavam penetrante aroma. Esse lírio dourado se conservou durante uma semana inteira, depois do que desapareceu misteriosamente como tinha vindo.ccxxiv


*


Acabamos de ver os Espíritos em ação, criando objetos e flores. Do mesmo modo operam eles na formação das vestes, costumes e adornos que aparecem. Esse fato, de se mostrarem vestidos os Espíritos, tem provocado numerosas objeções, a que cumpre responder.


Recordemos antes de tudo, como princípio, que a vontade e o pensamento são criadores. Nas aparições, já vimos como a matéria sutil obedece aos seus menores influxos. Um Espírito pode agir sobre os fluidos e emprestar-lhes formas e propriedades adequadas ao fim que tenha em vista.


No domínio terrestre, essa ação já se revela nas práticas do Magnetismo. O homem, dotado do poder de curar, transmite, pela vontade, aos eflúvios que dele emanam e, por extensão, à água e a certos objetos materiais, como panos, metais, etc., propriedades curativas. Os fenômenos do Hipnotismo e da sugestão nos mostram, sob outras formas, a aplicação dessa mesma lei. Mediante a sugestão provocam-se, no organismo de sensitivos adormecidos, profundas modificações; pode-se fazer aparecerem ou cicatrizarem chagas, estigmas, queimaduras, regular certas funções como a circulação, as secreções, etc., que no estado normal escapam à ação da vontade.


Casos há em que um experimentador, sugerindo a sensitivos que um selo postal, uma obreira, são vesicatórios, transmite pelo pensamento a esses inofensivos objetos uma força que faz empolar a pele e produzir serosidades. Outros têm provocado, por simples ordem, hemorragias cutâneas.ccxxv


Pela sugestão, que é principalmente um ato da vontade, tem-se conseguido não somente impressionar sensitivos, mas também lhes causar verdadeiras perturbações, pela ingestão de líquidos anódinos a que se emprestam propriedades nocivas. É assim que se provoca a embriaguês com água pura. Coisa mais grave: fizeram absorver a um sensitivo um veneno imaginário e esse veneno, apesar de uma sugestão contrária quase imediata, produziu desordens fisiológicas que por muito tempo lhe arruinaram a saúde. O memorial dessa experiência existe no Salpetrière.ccxxvi


A esses exemplos cumpre acrescentar as impressões experimentadas por senhoras grávidas e que se traduzem, no corpo do filho em gestação, por taras, manchas, deformações. A influência dessas emoções às vezes é vivíssima. O Doutor Goudard, numa comunicação à Sociedade de Estudos Psíquicos de Marselha,ccxxvii refere os seguintes fatos:


“Um homem culto, saído de uma de nossas grandes faculdades, foi operado, em sua infância, de um duplo polegar de cada lado, que simulava uma pata de crustáceo, e era atribuído ao fato de ter sido sua mãe, durante a gravidez, trincada fortemente na mão por uma lagosta. Uma outra mãe, vivamente impressionada à vista de uma carranca de fonte, deu à luz um feto cuja cabeça tinha uma estranha semelhança de feições com essa carranca.”


Caso notável é o seguinte, publicado pelo “Matin”, de 1º de junho de 1906:


“Uma jovem de 19 anos, Luísa Mirbel, tinha vivido muito tempo com um rapaz chamado Pedro Chauvin, de 27 anos de idade, que tinha por alcunha “o Tatuado”. Esse indivíduo era célebre numa zona especial de Montparnasse pela magnífica série de tatuagens que lhe ornava o corpo. Beberrão e violento, ele batia na amante, que não ousava abandoná-lo com receio de suas represálias. Há uns quinze meses Pedro Chauvin foi preso em conseqüência de um roubo e condenado a alguns meses de prisão. Luísa Mirbel aproveitou a ocasião para fugir. Definitivamente resolvida a abandonar a existência vergonhosa que tinha levado, veio morar no bairro Picpus, onde travou conhecimento com um honrado trabalhador, João Barrau, que a desposou. Um dia sentiu ela que não tardaria a ser mãe. Um receio, entretanto, a assaltava:


– Olha – repetiu várias vezes ao marido –, eu tenho medo de que aquele indivíduo, que abusou da inexperiência da minha mocidade, me venha um dia procurar. Temo por ti e por mim, porque o “Tatuado” é terrível em suas vinganças.


J. Barrau esforçava-se por tranqüilizá-la, mas em vão. À noite, a pobre rapariga via em sonho o antigo amante e acordava trêmula. Uma manhã disse ao marido:


– Tive esta noite um sonho horrível: parecia-me que o “Tatuado” estava ali. Eu acabava de dar à luz o nosso filho; ele o apertava nos braços e lhe desenhava no corpo todas as tatuagens que em si próprio traz.


– Tu estás louca, minha pobre amiga – respondeu João Barrau – . Esquece esse homem. Eu te asseguro que ele jamais te tornará a achar.


Ora, ontem de manhã, Luísa Mirbel deu à luz um filho. Imagine-se o espanto dos que a assistiam, vendo no corpo do menino largas manchas azuladas em que facilmente se reconheciam os traços de letras e desenhos. No peito notava-se distintamente um coração atravessado por um punhal.”


Em seu livro “La Zone Frontière” (pág. 131) o Senhor Sage refere dois outros fatos:


“Na Itália, um morcego penetrou, esvoaçando, numa sala de baile e as senhoras investiram, procurando enxotá-lo com os lenços; o mísero animalejo deixou-se cair no ombro nu de uma das senhoras, que teve um desmaio. Pouco tempo depois essa senhora deu à luz uma filha, que trazia no ombro a imagem perfeita de um morcego com as asas estendidas. Nada faltava: os pelos cinzentos, as garras, o focinho. A menina, depois de moça, nunca se pôde decotar.


As impressões fracas, desde que perdurem, produzem o mesmo resultado que as súbitas e violentas. Liébault refere que um vinhateiro se assemelhava de modo surpreendente à estátua do santo padroeiro da sua aldeia, que existia na igreja. Durante a gravidez sua mãe havia tido a idéia fixa de que o filho se pareceria com o santo.”


No ser humano, como se vê, o pensamento e a vontade influem profundamente sobre o organismo e suas funções. Em outros casos o nosso pensamento pode adquirir bastante intensidade para criar formas e imagens suscetíveis de impressionarem placas fotográficas. São numerosos os exemplos.


Aksakof refere ccxxviii que no curso de experiências fotográficas feitas em companhia de Mumler e do Doutor Child, em 1862, foi obtida numa placa a imagem de uma senhora que desejava ardentemente aparecer com uma guitarra nos braços. A forma desejada apareceu. Desde então se têm multiplicado esses casos. Nas experiências de sugestão, têm-se muitas vezes criado pelo pensamento objetos que para os sensitivos possuíam uma existência real e estavam submetidos às leis da óptica.


Não é mesmo necessário que a ação seja volitiva. Muitas vezes, como nos casos de gravidez que indicamos, o pensamento é inconsciente e nem por isso deixa de produzir efeitos muitíssimo sensíveis sobre a matéria. O mesmo se dá com os vivos exteriorizados que aparecem a distância. Basta que seu pensamento se tenha fixado numa pessoa ausente para que sua forma surja diante dela, a ponto de ser facilmente reconhecida.


Se o homem pode mentalmente operar tais efeitos, que resultado não obterá o Espírito, desembaraçado de todo obstáculo carnal, ele cujo pensamento vibra com intensidade superior?


Não somente o Espírito domina os elementos sutis da matéria, de modo a impressionar a placa sensível e os órgãos dos videntes, mas nas aparições visíveis para todos pode ainda produzir, pela ação da vontade, as formas que revestiu e os trajos que usou na Terra e que lhe permitem fazer-se reconhecer. Esse é, com efeito, o objetivo essencial de tais manifestações. Daí as roupagens, vestes, armas e acessórios com que se apresentam as aparições.


Quase sempre esses acessórios não têm consistência nem duração. Pode, entretanto, acontecer que o Espírito concentre bastante força para condensar objetos, a ponto de os tornar tangíveis e duradouros.


Certos Espíritos podem modificar seu aspecto, com facilidade prodigiosa, aos olhos mesmo dos assistentes. Aqui está um caso que parece dar razão à hipótese de Aksakof, há pouco mencionada.


Refere o Sr. Brakett ccxxix que numa sessão de materialização foi visto aparecer o Espírito de um moço alto, dizendo-se irmão de uma senhora que ele acompanhava. Esta observou que o não podia reconhecer, porque só o vira menino. Pouco a pouco a figura foi diminuindo de estatura, até atingir a do menino que a senhora conhecera.


Recordemos também o caso de Ema Hardinge, assinalado pelo Sr. Colville; apareceu ela com o vestido de rainha das fadas, que trouxera muito tempo antes, em sua mocidade.ccxxx


Nesse caso, como em alguns outros, a aparição parece não ser mais que simples imagem mental exteriorizada pelo Espírito, que adquire bastante consistência material para ser percebida pelos sentidos.


Às vezes os Espíritos imprimem às formas que revestem o mais encantador aspecto. Robert Dale Owen, ministro dos Estados Unidos na Corte de Nápoles, em sua obra “Região em Litígio”,ccxxxi descreve a aparição de uma forma feminina:


“Seu brilho era comparável ao da neve recente iluminada por um raio de Sol, fazendo lembrar o que foi escrito sobre vestes de luz do Cristo, na transfiguração, ou ainda o brilho do mármore de Paros, o mais puro e o mais recentemente talhado, sob o jato de viva luz.”


Não se poderia comparar a manifestações deste gênero as aparições, ditas “miraculosas”, de virgens, de anjos e santos, que aí então encontrariam explicação racional?


*


Em resumo, pode-se dizer que os modos de ação do Espírito variam conforme os recursos facultados pelo meio em que ele opera. Os fenômenos de materialização devem ser classificados em três ordens:


Primeiramente, os casos em que o duplo do médium exteriorizado é utilizado e modificado pelo Espírito, a ponto de reproduzir o aspecto que tinha este na Terra e mesmo os traços de sua fisionomia. O Espírito, por efeito da vontade, se reflete, se fotografa na forma fluídica do médium; é uma transfiguração mais ou menos completa, conforme o poder do manifestante. Por isso, em certas experiências, a aparição terá alguma semelhança com o médium.


Noutros casos o Espírito, com o auxílio dos fluidos ambientes, cria formas temporárias que anima e dirige de fora, sem se incorporar, como o observou Aksakof.


Há, finalmente, casos, mais numerosos, em que o Espírito condensa e materializa seu próprio envoltório fluídico, de forma a reaparecer tal como era em sua precedente existência terrestre. A materialização seria assim uma espécie de reencarnação efêmera.


O papel dos médiuns difere essencialmente conforme os casos. Eles passam por todos os graus do transe, de acordo com as absorções que lhes devem ser feitas. Às vezes mesmo, como nas Sras. d'Espérance e Compton, a absorção é total. Noutras circunstâncias os Espíritos trazem consigo quase todos os elementos da materialização e o médium conserva-se acordado.


O estudo das forças em ação nesses fenômenos demonstra que eficazes auxiliares podem ser a música e os cantos. Suas vibrações harmônicas facilitam a combinação dos fluidos. Em sentido oposto, temos verificado a desfavorável influência da luz; esta produz um efeito dissolvente sobre os fluidos em elaboração e exige um emprego mais considerável de força psíquica. Daí a necessidade das sessões obscuras, pelo menos nas tentativas iniciais.


Todos quantos têm observado a Natureza sabem que as ondas luminosas perturbam a formação do ser em seu período de gestação. Todo gérmen, todo corpo, seja vegetal, animal ou humano, deve constituir-se nas trevas, antes de aparecer à luz do dia. A fotografia é obrigada a operar em condições análogas. A reprodução das imagens requer a obscuridade. O mesmo acontece com as formações temporárias de Espíritos. É por isso que se adotam gabinetes escuros nas salas de experiências, para facilitar as materializações. Às vezes, contudo, quando a força é suficiente, vê-se o fenômeno produzir-se no meio dos assistentes.


Todas estas observações são cientificamente confirmadas pelas experiências da telegrafia sem fio. Segundo uma comunicação do Sr. Marconi à Sociedade Real de Londres, está verificado que as ondas hertzianas se transmitem melhor à noite que de dia; o nascer do Sol produz grande perturbação nas transmissões.


É assim que o Espiritismo, depois de nos ter franqueado o vasto império das forças e dos elementos invisíveis da Natureza, nos inicia nas leis que regem as suas profundas harmonias. É pelo estudo de seus fenômenos que a matéria, em seu mais rarefeito estado, se nos apresenta como um mundo sutil em que se imprimem os pensamentos e os atos. Ao mesmo tempo ela constitui imenso reservatório de energias que, vindo acrescentar-se às energias psíquicas, engendram a força por excelência, o poder criador de que emana o Universo em suas eternas e variáveis manifestações.


 


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