IX
Condições de experimentação
O estudo dos fenômenos é de importância capital, pois que nele é que se baseia inteiramente o Espiritismo. Muitas vezes, porém, a ausência de método, a falta de continuidade e direção nas experiências tornam estéreis a boa-vontade dos médiuns e as legítimas aspirações dos investigadores. A essas causas se devem atribuir os resultados pouco decisivos que tantas pessoas obtêm. Experimentam ao acaso desordenadamente, sem preocupação das condições indispensáveis; têm pressa de obter fenômenos transcendentes. Em conseqüência mesmo do estado de espírito em que fazem as pesquisas, acumulam dificuldades e, se ao fim de algumas sessões não obtêm mais que fatos insignificantes, banalidades ou mistificações, desanimam e abandonam a investigação.
Se, ao contrário, se produzem resultados satisfatórios, determinam eles muitas vezes, com irrefletido entusiasmo, uma tendência prejudicial para a credulidade, uma disposição para atribuir aos Espíritos desencarnados todos os fenômenos obtidos. Em casos tais não se fazem esperar as decepções necessárias, todavia, porque fazem nascer a dúvida e, com ela, restabelecem o equilíbrio mental, o senso crítico, indispensável em todo estudo experimental e, mais que qualquer outro, nesse domínio das investigações psíquicas, em que a sugestão, o inconsciente e a fraude se podem a cada passo misturar com as manifestações do mundo invisível.
Noutros lugares fazem-se críticas levianas, são acusados os grupos de má direção, os médiuns de incapacidade e os assistentes de ignorância ou misticismo. Queixam-se de não obter senão comunicações destituídas de interesse científico e consistindo de repisadas exortações morais.
Essas críticas nem sempre são infundadas; mas é preciso não esquecer, como geralmente se faz, que nenhum bem se adquire sem trabalho e que se não deve procurar colher os frutos antes da maturação. Em tudo se requer moderação e paciência. As faculdades mediúnicas, como todas as coisas, estão submetidas à lei de progressão e desenvolvimento. Em lugar de estéreis críticas, mais vale, pelo concurso de mentes de boa-vontade reunidas, facilitar a tarefa do médium, formando em torno dele uma atmosfera de simpatia que lhe seja ao mesmo tempo sustentáculo, estímulo e proteção.
É indispensável submeter as produções mediúnicas a rigoroso exame e conduzir as investigações com espírito analítico sempre vigilante.
A falta de benevolência, a crítica exagerada, a malsinação sistemática podem, entretanto, desanimar o médium, compeli-lo a abandonar tudo, ou pelo menos afastá-lo das reuniões numerosas, para se incorporar aos grupos familiares, aos círculos restritos, onde encontrará sem dúvida mais favorável ambiente, mas em que os seus trabalhos só aproveitarão a reduzido número de escolhidos.
Há, portanto, antes de tudo um duplo inconveniente a remover. Se demasiado cepticismo é prejudicial, a credulidade excessiva constitui perigo não menor. É preciso evitar um e outra com igual cuidado e conservar-se num prudente meio-termo.
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Entre os homens de ciência é que se encontram os mais inveterados preconceitos e prevenções a respeito dos fatos espíritas.
Querem eles impor a essas investigações as regras da ciência ortodoxa e positiva, que consideram os únicos fundamentos da certeza; e se não são adotadas e seguidas essas regras, rejeitam implacavelmente todos os resultados obtidos.
Entretanto, a experiência nos demonstra que cada ciência tem suas regras próprias. Não se pode estudar com proveito uma nova ordem de fenômenos, socorrendo-se de leis e condições que regem fatos de uma ordem inteiramente diversa. Só mediante pesquisas pessoais, ou graças à experiência nesse domínio adquirida pelos investigadores conscienciosos, e não em virtude de teorias a priori, é que se podem determinar as leis que governam os fenômenos ocultos. São das mais sutis e complicadas essas leis. Seu estudo exige espírito refletido e imparcial. Mas como exigir imparcialidade àqueles cujos interesses, nomeada e amor-próprio estão intimamente ligados a teorias ou a crenças que o Espiritismo pode aniquilar?
“Para achar a verdade – disse notável pensador – é preciso procurá-la com o coração simples.” É, sem dúvida, por isso que certos sábios, imbuídos de teorias preconcebidas, escravizados pelo hábito aos rigores de um método rotineiro, colhem menos resultados nessas investigações do que homens simplesmente inteligentes, mas dotados de senso prático e de espírito independente. Esses se limitam a observar os fatos em si mesmos e lhes deduzir as conseqüências lógicas, ao passo que o homem de ciência se aferrará principalmente ao método, ainda quando improdutivo. O que nesse domínio importa, antes de tudo, são os resultados, e o único método que os favorecer, mesmo que pareça defeituoso a alguns, deve ser por nós considerado bom.
Não é necessário ser matemático, astrônomo, médico de talento, para empreender, com probabilidade de êxito, investigações em matéria de Espiritismo: basta conhecer as condições a preencher e submeter-se a elas. Nenhuma outra ciência nos pode indicar essas condições.
Só a experimentação assídua e as revelações dos Espíritos-guia no-las permitem estabelecer com precisão.
Os sábios tomam muito pouco em consideração as afinidades psíquicas e a orientação dos pensamentos, que, entretanto, constituem um importante fator do problema espírita. Encaram o médium como um aparelho de laboratório, como máquina que deve produzir efeitos à vontade, e procedem a seu respeito com excessiva desatenção. As inteligências invisíveis que o dirigem são por eles equiparadas a forças mecânicas. Nelas recusam-se, em geral, a ver seres livres e conscientes, cuja vontade entra numa considerável proporção, nas manifestações – seres que têm suas idéias, seus desígnios, seu objetivo, desconhecidos para nós, e que nem sempre julgam conveniente intervir: uns, porque o desembaraço e os intuitos excessivamente materiais dos experimentadores os afastam; outros, porque, demasiado inferiores, não se preocupam com a necessidade de demonstrar aos homens as realidades da sobrevivência.
Força é, todavia, reconhecer que as exigências e os processos dos sábios podem, num certo limite, ser justificados, em vista de fraudes com que têm sido muitas vezes desfigurados ou simulados os fenômenos.
Não somente hábeis prestidigitadores têm praticado esse gênero de exercícios, mas verdadeiros médiuns têm sido, não raro, surpreendidos em flagrante delito de simulação. Daí a bem legítima prevenção de certos investigadores e a obrigação, que se lhes impõe, de eliminar, nas experiências, tudo o que apresenta caráter suspeito, todo elemento de dúvida, todo motivo de ilusão.
É indubitável que, no fenômeno de transportes, por exemplo, será preciso uma grande acumulação de provas, irrecusável evidência, para acreditar-se na desmaterialização e sucessiva reconstituição de objetos, passando através das paredes, de preferência a admitir que tenham sido trazidos por algum dos assistentes.
A desconfiança, entretanto, não deve ser levada ao extremo de impor ao fenômeno condições que o tornem impossível, como no caso do Dr. Ferroul e dos professores do Montpellier, que exigiam a leitura à distância, através de placas de vidro.
A interposição desse corpo, criando um obstáculo insuperável à ação do médium, tornava essa experiência equivalente à que, num intuito de verificação, consistisse em inundar de luz intensa a câmara escura de um fotógrafo, no momento de praticar as suas operações peculiares.
A ignorância das causas em ação e das condições em que elas se manifestam explica os freqüentes insucessos daqueles mesmos que, supondo dar lições aos outros, só conseguem demonstrar insuficiência das regras de sua própria ciência, quando as querem aplicar a esta ordem de pesquisas.
Além disso, o espírito de suspeita e malevolência em que envolvem o médium atrai as entidades inferiores, que se comprazem em perturbar e impelem o sensitivo à prática de atos fraudulentos. Quando esses elementos fazem irrupção num grupo, o melhor alvitre a adotar é suspender a sessão. É sobretudo nesse caso que a presença e os conselhos de um Espírito-guia são de grande utilidade; e os que, deles privados, se entregam a experiências, ficam expostos a graves decepções.
O médium é um instrumento delicado, repositório de forças que se não renovam indefinidamente e que é preciso utilizar com moderação. Os Espíritos esclarecidos, os experimentadores sensatos, aos quais merece cuidado a saúde dos sensitivos, sabem deter-se aos primeiros sintomas de esgotamento; os Espíritos levianos e embusteiros, que afluem às reuniões mal dirigidas, em que não reina a harmonia nem a elevação de pensamentos, têm menos escrúpulos. Senhores dos intuitos dos investigadores inexpertos, não trepidarão em exceder o limite das forças do médium, para produzirem fenômenos sem interesse, e mesmo para mistificarem os assistentes.
Quase sempre, forças, causas, influências diversas intervêm nas experiências; algumas vezes mesmo se contrariam e hostilizam. Daí uma certa confusão, uma mescla de verdadeiro e falso, de coisas evidentes e duvidosas que nem sempre é fácil distinguir.
Os próprios sábios reconhecem que, na maior parte dos casos, pode a sugestão intervir numa considerável proporção; do que resulta que, para obter fenômenos espíritas verdadeiramente autênticos e espontâneos, deve-se evitar com cuidado tudo o que pode influenciar o médium e perturbar a ação dos Espíritos. Ora, é do que parece menos se preocuparem certos homens de ciência.xliii Julgam lícito embaraçar o sensitivo com perguntas inoportunas, pueris, insidiosas. Perturbam as sessões, entretendo-se em conversas particulares e colóquios. Quando são indispensáveis a calma, o silêncio, a atenção, uns mudam de lugar, entram e saem, interrompem as manifestações em curso, apesar das injunções dos Espíritos; outros, como certo doutor de nosso conhecimento, fumam e tomam cerveja durante as experiências.
Em tais condições tão pouco sérias, tão pouco honestas, como é possível ouso, legitimamente formular conclusões? Algumas vezes a experiência segue uma direção normal, satisfatória; o fenômeno se desenvolve com feição prometedora. E subitamente age uma nova causa; uma vontade intervém; uma corrente de idéias contrárias entra em jogo; a ação mediúnica se perturba e transvia; já não produz senão efeitos em desacordo com as esperanças do começo. Fatos reais parece ladearem coisas ilusórias; às sessões imponentes sucedem manifestações vulgares. Como destrinçar essa complicação que vos deixa perplexo? Como evitar a sua reprodução?
E aí que a necessidade da disciplina nas sessões se faz vivamente sentir e, mais ainda, a assistência de um Espírito elevado, cuja vontade enérgica exerça império sobre todas as correntes adversas.
Quando a harmonia das condições se estabelece e a força do Alto é suficiente, já se não produzem essas contradições, essas incoerências que provêm, quer das forças inconscientes, quer de Espíritos atrasados, quer mesmo do estado mental dos assistentes. O fenômeno se desenvolve, então, em sua majestosa grandeza e o fato probatório se apresenta.
Mas para isso, para obter essa assistência do Alto, fazem-se precisas a união, a elevação dos pensamentos e dos corações; são necessários o recolhimento e a prece.
As entidades superiores não se põem de boamente ao serviço dos experimentadores que não são animados do sincero desejo de instruir-se, de um amor profundo ao bem e à verdade.
Aqueles que fazem do Espiritismo um passatempo, uma frívola diversão, não têm que contar senão com incoerências e mistificações.
Pode haver mesmo nisso, às vezes, um perigo. Certas pessoas se comprazem em conversas mediúnicas com os Espíritos inferiores, com almas viciosas e degradadas, e isso sem intenção benéfica, sem intuito de regeneração, movidas por sentimento de curiosidade, pelo desejo de divertirse. Ao passo que não teriam suportado a convivência desses seres, na vida terrestre, não receiam atraí-los, depois de desencarnados, e com eles entreter palestras de mau gosto, sem reparar que desse modo se abandonam a perigosas influências magnéticas.
Se entrardes em relação com almas perversas, fazei-o com o fim de sua redenção, de sua reabilitação moral, sob o amparo de um guia respeitável; doutro modo vos exporeis à nociva promiscuidade, a obsessões temíveis. Não abordeis essas regiões do Além senão com o propósito firme e elevado, que vos seja como a arma assestada contra o mal.
A mediunidade, esse poder maravilhoso, foi concedida ao homem para um nobre uso. Aviltando-a, aviltareis a vós mesmos, e de um puríssimo eflúvio celeste fareis um sopro envenenado.
O antigo iniciado, como os orientais em nossos dias, só se entregava às evocações depois de se haver purificado pela abstinência, pela prece e pela meditação. A comunicação com o invisível era um ato religioso, que ele executava com sentimento de respeito e de veneração pelos mortos.
Nada há mais diametralmente oposto que o modo de proceder de certos experimentadores atuais. Apresentam-se nos lugares de reunião depois de copioso jantar, impregnados do cheiro do fumo, com o desejo intenso de obter manifestações ruidosas ou indicações favoráveis aos seus interesses materiais. E admiram-se, em tais condições, de só se apresentarem Espíritos fraudulentos e mentirosos que os enganam e se divertem em lhes causar inúmeras decepções!
Mau grado à repugnância dos modernos sábios pelos meios com cuja aplicação se realiza a elevada comunhão das almas, será forçoso a eles recorrer, a não ser que se queira fazer do Espiritismo uma nova fonte de abusos e de males.
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O estado de espírito dos assistentes, sua ação fluídica e mental, é por conseguinte, nas sessões, um importante elemento de êxito ou de insucesso. Quanto mais sensível é o médium, tanto mais receptivo é à influência magnética dos experimentadores. Em uma assembléia composta, na maioria, de incrédulos, cujos pensamentos hostis convergem para o sensitivo, o fenômeno dificilmente se produz. A primeira das condições é abster-se de toda idéia preconcebida, a fim de deixar ao Espírito a necessária liberdade de ação. Tenho, por minha parte, em certos casos, podido verificar que uma vontade enérgica e persistente pode paralisar o sensitivo, se é fraco, e constituir obstáculo às manifestações.
Os pensamentos divergentes se chocam e formam uma espécie de caos fluídico, que a vontade dos invisíveis nem sempre consegue dominar. É o que torna tão problemáticos os resultados nas assembléias numerosas, de composição heterogênea, nas sessões teatrais, por exemplo, como o tem demonstrado a experiência. As pessoas ávidas de propaganda pública, que, sem cogitar das necessárias precauções, se aventuram nesse terreno, expõemse a bem graves reveses. Aí correm os médiuns grande risco: não somente se acham à mercê dos Espíritos atrasados que se comprazem na permanência entre as turbas, mas ainda ficam à disposição de todo mal-intencionado que, aparentando de sábio, deles exigirá experiências contrárias às verdadeiras leis do Espiritismo. E quando tiver usado e abusado de suas forças sem resultado prático, persuadirá os espectadores de que, nessa ordem de idéias, não há mais que fraude ou erro.
Compreende-se, depois disso, que haja quase sempre afinidade entre os membros de um círculo e as entidades atuantes. As influências humanas atraem inteligências similares e as manifestações revestem um caráter em harmonia com as disposições, as preferências, as aptidões do meio.
Certos críticos têm pretendido concluir daí que as comunicações espíritas não passam de reflexos dos pensamentos dos assistentes. Fácil de refutar é essa opinião. Basta recordar as revelações de nomes, fatos, datas, desconhecidos de todos, as quais se têm produzido em tantos casos e foram reconhecidas exatas depois de verificação.xliv
Têm-se obtido palavras, ditadas em línguas ignoradas dos assistentes; a assinatura, o estilo, a maneira de escrever de pessoas falecidas têm sido mecanicamente reproduzidas por médiuns que nunca as haviam conhecido. Às vezes, também, experimentadores instruídos só obtêm coisas vulgares, ao passo que em reuniões de iletrados têm sido transmitidas comunicações notáveis pela elevação e beleza de linguagem.
As analogias que se notam entre os membros de um grupo e os Espíritos que o dirigem não provêm unicamente das simpatias adquiridas e da similitude de opiniões; radicam-se também nas exigências da transmissão fluídica.
Nas manifestações intelectuais o Espírito necessita de um agente e de um meio que lhe forneçam os elementos necessários para expor suas idéias e as fazer compreender. Daí a tendência para se aproximar dos homens com quem se acha em comunhão de idéias ou de sentimentos.
É sabido que nos fenômenos de escrita, de incorporação e, às vezes, mesmo, de tiptologia, o pensamento do Espírito se transmite através do cérebro do médium e este não deixa passar senão um certo número de vibrações – as que se acham em harmonia com o seu próprio estado psíquico.xlv
Do mesmo modo que um raio de luz, atravessando os vidros coloridos de uma janela, se decompõe e não projeta do outro lado senão uma quantidade reduzida de vibrações, assim o ditado do Espírito, seja qual for à opulência dos termos e das imagens que o compõem, será transmitido no restrito limite das formas e das expressões familiares ao médium e contidas em seu cérebro.
Essa regra é geral. Temos, entretanto, observado que um Espírito poderoso em vontade e energia consegue fazer um médium transmitir ensinos superiores a seus conhecimentos e indicar fatos que sua memória não registra.
Quanto às lacunas e contradições que entre si apresentam as comunicações e de que tantas vezes se faz um argumento contra o Espiritismo, convém não esquecer que os Espíritos, como os homens, representam todos os graus da evolução. A morte não lhes confere a ciência integral e, posto que suas percepções sejam mais extensas que as nossas, não penetram eles senão a pouco e pouco, e na medida do seu adiantamento, os segredos do Universo imensurável.
A atmosfera terrestre está povoada de Espíritos inferiores, em inteligência e em moralidade, aos quais o peso específico que lhes é próprio não permite elevarem-se mais alto. São os que acodem aos nossos chamados e se comunicam a maior parte das vezes. Os que se elevaram a uma vida superior não volvem até nós senão em missão. Suas manifestações são mais raras. Revestem-se de caráter grandioso, que não as permite confundir no conjunto das outras comunicações.
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Se os pensamentos divergentes dos circunstantes são uma causa de perturbação e de insucesso, por um efeito contrário, os pensamentos dirigidos para um objetivo comum, sobretudo quando elevado, produzem vibrações harmônicas que difundem no ambiente uma impressão de calma, de serenidade, que penetra o médium e facilita a ação dos Espíritos. Estes, em vez de lutarem, empregando o poder da vontade, não têm mais que associar seus esforços às intenções dos assistentes; e desde logo a diferença dos resultados é considerável.
É por isso que nas reuniões do nosso grupo de estudos reclamamos constantemente o silêncio, o recolhimento, a união dos pensamentos e, a fim de os facilitar e de orientar a assistência no sentido de elevados assuntos, abrimos sempre as sessões com uma prece coletiva, com uma invocação improvisada ao Poder Infinito e aos seus invisíveis Agentes, pondo nessa invocação todas as forças de nosso espírito, todos os espontâneos surtos de nosso coração.
Além disso, nas sessões de efeitos físicos, quando se pretende obter fenômenos de transportes, escrita direta, materializações, é conveniente empregar um meio artificial para fixar num ponto os pensamentos dos circunstantes. Pode-se adotar um signo e colocar imaginariamente acima do médium, como, por exemplo, uma cruz, um triângulo, uma flor, e, de quando em quando, no curso da sessão, lembrar o signo convencional, atrair para ele a atenção oscilante e prestes sempre a desviar-se.
Esse processo substitui com vantagem as cantarolas vulgares, pouco edificantes, a que muitos costumam recorrer em certas reuniões e que impressionam desagradavelmente as pessoas de fino gosto e espírito culto, e só têm aplicação na obscuridade. A luz geralmente exerce uma ação dissolvente sobre os fluidos. Em todos os casos em que não seja indispensável, como para obter-se a escrita semimecânica, será conveniente diminuir-lhe a intensidade e mesmo suprimi-la inteiramente, desde que, por exemplo, se dispõe de médiuns videntes e de incorporação.
A música, os cantos graves e religiosos podem também contribuir poderosamente para determinar a harmonia dos pensamentos e dos fluidos. Isto não é, porém, suficiente. Nas sessões, à união dos pensamentos é necessário acrescentar a união dos corações. Quando reina a antipatia entre os membros de um grupo, a ação dos Espíritos elevados se enfraquece e aniquila. Para obter sua intervenção assídua é preciso que a harmonia moral, mãe da harmonia fluídica, se estabeleça nos corações e que todos os adeptos se sintam na conjunção de esforços por alcançar um objetivo comum, ligados por um sentimento de sincera e benévola cordialidade.
As mais secretas leis do pensamento se revelam nas experiências. Quando, às vezes, os membros de um grupo estão agitados por intensas preocupações, pode a linguagem do médium ressentir-se desse fato. O mesmo se dará com a ação dos Espíritos sobre o médium e reciprocamente. Qualquer que seja o predomínio de um Espírito sobre o sensitivo, se este se acha desassossegado, inquieto, agitado, as comunicações apresentarão o cunho desse estado de perturbação. As inteligências que se manifestam, quando sejam pouco adiantadas, podem também sofrer a influência dos assistentes.
Há, de modo geral, entre o meio terrestre e as entidades invisíveis uma reciprocidade de influências que é preciso ter em consideração na análise dos fenômenos. O Espírito elevado, porém, mesmo em virtude de sua superioridade e das forças de que dispõe, escapa a essas influências, as domina e governa, e se afirma com uma autoridade que não deixa lugar à menor dúvida. É por isso que convém acima de tudo captarmos a intervenção das almas superiores e facilitá-la, colocando-nos nas condições que elas nos impõem, sem as quais não podemos atrair senão Espíritos medíocres, pouco aptos a nos servir de guias e traduzir fielmente os altos ensinamentos do Espaço.
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Os grupos pouco numerosos e de composição homogênea são os que reúnem as maiores probabilidades de êxito. Se já é difícil harmonizar as vibrações de cinco ou seis pessoas entre si e com os fluidos do Espírito, é evidente, a fortiori, que as dificuldades aumentam com o número dos assistentes. É prudente não exceder o limite de dez a doze pessoas, de um e outro sexo, quando possível sempre as mesmas, sobretudo no começo das experiências.
A renovação freqüente da assistência, reclamando contínuo trabalho de fusão e assimilação da parte dos Espíritos, compromete ou pelo menos demora os resultados. Se é excelente, no ponto de vista da propaganda, franquear os círculos a novos adeptos, é necessário que ao menos um núcleo de antigos membros permaneça compacto e constitua invariável maioria.
Convém reunir-se em dias e horas fixos e no mesmo lugar. Os Espíritos podem apropriar-se, assim, dos elementos fluídicos que lhes são necessários, e os lugares de reunião, impregnando-se desses fluidos, tornam-se cada vez mais favoráveis às manifestações.
A perseverança é uma das qualidades indispensáveis ao experimentador. Aborrece muitas vezes passar um serão infrutífero na expectativa dos fenômenos. Sabemos, contudo, que uma ação insensível, lenta e progressiva, se realiza no curso das sessões. A concentração das forças necessárias não se efetua, às vezes, senão depois de repetidos esforços, em reuniões de tentativas e de ensaios.
Os seguintes exemplos nos demonstram que a paciência é freqüentemente a condição do êxito.
Em 1855 o professor Mapes formou, em Nova Iorque, um grupo de doze pessoas, homens cultos e cépticos, que combinaram reunir-se, com um médium, vinte vezes seguidas.
Durante as dezoito primeiras noites os fenômenos apresentaram caráter tão indeciso e trivial que muitos dentre os assistentes deploravam a perda de um tempo precioso; no curso das duas últimas sessões, porém, produziram-se fatos de tal modo notáveis que o estudo foi prosseguido pelo mesmo grupo durante quatro anos; todos os seus membros se tornaram convencidos adeptos.xlvi
Em 1861, o banqueiro Livermore, experimentando com a médium Kate Fox, com o fim de obter materializações do Espírito de sua esposa Estela, só à 24ª sessão viu desenhar-se a sua forma. Pôde mais tarde conversar com esse Espírito e obter comunicações diretas.xlvii A falta de perseverança nenhum desses resultados teria permitido colher.
Compreende-se, à vista desses fatos, quanto é necessário aplicar uma atenção rigorosa à composição dos grupos e às condições de experimentação. Tal seja a natureza do meio, a faculdade do médium produzirá efeitos muitíssimo diversos. Ora se manifestará em fenômenos de caráter equívoco, que despertarão a dúvida e a desconfiança, fazendo que as sessões, em tal caso, deixem uma impressão de mal-estar indefinível; ora dará lugar a efeitos tão poderosos que diante deles toda incerteza se dissipará.
Tenho, por minha parte, assistido a muitas sessões nulas ou insignificantes; mas também posso afirmar que tenho visto médiuns admiravelmente inspirados em suas horas de êxtase e de sono magnético. Outros tenho visto escrever de um jato, às vezes mesmo na obscuridade, páginas magníficas de estilo, esplêndidas de elevação e de vigor. Tenho assistido, aos milhares, a fenômenos de incorporação que permitiam a habitantes do Espaço apoderar-se, durante algumas horas, do órgão de um médium e proferir frases, discursos, com inflexões tais que todos quantos os ouviam guardavam dessas reuniões uma recordação imorredoura.
Para o observador atento, que estudou todos os aspectos do fenômeno, há como que uma gradação, uma escala ascensional, que vai desde os ligeiros ruídos e os movimentos de mesas até as mais altas produções do pensamento. É uma engrenagem que se apodera do experimentador imparcial e cujo poder todos os homens que têm a preocupação da verdade cedo ou tarde reconhecerão.
Apesar das hostilidades, das repulsas e hesitações, forçoso virá a ser um dia consagrar-se, de modo geral, ao estudo das manifestações físicas; este, por um rigoroso encadeamento, conduzirá à psicografia e, em seguida, pela visão e audição, à incorporação; e desde que se quiser investigar as causas reais desses fenômenos, defrontar-se-á com o grande problema da sobrevivência.
À medida que o observador penetrar nesse domínio, sentir-se-á pouco a pouco elevado acima do plano material. Será induzido a reconhecer que os fatos de ordem física não são mais que preparação para fenômenos mais eminentes e que todos, em conjunto, convergem para a manifestação desta verdade: que a alma humana é imperecível e os seus destinos são eternos. Conceberá, desde então, das leis do Universo, da ordem e harmonia das coisas, uma idéia cada vez mais grandiosa, com uma noção sempre mais profunda do objetivo da existência e dos imprescritíveis deveres que ela impõe.
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Nos fenômenos é, portanto, necessário distinguir três causas em ação: a vontade dos experimentadores, as forças exteriorizadas do médium e dos assistentes e a intervenção dos Espíritos.
Os próprios fenômenos se podem dividir em duas grandes categorias: os fatos magnéticos e os fatos mediúnicos; uns e outros, porém, intimamente se entrelaçam e muitas vezes se confundem.
O médium, uma vez mergulhado em sono magnético, acha-se em três estados distintos que se podem nele suceder, a cada um dos quais corresponde uma ordem de fenômenos. São eles:
1 - O estado superficial de hipnose, favorável aos fatos telepáticos e à transmissão de pensamento; os que, todavia, se produzem nesse estado são em geral pouco concludentes; o desprendimento do corpo fluídico do médium é incompleto, e sua ação pessoal se pode misturar à sugestão do Espírito.
2 - O sono magnético real, que permite ao corpo fluídico do médium exteriorizar-se e agir à distância.
3 - O sono profundo, graças ao qual se produzem as aparições, as materializações, a levitação do médium, as incorporações. O sono mediúnico, em suas várias fases, pode ser provocado, ora por um dos experimentadores, ora diretamente pelo Espírito. Julgamos preferível deixar agir a influência oculta, quando suficiente. Assim se evitará a objeção habitual de que a ação do magnetizador favorece a sugestão.
Os fatos espíritas podem ser subdivididos em quatro classes:
1ª- A tiptologia e o fenômeno das mesas – Neste gênero de experiências é preciso eliminar com cuidado as causas físicas, os movimentos involuntários, o magnetismo dos assistentes, a sugestão mental. Excluídos todos os fatos explicáveis por essas causas, restará um número considerável de fenômenos que demonstram a intervenção de inteligências alheias às pessoas presentes.
2ª- A escrita automática – Muitos ditados obtidos por esse processo podem ser atribuídos à sugestão inconsciente.
Podendo o pensamento, como vimos, exteriorizar-se, acontece, em certos casos, que o pensamento do médium responde à pergunta por ele próprio formulada. Dar-se-ia então um fenômeno de auto-sugestão involuntária, ou de sugestão dos assistentes. A ação dos Espíritos, porém, se revela nos casos em que escritas desconhecidas são traçadas, e fatos, particularidades, revelações, que constituem outros tantos elementos de identidade, são obtidos por esse modo de experimentação.xlviii
3ª- A incorporação – Nos fenômenos desta ordem pode o inconsciente do médium exercer uma certa intervenção. Há em cada um de nós aquisições mentais, aptidões, reminiscências, uma extensa acumulação de riquezas intelectuais, fruto de nossas anteriores existências, as quais, sepultadas nas profundezas da consciência, se nos conservam ignoradas no estado de vigília. É o que constitui o inconsciente, ou antes, o subconsciente.
Nos casos de desprendimento sonambúlico e de exteriorização, essas energias despertam, vibram e irradiam em torno do corpo fluídico do médium; a Psique readquire suas recônditas capacidades e entra em ação. Fácil, porém, é reconhecer os numerosos casos em que ocultas personalidades se apoderam do organismo do médium e se substituem ao seu próprio espírito. Essas personalidades se evidenciam por sinais característicos, gestos e voz que lhes são próprios, como por certas particularidades psicológicas que não as permitem confundir com o inconsciente do médium.xlix
4ª- As materializações – Esses fenômenos, em virtude de se produzirem na obscuridade, exigem rigorosa verificação. Pode-se, para isso, fazer uso, quer de balanças munidas de aparelhos registradores que permitam averiguar a diminuição de peso do médium, como nas experiências de Armstrong e Reimers,l quer, a exemplo de W. Crookes e do engenheiro Varley, de baterias elétricas, a que é ligado o médium por uma corrente que impede todo movimento equívoco de sua parte.
No que se refere às manifestações espíritas, propriamente ditas, qual será o critério de certeza? Onde estará a prova da intervenção dos Espíritos?
Essa prova, já o dissemos, reside no conjunto das particularidades que permitem estabelecer uma identidade positiva. Só o experimentador pode nesse caso ser juiz, e sua convicção não se pode basear senão sobre o reconhecimento desses indícios característicos desconhecidos do médium e às vezes mesmo dos assistentes, mediante os quais se revela a personalidade do ser invisível.li
Para adquirir certeza e multiplicar os meios de verificação, é conveniente variar as experiências, completar umas com as outras, recorrendo aos diversos gêneros de mediunidade. Do conjunto dos testemunhos e dos resultados obtidos poderemos assim coligir a mais considerável soma de provas que seja possível obter nesse domínio, em que múltiplas causas intervêm e não raro se confundem.
É às vezes cruel e desolador sabermos, sentirmos, ao pé de nós, um ente amado e desaparecido, sem podermos com ele conversar; e se, dotado de mediunidade, procurarmos obter uma comunicação, não o é menos percebermos, enquanto o lápis corre veloz sobre o papel, que o nosso pensamento se intercala ao seu de um modo tão íntimo que não podemos separar um do outro e determinar o que emana de nós ou provém dele.
Recorremos então a outro médium. Quer ele escreva, porém, quer fale por sua boca, durante o sono mediúnico, o Espírito evocado, reconhecemos ainda, por um efeito dessa malfadada sugestão, que por toda parte se insinua, que a personalidade do médium se mistura com a do ser que nos é caro. E a dúvida nos assalta, a angustiosa incerteza nos oprime. Súbito, porém, uma prova de identidade brota como uma faísca, tão viva, tão brilhante, tão incontestável que, diante dela, todas as hesitações desaparecem, todas as dúvidas se dissipam e a nossa razão satisfeita e o nosso coração emocionado entram, num transporte de amor e de fé, em comunhão com a alma idolatrada que de modo tão claro e inconfundível acudiu ao nosso reclamo e para sempre firmou a certeza de sua presença e de sua proteção.
Quanto às comunicações de caráter geral e que revestem a forma de ensino filosófico, devem ser cuidadosamente examinadas, discutidas, julgadas com rigor, com a mais completa liberdade de apreciação. A Humanidade invisível se compõe dos Espíritos que viveram neste mundo, em cujo número – sabemos – contam-se muitos, bem pouco adiantados. Mas no Espaço há também inteligências brilhantes, iluminadas pelos esplendores do Além. E quando anuem a vir até nós, podemos reconhecê-las na elevação do pensamento, como na judiciosa retidão das apreciações.
Nesta ordem de idéias o discernimento é uma qualidade indispensável. O investigador deve ser dotado de critério seguro, que lhe permitirá distinguir o verdadeiro do falso e, depois de haver tudo examinado, conservar o que tem legítimo valor.
Nada é mais prejudicial à causa do Espiritismo que a excessiva credulidade de certos adeptos e as experiências mal dirigidas. Estas produzem aos pesquisadores novatos uma deplorável impressão; fornecem alimento à crítica e ao motejo e dão uma idéia falsa do mundo dos Espíritos. Muitos saem dessas reuniões ainda mais incrédulos que dantes.
O homem crédulo é dotado de boa-fé; a si mesmo se engana inconscientemente e torna-se vítima de sua própria imaginação. Aceita as coisas mais inverossímeis e muitas vezes as afirma e propaga com entusiasmo extravagante. É isso um dos maiores estorvos para o Espiritismo, uma das causas que dele afastam muitas pessoas sensatas, muitos sinceros investigadores, que não podem tomar a sério uma doutrina e fatos tão mal apresentados.
É preciso não aceitar cegamente coisa alguma. Cada fato deve ser objeto de minucioso e aprofundado exame. Só nessas condições é que o Espiritismo se imporá aos homens estudiosos e racionalistas. As experiências feitas superficialmente, sem conhecimento de causa, os fenômenos apresentados em más condições fornecem argumentos aos cépticos e prejudicam a causa a que se pretende servir.
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Podemos, em resumo, dizer que o principal motivo dos erros e insucessos, em matéria de psiquismo experimental, é a falta de preparação. Os povos do Ocidente abordam aí um novo domínio, ignorado ou esquecido, que não é isento de perigos para eles; só excepcionalmente o fazem munidos desse elevado sentimento, dessa luz interior, desse sentido penetrante da alma, que os grandes iniciados possuíram e são os únicos que nos podem preservar dos embustes e ciladas do invisível.
A primeira das condições, por conseguinte, é aparelhar-vos moral e mentalmente. Não provoqueis os fatos antes de vos haverdes tornado aptos para os compreender e dominar, mediante demorado e paciente estudo das obras fundamentais, a reflexão, o desenvolvimento da vontade e o exercício de um raciocínio claro e firme. Se não preencheis essas condições, mais prudente seria vos absterdes, a menos que vos consagreis a essas experiências sob a direção de um homem esclarecido e orientado, a quem auxiliareis com a vossa boa-vontade e deixareis o cuidado de vos guiar.
Os processos de investigação usados no mundo físico não se podem adaptar ao plano psíquico. Neste são os pensamentos que entram em ação. Os pensamentos são forças. São eles que lapidam e lentamente modelam o nosso ser interior; influem mesmo em nossa forma exterior, a ponto de ser fácil distinguir, pelos traços e expressão da fisionomia, o sábio do homem vicioso. Esses efeitos do pensamento não são, porém, circunscritos aos limites do nosso ser material: estendem-se em torno de nós e formam uma atmosfera que serve de laço entre nós e os seres de pensamentos similares.
Nisso reside o segredo da inspiração, da fecundação do espírito pelo espírito. Dessa lei resulta um fato: aquele que, por meio de evocações, de reclamos, entra em relação com o mundo invisível, atrai seres em afinidade com o seu próprio estado mental. O mundo dos Espíritos fervilha de entidades benfazejas e maléficas, e se não soubermos purificar-nos, orientar os nossos pensamentos e forças no sentido da vida superior, poderemos tornar-nos vítimas das potências malfazejas que em torno de nós se agitam e têm, em certos casos, conduzido o indivíduo imprudente ao erro, à obcecação, a obsessões vizinhas da loucura.
Mas, se sabeis dominar os sentidos, elevar a alma acima das curiosidades vãs e das preocupações materiais, fazer do Espiritismo um meio de educação e de disciplina moral, entrareis no domínio do verdadeiro conhecimento; influências regeneradoras baixarão sobre vós; uma luz suave e penetrante vos iluminará o caminho, vos preservará das quedas, dos desfalecimentos e de qualquer perigo.